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O Comentarista do Futuro ícone blog O Comentarista do Futuro Ele volta no tempo para dar aos torcedores (alerta de!) spoilers do que ainda vai acontecer

Salvem as ‘zebras’!

Na largada da Copa do Brasil, Comentarista vai a 2004, no título do Santo André (2 x 0 Flamengo), e faz alerta sobre riscos do ‘patamar’ no futebol nacional

Baleias, o samba, o rádio e o mico-leão dourado seguirão ‘Vivinhos da Silva’ daqui a 18 anos, posso garantir! Já o mesmo, eu não posso dizer das ‘zebras’, que em 2022 – de quando vim – estarão sob sérios riscos de extinção no futebol. Vítimas de novidades que, sem muitos detalhes, adianto aqui: a concentração de dinheiro em poucos times – com o surgimento do que chamaremos de ‘primeiro patamar’ -, a entrada no mercado de grandes empresas e fundos de investimentos, comprando – repito: com-pran-do! – clubes nacionais e a tão propalada ‘profissionalização’ do esporte. E digo a vocês, caros leitores e leitoras de 2004, que serei um dos extremamente preocupados com isso, temendo que não venham a ser mais vistas ‘zebras’ maravilhosas como a de ontem, com o Santo André sapecando 2 x 0 no Flamengo em pleno Maraca, e levando pra casa a Copa do Brasil. Retornarei ao futuro deixando camisetas, adesivos, ‘bottons’ e outros ‘brequetes’ com os dizeres da campanha que hoje proponho: “Salvem as ‘zebras’!”

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Fosse eu um daqueles obcecados por teorias conspiratórias, levantaria aqui a tese de que tudo não passa de tramoia de cartolas inescrupulosos, banqueiros e a Rede Globo, claro, iniciada em 1986, quando foi sacada do ar a saudosa ‘Zebrinha’ da Loteria Esportiva. Mas o buraco é bem mais embaixo. Daqui a quase duas décadas teremos apenas três, sempre os mesmos três, dos chamados ’13 Grandes’ do futebol nacional apontados como favoritos e de fato alternando-se na conquista de todos os campeonatos. E os clubes em situação mais penosa e praticamente irreversível de dívidas estarão sendo vendidos a conglomerados e grupos econômicos internacionais. Ou seja: virá enfim o resultado dos anos e anos de descalabro na gestão dos times brasileiros.

Zebrinha da Loteria Esportiva/TV Globo
Zebrinha da Loteria Esportiva

Mas como se acostumar que os pequenos serão sempre presas fáceis para um reduzido grupo de endinheirados, eliminando um dos principais atributos que fazem do futebol um esporte tão diferenciado e apaixonante, a ‘zebra’? Deixei 2022 no dia da abertura de nova edição da Copa do Brasil, pródiga em vitórias impensáveis, e rezando para que, como ontem, elas continuem a acontecer. “Salvem as ‘zebras’!” Vou fazer a logo (marca)!

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Jamais houve ou haverá – ao menos até 2022 – ‘zebrão’ como esse de ontem no Maracanã. Quem um dia apostaria em um resultado assim, e numa partida em que, registre-se, o Santo André foi sempre melhor em campo, perdendo inclusive gols? Mas está longe de ser a única ‘pegadinha da bola’ no torneio. No passado, vocês hão de lembrar, clubes como o Criciúma (SC) – que em 1991, na terceira edição do torneio, sagrou-se campeão derrotando o todo-poderoso Grêmio-, o Linhares (ES) – semifinalista em 1994 – e o Juventude (RS)- campeão em 1999, derrotando o Botafogo, no Rio – já aprontaram das suas. Sem falar no Brasiliense, vice em 2002, mesmo ano em que o ASA de Arapiraca eliminou o Palmeiras. Na Copa do Brasil, o Londrina (PR) já descartou o Internacional (RS); o CSA (AL) e o XV de Novembro (RS) já mandaram pra casa o Vasco da Gama (RJ); o Ipatinga (MG) papou o Santos (SP); e por aí vai… Zebras ‘forévis’!

Aos envergonhados torcedores flamenguistas, trago a confortante notícia de que, de hoje a 2022, teremos novas folclóricas surpresas, a começar pelo próximo ano, quando – alerta de spoiler! – mais um time carioca (Fluminense) será batido, também na finalíssima, por outro emergente do interior de São Paulo (Paulista), em São Januário. O Ipatinga (MG), em 2006, e o Figueirense (SC), em 2007, também vão chegar longe, contra todos os prognósticos. A lista de campeões, infelizmente, vai aos poucos seguir a tendência e se concentrar nas mãos dos Corinthians, Atléticos, Palmeiras e Fluminenses ‘da vida’… Os ‘tubarões’! Salvem as ‘zebras’!

Final Santo André e Flamengo, em 2004
Final Santo André e Flamengo, em 2004

Santo André chegou aqui de forma brilhante e surpreendente, mas tão obscuro e desconhecido que fez Galvão Bueno, na transmissão de TV da primeira partida da final (2 x 2, em São Paulo), narrar o segundo tento paulistano referindo-se ao clube como São Caetano -ato falho aludindo ao maior rival na região do ABC, recentemente finalista de dois Campeonatos Brasileiros (2000 e 2001) e de uma Libertadores (2002)-. A participação democrática de clubes ‘desconhecidos’ é uma marca que a Copa do Brasil não perderá. Em 2022, adianto, estará estreando no certame o Tuntum, curiosa e recém-fundada agremiação de município maranhense com mesmo nome. Reside nesta ‘pluralidade’ e no sistema de ‘mata-a-mata’ a minha fé de que, assim como a inflação – sim, ela vai voltar -, retornem ao nosso dia-a-dia as ‘zebras’ de hoje e sempre.  

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Neste futuro sob alto risco de extinção, a ‘zebra’ será ‘avistada’ em momentos raros. Como em 2014, quando o América de Natal vai perder a primeira partida, em casa, contra o Fluminense (3 x 0), deixar o primeiro tempo do jogo seguinte, no Maracanã, amargando um 2 x 1, e, sacra-proeza, na etapa final marcar 4 gols (três deles nos 15 minutos finais) e eliminar o tricolor carioca (pela regra do ‘gol fora’, que em 2022 não existirá mais). Ou em 2018, quando o modesto Aparecidense (GO) eliminará o Botafogo, mais tradicional clube alvinegro de camisas listradas – como as zebras.

Aparecidense elimina Botafogo da Copa do Brasil
Aparecidense elimina Botafogo da Copa do Brasil

A Copa do Brasil nasceu em 1989 para minimizar as gritas após a diminuição do número de clubes disputando o Campeonato Brasileiro, a partir de 1987. Chegará a 2022 pagando ao vencedor premiação polpuda: R$ 60 milhões, sem contar os ganhos aferidos a cada passagem de fase. E com muitas histórias de “David contra Golias” a contar. A quantidade de resultados inesperados nesta edição 2004 vai ajudar a criar a fama de “Ano das Zebras”. Chegaremos ao fim do ano registrando marcos do imponderável: na Libertadores, adianto, o gigante Boca Juniors perde a final para um até aqui insignificante clube colombiano, Once Caldas; na Champions League, anotem, vai dar um clube português (Porto); na Eurocopa, Grécia!; Campeonato Espanhol? Copa da UEFA? Nada de ‘galácticos’ do Real ou Barcelona… Valencia campeão em ambos! Viva 2004! 

Disputa de bola no jogo entre Porto e Once Caldas no Mundial de Clubes
Disputa de bola no jogo entre Porto e Once Caldas no Mundial de Clubes

Foi há exatos 40 anos, em 1964, numa entrevista do treinador Gentil Cardoso, da Portuguesa-RJ, sobre improvável vitória em jogo com o Vasco da Gama, que surgiu o termo ‘zebra’ – referência ao animal não listado entre os 25 do ‘Jogo do Bicho’. Naquele dia, curiosamente, deu Lusa na cabeça (2 x 1). Gentil, pra quem não sabe, é autor de vários mantras do esporte, como: “Futebol é uma caixinha de surpresas”; “Quem se desloca, recebe, quem pede, tem preferência”; “Treino é treino, jogo é jogo”; e “Quem não faz, leva”. Gênio! A propósito, alerto que em 2022 será este outro personagem em extinção em nosso futebol, o que me inspira a criar, desde já, outra campanha: “Salvem os técnicos brasileiros!”

FICHA TÉCNICA
FLAMENGO 0 × 2 SANTO ANDRÉ

Data: 30 de junho de 2004 (quarta-feira, 21h45)
Estádio: Maracanã, Rio de Janeiro
Competição: Copa do Brasil (final)
Árbitro:  Carlos Eugênio Simon/RS (FIFA)
Assistentes: Altemir Hausmann/RS (FIFA) e Ville Tissot/RS
Público: 71.988 pagantes (73.210 presentes)
Renda: Cr$ 2.783.190,00

FLAMENGO: Júlio César; Reginaldo Araújo, André Bahia, Fabiano Eller e Roger (Athirson); Da Silva, Douglas Silva (Negreiros), Robson. Técnico: Abel Braga 

SANTO ANDRÉ: Júlio César; Alex, Gabriel e Dedimar; Nelsinho (Da Guia), Dirceu, Ramalho (Ronaldo), Élvis e Romerito (Dodô); Sandro Gaúcho e Osmar. Técnico: Péricles Chamusca

Gols: Sandro Gaúcho (7’) e Élvis (22’) do 2ºT

Cartões Amarelos: Jean, André Bahia e Fabiano Eller (FLA); Alex, Dirceu e Julio Cesar (SAA)

PRA OUVIR GALVÃO CHAMANDO O SANTO ANDRÉ DE ‘SÃO CAETANO’ NO PRIMEIRO JOGO

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