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A ressureição de Alecsandro em 2016

Atacante vitorioso, goleador e campeão em quase todas as equipes que defendeu, Alecsandro foi ao inferno por conta da acusação do uso de substância proibida. Em caso único, comprovou sua inocência e voltou aos gramados para fazer o que mais sabe: gols. A torcida do Palmeiras agradece

A vitória por 1 a 0 do Palmeiras frente ao maior rival, Corinthians, em partida válida pelo Campeonato Paulista no dia 3 de abril, jamais sairá da cabeça do atacante Alecsandro. Após o clássico, acabou flagrado do exame antidoping por conta da presença do agente anabolizante Andarine. Afastado preventivamente, foi julgado em agosto, quando recebeu como pena a suspensão por dois anos. 

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Certo de sua inocência, Alecsandro conseguiu comprová-la junto à Wada, Agência Mundial Antidoping, que enviou parecer eximindo de culpa o atleta, uma vez que a presença da substância ilegal se deu pelo uso de uma loção contra calvície que continha flutamida, no primeiro caso relatado no mundo com essa interação metabólica. De volta aos gramados, Alecgol, como gosta de ser chamado, abre seu coração para PLACAR.

Filho de jogador de futebol, quando criança você sempre pensou em seguir essa carreira?

Na verdade, eu já nasci dentro do futebol. De dentro da barriga da minha mãe, com certeza, quando ela ia ao estádio torcer pelo meu pai, eu já era jogador. Me lembro quando meu pai nos levava (juntamente com meu irmão Richarlyson) para assistir aos jogos, de entrar em campo junto com ele ou acompanhar os treinos. Eu acabei convivendo com aquilo. Acredito que eu não tive nem sonho de ser jogador, eu já nasci jogador.

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Para qual time você torcia naqueles tempos?

Sempre torci por um clube, mas não posso falar qual. Foi até ideia do Richarlyson não falarmos o time pelo qual a gente torce (NR: ele afirma somente que ambos torciam para o mesmo). Mas, como um bom bauruense e pelo fato de o meu pai ter jogado lá, posso falar que o primeiro time pelo qual aprendi a torcer foi o Noroeste. É lógico que depois, pelo fato de ser de São Paulo, a gente teve outro clube, mas isso nós preferimos guardar segredo.

Como foi o seu começo no futebol?

Comecei a jogar futebol no Liceu Noroeste, uma escola particular em Bauru, onde acabei ganhando bolsa para estudar por jogar bem. Então decidi pedir uma bolsa também para o meu irmão, mas eles me falaram que ele precisava jogar para entrar, então eu disse que ele jogava (sem que ele soubesse disso). Foi engraçado, porque eu levei o Richarlyson ao treino e falei para ele ir para o gol, porque, jogando bola na rua, em Bauru, ele era bom no gol. Fomos campeões jogando juntos, o nosso primeiro título. O Richarlyson no gol e eu na linha, no futebol de salão, hoje futsal. Ele acabou sendo o goleiro menos vazado; e eu, o artilheiro. Ganhamos uma bicicleta como prêmio e para nós naquele tempo aquilo era muita coisa. Depois disso continuamos jogando juntos no futebol de campo, eu como meio-campista e ele como lateral.

Já a sua primeira oportunidade no futebol foi quando?

A primeira oportunidade foi em um teste que eu fiz em Bauru. Tinham olheiros de vários clubes, como Santos, Corinthians, Vasco, Portuguesa Santista… Sei lá, acho que uns seis a oito clubes. Eu passei em quatro, mas acabei não indo para nenhum, não sei bem por quê. Depois de um tempo eu fui para o Vitória da Bahia e acabei ficando por lá. O Richarlyson só não ficou pois naquela época os dois laterais esquerdos do time de base, titular e reserva, eram da seleção brasileira juvenil, algo que nunca tinha visto. De lá, depois de um tempo fui emprestado para o Sport, Ponte Preta e Cruzeiro, que acabou me contratando e de onde saí para o Sporting de Portugal.

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Como foi essa experiência pela Europa? Você demorou a se adaptar?

Foi uma experiência muito boa, fui campeão por lá (NR: Taça de Portugal de 2006/07 e 2007/08). Não demorei a me adaptar, apesar de jogar em posição diferente. No Sporting eu jogava pela esquerda mais como um ponta. A gente jogava no mesmo esquema que o Palmeiras joga hoje, e eu pelo lado esquerdo, com o Liedson centralizado e o Nani mais à direita. Eu queria ter continuado no Sporting e tive muita proposta de outros times, inclusive do futebol espanhol, mas, como eu tinha contrato com o Cruzeiro, acabei tendo que voltar. Foi nessa época que fui aos Emirados Árabes, onde joguei no Al Wahda.

Alecsandro foi contratado pelo Palmeiras, junto ao Flamengo, em 2015 – Mauro Horita/AGIF

Qual foi o maior ano da sua carreira e o clube que mais te marcou positivamente?

Eu não tenho nem como citar um único clube ou um título, pois todos foram muito especiais. Por onde passei tive o carinho e respeito da torcida e de todos os profissionais. Fui muito bem recebido e entrei e saí pela porta da frente em todos eles. Durante quase toda a minha carreira eu tive grandes anos. Difícil falar um único grande ano, pois sempre fui muito bem pelos clubes que passei. O pessoal aqui do Palmeiras costuma falar que sou o cara que mais bate fotografia nos aeroportos, com torcedores dos vários times em que passei. Ainda assim, se fosse para citar um período em que eu estive no meu ápice, diria que foi entre 2010 e 2011, pelo Internacional, quando fui campeão da Taça Libertadores, e no Vasco da Gama, onde vivi um grande momento, creio que em nível de seleção brasileira. Fiz mais de 60 gols no Inter e logo em seguida, no Vasco, fomos campeões da Copa do Brasil, onde eu fui artilheiro, e vice do Campeonato Brasileiro. Sendo assim, é difícil destacar um único time, mas sim esses dois anos.

Com 35 anos, entre os maiores artilheiros em atividade no Brasil e no campeão do Campeonato Brasileiro (na época, ainda líder), como se sente hoje o Alecgol?

Me sinto muito feliz por estar entre os maiores artilheiros em atividade do Brasil, sabendo que vou continuar jogando por mais alguns anos, aumentando essa minha marca e ainda em um grande clube, como é o Palmeiras, carregando esse nome de Alecgol e continuando essa minha saga de conquistar títulos por onde passo, que pra mim é o mais importante. Caso a gente ganhe este Campeonato Brasileiro, e se Deus quiser isso vai acontecer, teremos na minha família cinco títulos de Campeonato Brasileiro. Um do meu pai, pelo Coritiba, três do Richarlyson, pelo São Paulo, e um meu, aqui no Palmeiras. Posso dizer que não fui um craque à altura de um Ronaldo Fenômeno, mas me considero um jogador muito feliz e realizado.

Aliás, você talvez tenha ganhado mais títulos que o Fenômeno…

Que é isso, não dá nem para me comparar com o Ronaldo, ele foi campeão mundial e é o Fenômeno.

Vamos agora para um assunto meio espinhoso. Quando aconteceu o caso do doping, passou pela sua cabeça, em algum momento, que sua carreira havia acabado?

Na hora. O futebol é muito dinâmico e, com uma punição de doisa quatro anos, você perde espaço, perde sequência, perde ritmo. Eu fiquei três meses sem jogar e voltei totalmente fora de ritmo, é até injusto você entrar para jogar em um time que vem treinando todo dia, e você não. Então uma punição de dois anos, se não tivesse acabado com a minha carreira, me deixaria pelo menos muito próximo disso. Quando recebi a notícia, a primeira coisa que perguntei foi se não tinham confundido o nome, uma vez que sabia da minha inocência.

Na edição anterior da revista Placar, nas frases do mês, havia uma onde você falava que seu filho foi chamado de ‘dopadinho’ e sua esposa evitava ir até para a academia. Como foi para você passar por esses momentos?

Foi muito difícil. O doping é visto de uma forma muito negativa, como alguém que tentou burlar a lei ou é dependente de algum tipo de droga. Minha esposa é atleta também, então ela evitava ir para a academia para não ser julgada como esposa de um cara que havia supostamente usado anabolizante (NR: a substância encontrada no organismo do jogador foi a O-Dephenylandarine, anabolizante, metabólito do Andarine), como esteve em todas as manchetes durante dois dias, assim como meu filho. Creio que minha família sofreu muito mais do que eu. Eu notei que a imprensa nesse sentido é muito cruel. Eu lembro que, quando noticiaram o meu caso, a manchete que dizia que eu tinha sido pego no exame antidoping ficou por mais de 28 horas nos sites, incluindo o nome da substância anabolizante. Para todo lugar que se via era a minha notícia em destaque. Já o caso do Arouca, por exemplo, quando ele foi pego no doping, a imprensa não colocou a substância porque era apenas uma injeção corticoide (NR: as substâncias corticosteroides são geralmente usadas em lesões musculares e articulares). Foi muito duro, fui imediatamente suspenso de praticar a minha profissão e meu contrato poderia ser quebrado a qualquer momento. Sentei com meu advogado e comecei a planejar cada passo a ser dado para provar a minha inocência. 

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No Atlético Mineiro, Alecsandro teve participação importante na partida decisiva que resultou na conquista da Taça Libertadores de 2013 – Bruno Cantini/Atlético-MG

E por que você acha que acontecem casos como esses de noticiarem de maneiras diferentes, como no seu e no do Arouca?

Porque a imprensa quer vender. E infelizmente vender notícia ruim. Por que ela não colocou que eu fui pego no antidoping apenas? Ponto. Por que no meu caso, que era anabolizante, ela fez questão de colocar a substância e no caso do Arouca, que era apenas um corticoide, ela não fez questão de colocar? Esse é o questionamento que eu faço. Estou dando o exemplo do Arouca, que é mais próximo, mas tem vários casos.

Como você recebeu a notícia que a Wada (Agência Mundial Andidoping) confirmou que você não infringiu as normas do uso de substâncias proibidas e que poderia voltar a jogar?

Eu estava vendo um filme em casa, pronto para ir correr na academia, como eu fazia sempre nesse período parado. Quando eu decidi que não iria sair de casa e ia ficar assistindo ao filme, meu advogado me ligou perguntando se eu estava sentado. Eu disse: “Olha, para você ter uma ideia, estou deitado”. Então ele me perguntou se tinha um champanhe para comemorar, pois a Wada havia mandado a notificação e dentro de dois ou três dias eu já poderia voltar a jogar. Foi quando eu mudei de ideia e saí para correr. Quando cheguei em casa de volta, meu filho já havia ficado sabendo pela internet e minha esposa, pelo meu advogado. Eu nem tive pra quem contar, só comemorar o momento. 

Nos anos 1980, com o irmão Richalyson (E) e o pai, Lela, durante os treinos do Coritiba – Arquivo Pessoal

Naquele momento em que estava assistindo ao filme, você estava sem perspectiva. De repente, em uma ligação, você é informado de que poderia voltar a fazer o que mais gosta na vida. Esse momento teve qual sabor? De um título?

De um título não, mas daquele gol aos 45 minutos do segundo tempo, quando a bola sobra no meu pé pra eu marcar o gol (afirma sorrindo com brilho nos olhos). 

Já pensou ou já esteve perto de jogar no Coritiba, onde o seu pai foi campeão brasileiro em 1985?

Já tive três oportunidades, propostas firmes de pessoas lá de dentro para defender o Coritiba, mas em duas eu recusei de imediato, pois a minha contratação estava relacionada com a política do clube. Uma delas, eles queriam me levar, mas com a condição de meu pai ir junto, era uma contratação associada a ele. Eu nunca quis fazer parte de política, nem fora nem dentro do futebol. Na outra oportunidade, eu estava no Sporting e com contrato com o Cruzeiro, por isso nunca deu certo.

No Colorado, em 2010, conquistou sua primeira Taça Libertadores – Alexandre Lops/Internacional

Existe algum clube que você não jogaria de forma alguma? Se sim, qual e por quê?

Não. Nunca tive problema com time algum, inclusive já joguei por rivais, como Flamengo e Vasco, Atlético-MG e Cruzeiro. Mas eu lembro que tinha na minha cabeça que iria jogar um dia em um time grande de São Paulo, não sabia exatamente qual, mas aqui estou no Palmeiras.

Hoje você está com 35 anos. Pretende se aposentar daqui a quantos anos?

Eu quero agir com a razão, não somente com a emoção, pois se depender dela eu jogo mais 20 anos, mas, pelo que eu entendo do meu corpo, atuando em alto nível, hoje eu te diria que jogo ainda entre dois e quatro anos em grandes clubes do Brasil.

Qual jogador você escolheria como o melhor parceiro de ataque que você já teve? E o melhor zagueiro contra quem já jogou?

O melhor parceiro de ataque que eu já tive foi o Diego Souza, que hoje está no Sport. Posso dizer que nosso futebol se encaixou legal, mas gostaria de jogar mais ao lado do Gabriel Jesus, acho que também faríamos uma excelente dupla. Agora, o melhor zagueiro que enfrentei foi o Cannavaro, em uma Champions League, quando ele estava na Internazionale. Na hora em que o vi, baixinho, pensei que iria ganhar todas por cima, mas não ganhei nenhuma. Por baixo, então, piorou. Aquele foi um jogo que me irritou. Já no Brasil, deixa eu ver se vou dar moral para algum amigo… Acho que o Dedé, do Cruzeiro.

Durante tantos anos no futebol, sobretudo depois de tudo que aconteceu contigo este ano, o que você mais aprendeu no futebol?

Olha, aprendi que o jogador de futebol é um cara sozinho e o passado pouco importa. O que interessa é o gol que você faz hoje, e isso amanhã já não vale nada. Veja lá o caso do cara que marcou gol de título mundial em um ano e no outro estava sendo agredido por torcedor (NR: refere-se à suposta agressão sofrida por Paolo Guerrero no Corinthians quando torcedores invadiram o Centro de Treinamento da equipe paulista em fevereiro de 2014). Isso não existe. Por isso não me iludo com nada, tenho a cabeça bem centrada quanto a isso, o que importa é o hoje e o amanhã. 

No Flamengo, manteve a sina de ser campeão, ao conquistar o Campeonato Carioca de 2014 – Revista Placar

Durante seu afastamento, como seus colegas agiram com você?

Eu fiquei positivamente surpreso, pois muitos caras me ligaram, alguns que eu nem sequer sabia que tinham meu telefone, disso eu não posso falar nada.

Por fim, podemos dizer que futuramente seguirá como técnico?

Não sei, mas confesso que, hoje em dia, durante as concentrações, costumo assistir a muitos jogos para ver como os atletas se posicionam e ver mais taticamente as partidas. Quem sabe…

A primeira oportunidade no futebol foi no Vitória da Bahia – EDSON RUIZ

ALECSANDROLocal de nascimento: Bauru (SP)Data: 4/2/1981 – 35 anosPeso: 81 kg | Altura: 1,83 mPé preferencial: direitoPosição: atacanteClube atual: PalmeirasGols na carreira: 235

Sem o gol contra o Vitória, na última rodada do Brasileiro

O começo de carreira como meio-campista foi importante para que Alecsandro se tornasse um atacante com grande papel tático – Mauro Horita/AGIF

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