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‘Neymar rendeu muito mais que o valor da multa’, diz Laor

Presidente do Santos fala sobre a despedida do jovem craque, que se apresenta ao Barcelona nesta segunda, e exalta o esforço para mantê-lo no país até agora: ‘Só pelo aumento de torcida já teria valido a pena’

“O Neymar não foi para a Europa por dinheiro, porque ele ganhava bem demais no Brasil. Ele foi porque sempre foi um sonho e porque a organização do espetáculo futebol lá é incomparável com o que acontece aqui”

Em agosto de 2010, Neymar, então com apenas 18 anos, recebeu uma proposta de 35 milhões de euros para se transferir para o Chelsea, da Inglaterra. O presidente do Santos, Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro, não se comportou como a esmagadora maioria dos cartolas brasileiros – ao invés de aceitar na hora a oferta inglesa e se despedir de mais um jovem talento, convocou o pai e o empresário do atleta para uma reunião com executivos de bancos, empreiteiras e agências de publicidade interessadas na carreira do promissor atacante. Com todos acomodados em suas cadeiras, ligou um projetor e mostrou a imagem de uma cadeira vazia. Disse que aquele era o lugar do grande ídolo do esporte brasileiro, vago desde que Ayrton Senna morreu. “Se o Neymar aceitar nossa proposta de ficar no Santos, dará o primeiro passo para sentar-se nela”, afirmou o dirigente. Passados quase três anos, Neymar se despede do futebol brasileiro nesta segunda-feira, quando vestirá a camisa do Barcelona, seu novo clube, diante de uma multidão de torcedores no Camp Nou. Ainda assim, Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro, o Laor, acredita que seus esforços para prolongar a permanência de Neymar no país trouxeram muitos frutos, principalmente para seu clube. Licenciado do cargo por causa de um problema de saúde, ele comentou a transferência nesta entrevista a VEJA, concedida por e-mail, enquanto se recupera.

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O senhor sempre se disse um sonhador, quase um ufanista, por pensar ser possível manter o melhor jogador brasileiro em atividade por aqui. Ao final dessa jornada, o senhor avalia que foi positivo apostar tanto na permanência do Neymar? Na primeira coletiva do “fico” do Neymar, ainda em 2010, eu disse que o atleta estava fazendo história não apenas no clube, mas também no futebol brasileiro. E que estava se candidatando não apenas a ídolo, mas a mito. Na época, ele era um jogador promissor que, logo em seguida, envolveu-se em uma séria polêmica com o técnico Dorival Junior. Virou o “bad boy” do Brasil. No dia seguinte, na casa dele, olhei nos olhos do Neymar e vi um garoto brilhante, educado, carinhoso com a família, mas que teve um momento de desequilíbrio. O Santos o apoiou e lembro que fomos muito criticados por isso, mas sabíamos que estávamos lidando com uma joia como atleta, como pessoa e como comunicador. O resultado disso é claro hoje pelo tamanho da celebridade que ele se tornou, pelos títulos que conquistamos juntos e pelos resultados financeiros expressivos. Fora de campo, o Santos cresceu em torcida o que não crescia havia décadas, acrescentando mais de um milhão de torcedores a nossas fileiras, sem contar a criançada. Só pelo aumento de torcida já teria valido a pena, pois são consumidores em potencial. Mas ainda houve a internacionalização da marca, aumento de sócios e o avanço em todos os patamares financeiros possíveis.

Qual foi o jogo ou o momento em que o senhor percebeu que não havia mais jeito, que havia chegado a hora de Neymar ir embora do Santos? Quando o Mano Menezes o substituiu em um amistoso pela seleção brasileira, no Morumbi, aos 40 do segundo tempo, e o submeteu a vaias, eu senti que aquilo o abalou. Fazer sucesso no Brasil não é fácil, especialmente no futebol. Ali talvez tenha sido plantada na cabeça do garoto a sensação de que era hora não de sair do Santos, mas de deixar o futebol brasileiro. Além disso, a pressão sobre ele na seleção é descomunal. Esperam que um garoto de 21 anos seja a solução de todos os problemas. Se o Brasil for mal na Copa das Confederações, a maioria dos protagonistas pega um avião e volta para seus times na Europa. O Neymar estaria aqui no Santos, sendo julgado quarta e domingo nos estádios do Brasil. Some-se a isso a organização do nosso futebol em comparação com a do futebol europeu. O Neymar não foi para a Europa por dinheiro, porque ele ganhava bem demais no Brasil. Ele foi porque sempre foi um sonho e porque a organização do espetáculo futebol lá é incomparável com o que acontece aqui. Não adianta os clubes tentarem segurar os craques aqui se a nossa estrutura continuar como está. Precisamos de profundas mudanças estruturais, de organização e calendário para que as próximas gerações não encarem nossos times como vitrines de luxo. A diferença de encantamento é gigantesca e esforços dos clubes continuarão sendo episódicos exemplos de heroísmo.

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Como o senhor descreveria esse “lucro imaterial” trazido pelo jogador ao Santos? O Neymar tornou-se o maior artilheiro do Santos na era pós-Pelé, com 138 gols. E é um dos 13 maiores de todos os tempos do clube. Quanto vale isso para a história? Quanto vale o gol que levou o prêmio da Fifa, em 2011? Quanto valem os sorrisos de milhões de santistas diante dos dribles desconcertantes dele? Quanto valem nossas lágrimas de alegria na final da Libertadores, em 2011, após 48 anos de espera angustiante? Quanto vale a capa da Time? Quanto vale um milhão a mais de torcedores? Nosso clube é centenário e só teve um período com mais títulos do que este: a era Pelé. É pouco? Se o Neymar tivesse saído ao final do contrato, ele já teria valido muito a pena em todos os sentidos: esportivamente e financeiramente, pelos números que já mencionei. Mas o Comitê de Gestão fez desta negociação com o Barcelona muito mais do que uma simples venda de jogador, mas uma relação que promete ser duradoura e envolverá troca de expertise em revelação de talentos. O Santos e o Barcelona são conhecidos mundialmente como genuínas fábricas de craques.

Hoje o Santos tem um elenco ainda em formação, diferente daquele de 2010 ou 2011, quando o time jogava por música e encantava os torcedores de qualquer equipe. O senhor. acredita que pesou o fato de o Neymar querer jogar com jogadores como Messi, Xavi, Iniesta, Fábregas, onde ele pode dividir a responsabilidade que aqui ficava só nos seus ombros? Sempre que jogou no Santos, Neymar foi protagonista. Mesmo em 2010, com Robinho no time. No Brasil, protagonista é obrigado a brilhar sempre, por isso a cobrança e isso não vai mudar. E fato: ele nunca renunciou à sua responsabilidade porque tem muita personalidade. O Neymar ama o Santos. Você pelas manifestações seguidas de carinho, pela reação dele ao deixar o clube, desde o vestiário até o gramado, aquele choro incontido e indisfarçado. Ele está indo viver uma nova experiência num futebol mais organizado, onde o espetáculo é mais valorizado e a repercussão é mundial para cada gol que ele fez. Além disso, vai jogar ao lado de seus ídolos. Não me parece um problema de menor ou maior responsabilidade. No Barcelona ele terá a sua parcela e ela será muito grande, pois é uma contratação esperada há anos.

Após a derrota no Mundial de Clubes, o senhor também viu nos olhos daquele menino uma admiração pelo futebol jogado pelo adversário? O senhor percebeu uma curiosidade de saber como é aquela realidade, como é jogar em meio a tantos craques? Sem dúvida que aquilo mexeu com ele. Mas a decisão do Neymar foi amadurecida aos poucos e, como frisei, é claramente uma junção de uma série de fatores.

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