Campinas FC: em 1978, PLACAR uniu rivais de Ponte Preta e Guarani
Foto histórica com os destaques das equipes campineiras foi republicada na edição 1500; confira a reportagem na íntegra
Ponte Preta e Guarani, o dérbi de Campinas, contam uma das rivalidades mais saborosas do futebol brasileiro. Os rivais só voltam a se reencontrar daqui a 64 dias, em 26 de agosto, em confronto pela 26ª rodada da Série B do Campeonato Brasileiro, mas PLACAR celebra neste mês, em sua histórica edição 1500, a arte dos reencontros relembrando da façanha quando conseguiu, em 1978, por numa mesma fotografia os atletas do Bugre, campeão brasileiro, e da Macaca, que, um ano antes, disputara a final do Paulista contra o Corinthians.
Quem ousaria, nos dias de hoje, de tanta rivalidade agressiva e brigas desnecessárias, juntar jogadores de dois clubes de uma mesma cidade? Não se trata de saudosismo – mas como seria bonito poder voltar a ver cenas como essa, com craques como o goleiro Carlos, o zagueiro Oscar, o meia Zenon e o atacante Careca, alguns dos selecionados para a reportagem “Campinas FC: uma equipe imbatível”.
Curiosamente, o mesmo nome foi utilizado por Careca para a fundação de um clube na cidade, em 1 de janeiro de 1988, ao lado do também ex-atacante Edmar. A equipe chegou a disputar a Série A-3 do Paulistão, o equivalente a terceira divisão estadual, antes da extinsão, em 2010.
Um anos depois da reportagem, a Macaca ostentaria ainda a maior série invicta do dérbi – 16 jogos, entre 1979 a 1984. O Bugre, por sua vez, venceu mais e tem a seu favor a maior goleada – um 6 a 0 registrado em 5 de junho de 1960.
Até aqui, foram 204 jogos entre os rivais, com 69 vitórias do Guarani, 67 da Ponte e 68 empates. O primeiro deles ocorreu em 1912, há 111 anos.
Confira a reportagem na íntegra:
CAMPINAS FC: UMA EQUIPE IMBATÍVEL
A seleção da foto é uma máquina. Atrás, uma zaga que se defende com classe e ataca pelas laterais. Na armação, um trio de muito respeito, no toque de bola e lançamentos. Na frente, a grande revelação dos últimos tempos – Careca, escoltado por dois pontas bem ofensivos. É o Campinas Futebol Clube. Um time de fantasia, claro, pois nem Guarani nem Ponte admitiriam uma fusão. Mas PLACAR foi lá: escalou o time, bateu a foto e mostra o resultado. Um time de sonho.
José Maria de Aquino e Maurício Cardoso
Os primeiros a chegar foram Odirlei e Polozzi. Cinco minutos antes do horário combinado, 10 horas da manhã de segunda-feira passada. Ficaram desconfiados: não havia ninguém no hotel Vila Rica, lugar do encontro, nem mesmo os repórteres de PLACAR – que estavam à cata de bolas e camisas.
Não demorou muito, foram aparecendo os outros. Carlos, Zé Carlos, Mauro. Renato chegou com a noiva, vindo de Morungaba. Tuta, que mora perto do hotel, foi um dos últimos. Naturalmente, jogadores de Ponte e Guarani, ferozes rivais dentro de campo, brincavam e se gozavam mutuamente. No papo geral, o goleiro Carlos era chamado de Velha. Tuta, o pontinha, era a Preta. Lúcio era o Chinês. Odirlei, enquanto Mauro não chegava, era o Cabeção. Ele mesmo explicava:
– Vocês estão me chamando de Cabeção, mas não viram nada. Vão ver a cabeça do Mauro. Dá duas da minha!
Quando Mauro surgiu, o grupo todo se precipitou em cima dele. E conferiu. Era verdade. Oscar riu:
– É verdade! A dele dá duas do Odirlei. Então, o Mauro é o Cabeção, e você o Cabeça.
Meio sem jeito, Mauro reage, batendo na barriga de Odirlei e acusando-o de gordinho
– Gordo, eu? Você está biruta – responde Odirlei. – Lá na Ponte não tem ninguém gordo. O homem (Brandão) não dá folga, puxa pra valer!
– Não pensei que ele fosse tão duro – acrescenta Oscar. – A gente olhava ele no Corinthians, parecia que não gritava. Mas agora que é com a gente estamos vendo que é o contrário. Grita o tempo todo, não para com os braços.
Aniversário de Lúcio
Alguém olha para a rua, vê um carro branco e preto, pergunta:
– De quem é aquele carro de torcedor?
– É do Polozzi – anuncia a Velha, Carlos. – Só ele tem um carro que a torcida conhece de longe.
– Vocês ficam falando – justifica-se o zagueiro -, mas ele é o carro mais joinha por aqui. Se eu jogo na Ponte, nada demais ter um carro com as cores do clube. Além disso, nenhum tem o som do meu carro.
E as brincadeiras continuaram pelo resto da manhã, na hora das fotos e até na improvisada festinha de aniversário, em homenagem a Lúcio, que completava 27 anos de idade. Polozzi, aliás, aniversariara na véspera, domingo.
Dobradinha é possível
Falando sério: quanto valeria e qual seria a força dessa seleção campineira? No atual futebol brasileiro, será difícil apontar jogadores melhores que os 11 escalados no Campinas Futebol Clube. É rigorosamente certo que pelo menos meio-time estará integrando nossas próximas seleções brasileiras. Entre eles, Carlos, Oscar, Polozzi, Zenon, Careca e Renato. Com essa estrutura, e uma comissão técnica formada por Osvaldo Brandão e Carlos Alberto Silva – ainda que o velho Brandão deteste dividir responsabilidades -, essa equipe não teria rival no futebol paulista. Quanto ao preço de cada um, nem vale a pena sonhar. Por menos de oito milhões, nenhum desses craques – ou, vá lá, os craques mais famosos – será negociado pela Ponte ou Guarani.
E haveria a possibilidade de fusão? Nem pensar. Com meio milhão de habitantes, Campinas tem todas as condições de sustentar dois grandes clubes, à base de uma rivalidade continuamente incentivada. Quem é Ponte, é contra o Guarani, e vice-versa. Numa mesma família, há casos de irreparáveis divergências clubísticas. Exemplo: Leonel Martins de Oliveira foi presidente do Guarani; na mesma época, Armando, seu irmão e sócio, era diretor de futebol da Ponte.
Fica claro, dessa maneira, que a existência de dois times é fundamental para a sua superação. Os rivais da capital que se cuidem: Ponte e Guarani, cada um ao seu estilo, querem fazer a dobradinha campineira, no Campeonato Paulista de 1978.
Duas fábricas de craques
Investindo no futuro: no Campeonato Paulista de juvenis A, recém-encerrado, Ponte e Guarani empataram no primeiro lugar. Pelo saldo de gols, a Ponte foi proclamada campeã.
Daqui a algum tempo, todos esses campeões e vice-campeões juvenis estarão ocupando o lugar dos atuais profissionais – que também, em sua maioria, começaram nas divisões inferiores. É só conferir:
Guarani – Mauro, Gomes, Miranda, Renato, Manguinha, Paulo Borges, Gersinho e Careca, todos ex-juvenis. Neneca e Zé Carlos são os veteranos que estabilizam o conjunto. Édson, Capitão, Bozó e Zenon foram comprados em ótimas condições e ainda novos.
Ponte – Carlos, Oscar, Polozzi, Humberto, Dicá, todos ex-juvenis. Jair, Vanderlei, Marco Aurélio e Dario são veteranos, e apenas o Dadá está há menos de um ano na equipe. Odirlei, Lúcio e Tuta foram comprados muito novos.