Obras no palco da final de 2013 estão fechadas para visita, e cronograma da etapa final é mantido em sigilo. Governo do estado promete entrega para abril, mas sabe-se que detalhes do entorno do estádio não estarão prontos para a Copa das Confederações
Bellini, o capitão vitorioso de1958 e 1962, olha para um mar de operários com uniforme da prefeitura do Rio. Ao redor da estátua que marca o ponto tradicional de encontro para as tardes de futebol no Rio, o barulho dos homens de capacete se confunde com o do trânsito da ruidosa Avenida Maracanã. Ao cheiro dos motores soma-se, agora, a poeira do cimento e do asfalto, sendo trocado ao redor de Bellini. O craque tem, às costas, aquele que já foi o “maior estádio do mundo”, e que, no momento, recebe a obra crucial para a próxima Copa do Mundo. Escondida de Bellini e de toda a população, acontece a fase final da transformação do velho gigante em uma arena nos novos padrões da Fifa, sede da final de 2014. A competição começa dentro de exatos 500 dias. Antes da Copa do Mundo, o ‘Maraca’ recebe a Copa das Confederações, no dia 15 de junho deste ano – portanto, em 138 dias.
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O governo do estado não detalha o cronograma das próximas etapas da obra, e informa apenas que, com 80% prontos, o Maracanã será reinaugurado em abril, dois meses antes das partidas. A entrega do estádio para a Fifa está marcada para 24 de maio – 15 dias antes da primeira partida da Copa das Confederações. O sigilo sobre o que ocorre dentro do imenso anel de cimento e metal, no entanto, aumenta o suspense sobre o que realmente estará concluído. Fora os cerca de 5.500 operários, ninguém pode constatar o estágio atual das obras. A justificativa oficial para o cerco ao canteiro de obras é o risco da fase atual, de instalação da cobertura, com guindastes e transporte de partes metálicas pesadas. Mas sabe-se que, por mais que a obra de agora seja tocada em ritmo acelerado, o projeto do estádio de 2014, com a reestruturação das áreas externas e as instalações que o tornam realmente uma arena moderna, não estarão 100% acabados. É o caso das duas passarelas que darão acesso ao estacionamento. Tanto a que será construída pela prefeitura, prevista para ficar pronta em 2014, quanto a de responsabilidade do governo estadual – cujo edital de licitação não está pronto – só estarão finalizadas para a Copa do Mundo.
Na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) foi criada a Comissão Especial do Legado dos Grandes Eventos para acompanhar, entre outras funções, a evolução do Maracanã. O grupo de deputados tentará restaurar a comissão, que não tem caráter permanente, este ano. Uma das medidas a serem tomadas, segundo o parlamentar Nilton Salomão, do PT, que presidiu os trabalhos, será ouvir o presidente da Empresa de Obras Públicas (Emop), Ícaro Moreno, responsável pelas obras do estádio. “Temos grande respeito pelo Ícaro, mas ele se equivocou nos prazos do término da obra. Primeiro, foi dito que entregariam em dezembro de 2012. Depois, fevereiro de 2013. Agora, abril. Vamos chamá-lo a prestar esclarecimentos na assembleia. Cronogramas podem sofrer alterações, mas não no caso do Maracanã, que é uma grande preocupação nossa. Trata-se de uma responsabilidade internacional assumida pelo Brasil”, argumenta Salomão. Na última quarta-feira, operários que costumam deixar o tuno às 17h, no estádio, foram avisados de que, a partir daquele dia, o trabalho poderia ser estendido até as 20h. Na corrida para acabar a reforma, foi oferecida na semana passada a remuneração de hora extra de 100% para os que se disponibilizarem a trabalhar no carnaval.
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Nos horários entre os turnos da tarde e da noite, o vai-e-vem de funcionários é frenético. “A cada dia chega mais gente”, contou um operário. O trabalho, no momento, é, sobretudo, a cobertura, que começa a ser içada. Depois, será colocada a membrana, de 2,2 toneladas, para cobrir 100% das áreas destinadas ao público – antes, a maior parte ficava fora do anel original. De acordo com os relatos de operários, as arquibancadas estão sendo impermeabilizadas. Em seguida, virão as novas cadeiras. O problema é que, como tem chovido quase todos os dias deste mês de janeiro, os trabalhos na parte do novo teto e da arquibancada ficam suspensos, e os funcionários alocados na área externa são transferidos para a parte interna da obra. A previsão para o resto do mês de janeiro e de fevereiro, segundo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), não é animadora: deve haver pancadas de chuvas de moderadas a fortes. “É um período de alto índice pluviométrico”, disse a meteorologista do Inmet Marlene Leal.
“Para a Copa do Mundo, o Maracanã estará pronto. Para a das Confederações, não sei. Vai dar para jogar futebol, mas ainda faltarão muitos ajustes”, afirmou outro operário, sem dizer o nome, acompanhado de uma plateia de colegas que assentiam com a cabeça. Para o deputado federal Edmar Arruda, do PSC, presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara – que abarca a Subcomissão para Acompanhamento, Fiscalização e Controle dos Recursos Públicos Federais destinados à Copa de 2014 e às Olimpíadas 2016 -, nem tudo deverá ficar pronto para a Copa das Confederações. “Eles vão entregar a parte interna para a Fifa. A área externa não estará 100% na Copa das Confederações”, afirmou.
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Por e-mail, a Secretaria Estadual de Obras nega que haverá diferença entre o Maracanã de agora e o de 2014. No momento, além do teto e da arquibancada, também são feitos acabamentos, como o dos banheiros, e a reforma em três das quatro rampas de acesso. Segundo os funcionários da obra, os tetos estão sendo forrados de gesso. “Nessa fase final, são várias frentes de serviços atuando em um cronograma móvel para atingir o objetivo”, informa a Emop, por nota. Na última medição, em novembro, 79% das obras tinham sido concluídas, segundo a secretaria estadual de Obras. Os trabalhos nas mudanças do Maracanã começaram em agosto de 2010 e foram postergadas, principalmente, por causa da recuperação estrutural e da remoção da antiga cobertura. No meio das obras, depois de parte das arquibancadas terem sido demolidas, descobriram que as infiltrações haviam comprometido completamente a estrutura de concreto que recobria o estádio.
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Com o passar dos meses, além da alteração do prazo da obra, o preço também aumentou. A previsão inicial de valor na matriz de responsabilidades para o estádio do Maracanã era de 600 milhões de reais. No entanto, a proposta vencedora foi de 705,6 milhões de reais. Em 15 de junho de 2011 foi entregue ao Tribunal de Contas da União o projeto executivo e o orçamento completo de 956,8 milhões. O aumento do valor foi justificado pela necessidade da completa reconstrução da cobertura e da inviabilidade do aproveitamento da estrutura existente, segundo relatório do TCU. Depois da auditoria do TCU e da Controladoria Geral da União, o governo do Rio apresentou um orçamento de 859 milhões de reais. Segundo a CGU, a obra está em 882,9 milhões.
O Maracanã agora é uma caixa de surpresas. Além de estar fechado para quem não está ligado diretamente à obra, a ordem da vez é que nenhuma autoridade do consórcio ou do governo fale sobre o estádio.