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Rogério Ceni, Alex e Marcelinho: os ídolos na fogueira, em edição de 2001

Referências de São Paulo, Palmeiras e Corinthians viveram momentos conturbados com torcedores e dirigentes na virada do século

Edição de junho de 2001 destacou ídolos do futebol paulistano
Edição de junho de 2001 destacou ídolos do futebol paulistano

O futebol paulista desfrutou do talento e da personalidade de três grandes estrelas na virada para o século XXI. Rogério Ceni, do São Paulo, Alex, do Palmeiras, e Marcelinho Carioca, do Corinthians, marcaram época, conquistaram inúmeras taças e mexeram com a paixão dos torcedores, para o bem e para o mal. Em junho de 2001, coincidentemente, o trio vivia um momento conturbado, o que motivou uma chamativa capa de PLACAR sobre os “ídolos queimados”.

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Na ocasião, Ceni vivia conflito com a diretoria tricolor em razão de uma frustrada negociação com o Arsenal, enquanto Alex, então emprestado ao Verdão pelo Parma, via seu “custo-benefício” em debate após eliminação na Libertadores diante do Boca Juniors. Marcelinho, por sua vez, vivia entre tapas e beijos com o técnico Vanderlei Luxemburgo (à época grafado como Wanderley) e vivia os dias finais daquela passagem (se transferiria pouco depois para outro rival, o Santos).

A reportagem de capa foi escrita a seis mãos, por outros três craques, estes do jornalismo: André Rizek ficou responsável pelo texto de Marcelinho, Arnaldo Ribeiro pelo de Ceni e Paulo Vinícius Coelho pelo de Alex. O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas-feiras recupera um tesouro de nossos arquivos, reproduz abaixo, na íntegra, o texto de junho de 2001:

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NA FOGUEIRA

Marcelinho, Alex e Rogério brilham, levam seus times nas costas. Mas, por mais que façam, parece que há sempre um foguinho em seus traseiros

Foi a negociação do goleiro Rogério, do São Paulo, com representantes do Arsenal, da Inglaterra, o estopim da crise. A diretoria teria sugerido um aumento para segurá-lo. O goleiro até hoje dá entrevistas reclamando que não viu a cor do dinheiro.

A torcida do São Paulo adora Rogério. Diferente do sentimento dos corintianos, que amam e odeiam Marcelinho nos diferentes momentos que ele atravessa no clube. Ou dos palmeirenses, que vibram quando Alex decide jogos ou faz gols. Mas como isso nem sempre acontece…

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Os três começaram o ano como principais referências de suas torcidas e maiores contas bancárias de seus clubes. Mas terminam o semestre como jogadores em litígio com a torcida, com a comissão técnica ou com a diretoria.

A fogueira em que ardem Rogério, Alex e Marcelinho já queimou muitos craques do futebol brasileiro. Em 1949, depois de uma derrota do Flamengo para o Vasco por 5 x 2, a torcida rubro-negra ateou fogo à camisa do ídolo Jair. Ele arrumou as malas e foi para o Palmeiras, o mesmo clube que agora pode queimar Alex.

Abrir mão dos ídolos pode significar um tempo perdido à caça de alguém capaz de substituí-los. Mas em tempo em que o dinheiro é curto e as vaidades são grandes, é provável que Rogério, Marcelinho e Alex não emplaquem o verão em seus times. PLACAR conta como e por que eles estão sendo fritados.

Marcelinho – Um caso de amor e ódio

Marcelinho carrega o carma que acompanhou Rivelino, Neto, Sócrates e outros craques corintianos ao longo da história: é endeusado nas vitórias e execrado nas derrotas. Ainda por cima, vive às turras com o técnico

Por André Rizek

Marcelinho Carioca, do Corinthians, contra o União São João, Pacaembu -
Marcelinho Carioca, em 2001, diante do União São João, no Pacaembu –

Marcelinho Carioca sorri de lado quando é questionado sobre o fato de ser um ídolo mal-amado. “Como assim? De jeito nenhum, só quem tem problema comigo são as torcidas dos outros clubes”, diz ele. Não é bem assim. A relação de amor e ódio entre ele e a Fiel é notória. Se o time ganha um campeonato, quase nenhum corintiano vacila ao apontá-lo como o maior responsável pela conquista. Mas quando o time perde… Quem é o maior culpado? Marcelinho também, é claro.

De fato, nenhum homem venceu tanto pelo clube (um Mundial de Clubes, dois Brasileiros, uma Copa do Brasil e quatro Paulistas). Mas a popularidade dele não é e nunca foi estável. Pesquisa do site de PLACAR (www.placar.com.br) sobre o principal ídolo corintiano na atualidade aponta Ricardinho na primeira posição, com 41% dos cliques. Marcelinho tem 33%, um número que certamente vai mudar de acordo com o próximo triunfo ou fracasso da equipe.

Ele sabe bem disso. “Isso de ter problemas não acontece só comigo. Já conversei muito com o Neto sobre isso. Se você pegar a história do clube, vai ver que foi a mesma coisa ou até pior com o Neto, o Sócrates e o Rivelino. Eles também tiveram problemas como eu”, afirma. “Quando você ganha, nossa, está no céu. Te tratam até com exagero, uma coisa fora do comum. Se perde, é horrível. Eu fiquei uns dias sem colocar o pé para fora de casa depois daquela derrota para o Palmeiras. Sabia o que me esperava.”

O corintiano até hoje grita o nome de jogadores esforçados que marcaram época, como Ezequiel e Wilson Mano, nos estádios. Com Marcelinho e craques do passado, não se pode esperar paciência. Só são amados nas vitórias. Por quê?

Eterna gangorra

Neto não se conforma: “É uma puta sacanagem o que fazem com o Marcelinho. Por que não vão cobrar jogadores comuns, como o Otacílio, o Índio?”, diz ele, que foi colega de Marcelinho em 1996 e 1997. Rivelino, apontado por muitos como o maior jogador da história corintiana, deixou o clube como vilão depois de perder um título paulista para o Palmeiras em 1974. Sócrates chegou a ameaçar abandonar o Parque São Jorge depois de uma derrota para o XV Piracicaba no Pacaembu, no Paulistão de 1980, quando ele e Amaral viraram reféns dos torcedores no estacionamento do estádio.

Neto era rei em 1990, mas foi embora em 1993, quando já não tinha mais nenhum clima com a Fiel após a perda de um título paulista para o Palmeiras, aquele que tirou o Palestra da fila. “É difícil ser ídolo no Corinthians, é uma gangorra. Quando está bem, você é venerado. Mas não existe paciência se comete uma falha ou começa a ir mal. Você precisa se policiar a todo momento.” E aí é que Marcelinho vacila, no entender de Neto. “Acho que ele joga com amor ao Corinthians, sim. Mas ele dá margem para pegarem no pé dele, apronta muitas vezes dentro e fora de campo.”

E como dá margem. Assim como o próprio Neto, Marcelinho se notabiliza por expulsões tão tolas quanto a atitude de alguns torcedores corintianos. Ele levou o cartão vermelho nos minutos iniciais do jogo com o Fluminense que marcou a reestréia de Wanderley Luxemburgo e eliminou a equipe do Rio-São Paulo. Igualmente ingênua foi a expulsão contra o Atlético-PR na Copa do Brasil, que ameaçou a classificação para a semifinal da competição e acabou tirando-o da estréia na Copa dos Campeões.

Marcelinho Carioca, do Corinthians, arrumando a bola, para bater pênalti contra o Santos, Campeonato Paulista, Morumbi -
Marcelinho diante do Santos, na semifinal do Paulista –

No limite do suportável

Luxemburgo anunciou que ia multá-lo nas duas oportunidades. E Marcelinho não engoliu muito bem. Os dois mantêm uma relação de aparências desde 1998, na primeira vez que brigaram publicamente e o jogador acabou afastado em pleno Campeonato Brasileiro. Às vezes trocam elogios mútuos, mas se desentenderam mais uma vez na frente de todos na preleção para o jogo com a Ponte Preta, em São José do Rio Preto, mês passado, pela Copa do Brasil. Motivo: mais uma vez Marcelinho questionou o treinador na frente dos colegas, por discordar do tom e dos berros de Luxemburgo com os jogadores.

Flor que se cheire, santo, Marcelinho nunca foi. Não fosse o vice-presidente de futebol do clube, Antônio Roque Citadini, Marcelinho teria se transferido para o Cruzeiro de Luiz Felipe Scolari no começo do ano. “A torcida queria a cabeça do Marcelo. Mas ele vai encerrar a carreira aqui”, afirma Citadini.

Marcelinho diz o mesmo. Fala que escreveu seu nome no clube e não sai até pendurar as chuteiras. Mas sabe que seguirá amado e mal-amado até o fim. Diz que está fazendo análise para aprender a se controlar. A iniciativa foi 100% sua. Luxemburgo nem opinou. Até porque o relacionamento dos dois se restringe ao gramado. O técnico garante que não mantém conversas particulares com o jogador sobre seu temperamento. Se ele sai da linha, multa e bola pra frente.

Perdão eterno

Marcelo sabe que sair é muito arriscado. Que outro clube seria capaz de perdoá-lo eternamente, como faz o Corinthians? É preciso ter uma história vitoriosa num clube para isso acontecer. Ele chegou ao Parque São Jorge no final de 1993, por indicação de Mário Sérgio, o treinador na época. Virou o maior ídolo do time dois anos depois, quando comandou as conquistas daquele ano, o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil.

Só foi ter seu espaço ameaçado em 1997, com a chegada de Túlio, uma estrela para rivalizar com ele. O centroavante ganhava, além do salário igual ao de Marcelinho, uma cota por gol marcado. Quando o craque descobriu isso, exigiu o mesmo privilégio. E teve. Foi então que surgiram os comentários de que um boicotava o outro. Resultado: Mário Sérgio, já como diretor, chamou os dois e sugeriu fazer a média dos gols marcados até então e pagar uma cota fixa, para acabar com os problemas. Pendências financeiras à parte, o clube foi mais uma vez campeão paulista naquele ano. E, quando o Corinthians ganha, Marcelinho está sempre no céu. Ninguém ousa contestá-lo.

No seu Corinthians, ele já bateu de frente também com outros ídolos, como Rincón, hoje seu desafeto. Tudo porque não gosta muito de dividir seu espaço. E assim vai continuar: amado nas conquistas, em que sempre tem participação fundamental, odiado nas derrotas, quando nem sempre é o único culpado. Mas, para a Fiel, sempre será. Em parte por culpa da torcida, em parte por sua própria culpa.

Rogério Ceni – O encanto acabou?

Bastou uma proposta do exterior, oficial ou não, para arranhar uma relação de 11 anos de Rogério com o São Paulo. Conheça todos os detalhes da história e entenda por que o maior ídolo da torcida pode deixar o clube

Por Arnaldo Ribeiro

Rogério, do São Paulo, defendendo uma bola, no jogo contra o Sport, Estádio Rei Pelé -
Rogério, do São Paulo, defendendo uma bola, no jogo contra o Sport, no Estádio Rei Pelé –

“E agora vamos homenagear nosso grande capitão e líder: Rogério Ceni!” Conduzido pelo mestre de cerimônias do São Paulo, o goleiro subiu ao palco e foi ovacionado efusivamente pela cartolagem que lotava uma boate paulistana na comemoração do Rio-São Paulo.

Era 12 de março. Rogério vestiu a faixa de campeão sobre o terno impecável e foi mais aplaudido que o técnico Vadão, que Kaká, o herói do título, e que França. Detalhe: na Seleção, ele nem havia participado da final contra o Botafogo. Antes de chegar à mesa onde estava sentada sua mulher, Sandra, o goleiro cumprimentou os conselheiros um a um e recebeu uma série de tapinhas nas costas.

Hoje, três meses depois, boa parte desses mesmos conselheiros cochicha comentários maldosos sobre o principal ídolo do time. “Ele fala demais. Pensa que é quem?” O que mudou, afinal?

A confiança. Desde que apresentou uma proposta de empresários e passou a pleitear, muitas vezes via imprensa, um aumento salarial, Rogério deixou de ser inquestionável para a cúpula são-paulina. Da mesma forma, desde que ignorou uma oferta por ele e vem sonegando o reajuste, o São Paulo deixou de ser inquestionável para ele. A relação está arranhada e o destino do goleiro, incerto.

Em 24 de abril, Rogério procurou o diretor de futebol, José Dias, para dizer que recebera uma proposta irrecusável do Arsenal, da Inglaterra. No dia seguinte, ele estava na sala do presidente do São Paulo, Paulo Amaral, com o papel em mãos: um timbre com a marca Tango Assessoria Esportiva e os valores (4 milhões de dólares para o clube, 1,5 milhão para o goleiro e mais 1,5 milhão por ano, de salários). A “independência financeira”.

Amaral pediu um tempo para pensar e não demorou mais do que 24 horas para chamar Rogério de volta. Disse que a proposta não era oficial e que não iria considerá-la. Segundo um dirigente tricolor, como Rogério se mostrava irredutível, Amaral desafiou-o. “Então traga essa proposta oficializada que nós venderemos você por esse valor.” Mais ofendido ainda, o goleiro teria proposto um reajuste para ficar, também negado. Deixou a sala batendo a porta com força.

Desde então, começou o bate-boca entre as partes pela imprensa. Rogério dizendo que o clube sequer recebeu os empresários responsáveis pela proposta. O São Paulo dizendo que o goleiro havia caído num conto do vigário.

Uma trégua foi ensaiada no dia 3 de maio, após novo papo entre José Dias e Rogério. O goleiro disse que lhe foi prometido um reajuste (o salário saltaria de cerca de 110 mil reais para 160 mil). Dias nega: “Eu só disse que tentaríamos algo com nossos patrocinadores. Não prometi nada.” De fato, Dias consultou a LG sobre um eventual acordo para a exploração da imagem de Rogério. Em vão.

Prestígio abalado?

Rogério Ceni é um dos poucos jogadores que fazem questão de tratar pessoalmente de seus contratos. Por isso o desgaste que ele sofre é maior. O fato é que ele perdeu a paciência e passou a cobrar José Dias publicamente. Chegou até a ameaçar não disputar a Copa dos Campeões, irritando a cartolagem.

“Com ídolo, você não discute, mas roupa suja se lava em casa”, diz um diretor. “O Rogério está desorientado. Há meios mais apropriados para conseguir o que ele quer. Não é simplesmente partir para a ruptura. O desgaste da imagem dele não é só em relação à diretoria, mas sim junto à opinião pública e à torcida”, diz outro membro da cúpula do clube, ressaltando que o goleiro renovou seu contrato no ano passado até 2004 e o São Paulo aceitou todas as suas exigências.

Como você já deve ter percebido, a imagem de Rogério está, sim, abalada junto à diretoria do São Paulo, mas daí a estender a coisa para a galera… Numa pesquisa recente no site de PLACAR, Rogério foi eleito disparado o craque mais popular do time, com 70% dos votos. França vem lá atrás com 14%. O site Futebolaovivo publicou em 18 de junho: “Rogério segue sem se entender com a diretoria.” No fórum aberto aos internautas, a maioria das mensagens defendia o goleiro: “Ele é são-paulino de verdade. Dá o aumento.” “Sem Rogério, o São Paulo não existe.” E por aí vai.

O episódio do reajuste foi a gota d”água, mas os dirigentes nunca gostaram de ouvir Rogério se meter em assuntos internos, como quando critica a demissão de um treinador. Foi assim quando saíram Levir Culpi e Vadão. “Falo mesmo, mas sempre em benefício do São Paulo.”

Rogério Ceni, goleiro do São Paulo, e Edílson, do Flamengo, durante jogo do Campeonato Brasileiro de Futebol, no Estádio do Morumbi -
Ceni e Edílson, do Flamengo, durante jogo do Campeonato Brasileiro –

Mercenário é a mãe!

Num clube tradicional como o São Paulo, atleta metendo o bedelho nesse tipo de assunto é tabu. Rogério dá de ombros. “O meu problema não é com o São Paulo, é com uma pessoa que está representando o clube (José Dias). O desgaste existe com essa pessoa e não com a instituição. Eu nunca vou ter desgaste com a torcida, por exemplo”, diz. “O torcedor precisa entender que eu vou fazer sempre o meu melhor, seja com mil reais de salário, seja com dez mil. O dinheiro não me fará jogar mais ou menos, não fará com que eu fuja de uma dividida.” Se existe coisa que Rogério não suporta é ser chamado de mercenário. E ele diz que a diretoria não é a única a tentar botar-lhe essa pecha: “A imprensa também joga o atleta contra o público.”

Rogério, 28 anos, tem 11 de São Paulo e mais de 350 partidas pela equipe. Conhece bem desde o garoto que serve refeições no CT até os ex-presidentes e conselheiros mais importantes. “Você cria amizade com a maioria, mas é impossível ser querido por todos. Às vezes, você quer falar, mas tem de saber controlar. Por outro lado, tem que ouvir algumas coisas que não quer. É difícil agüentar tanto tempo num mesmo clube”, afirma.

A trégua que Rogério estabeleceu com a diretoria dura até o fim da Copa dos Campeões. “Quando eu voltar, vamos ter uma última e definitiva conversa.” Os dirigentes também se mostram irredutíveis. “Ele tem suas convicções, mas existem as diretrizes do clube”, diz um deles.

O goleiro sempre disse que não jogaria em outro clube do Brasil fora o São Paulo, mas após isso tudo… “Gostaria até de encerrar a carreira aqui, mas as pessoas vão fazendo com que você desanime, mude de opinião. Talvez, pela situação criada, eu saia ou outros saiam…” Rogério até agora engoliu sapo, perdeu a batalha, mas não a guerra. Tem o torcedor (e vários conselheiros de oposição) a seu lado para conseguir o tal aumento. Além disso, conta com vários clubes, como o rival Corinthians, interessados em seu serviço. Antes, ele jamais pensaria nisso. Mas agora…

Alex – Por Alex ou dinheiro

Pela conta dos dirigentes, Alex vale só se o Parma liberá-lo por mais um semestre nas mesmas condições de pagamento do ano passado. Por isso, o Cruzeiro atravessou o negócio. O meia pode ir embora sem nunca ter virado um ídolo de fato

Por Paulo Vinícius Coelho

Alex, do Palmeiras, comemorando a vitória nos pênaltis, contra o São Caetano, Taça Libertadores, Parque Antártica -
Alex celebra vitória nos pênaltis, contra o São Caetano, na Taça Libertadores –

O dicionário do futebol brasileiro está repleto de frases feitas. Há quem não agüente mais ouvir termos como “emocional”, “objetivo” e “profissionalismo”. Alex sempre teve fama de ser um jogador diferenciado também pelo nível cultural. Por isso, raras vezes usa esse vocabulário. Mesmo assim, a ele se aplica mais um desses chavões do dicionário do futebol: “custo-benefício”.

Quando voltou ao Palmeiras, em janeiro de 2001, Alex custou 500 mil dólares (1,2 milhão de reais) pelo empréstimo de seis meses. Recebeu um salário na casa dos 120 mil reais por mês ” o mais alto do elenco do clube ” e uma missão: tornar o Palmeiras vencedor. Seis meses depois, Alex não tem seu nome gritado em coro pela torcida, nem para o bem, como um ídolo inquestionável, nem para o mal, como um jogador indesejável. Alex não comove. E é o ponto crucial do negócio agora. “Estamos negociando com o Parma. Se eles mantiverem as bases do empréstimo que fizemos no início do ano, Alex pode continuar. Senão, teremos de repensar”, afirma o diretor de futebol do Palmeiras, Américo Faria, sem se importar com a presença do presidente do Cruzeiro, Zezé Perrella na Itália, para fechar a contratação do jogador.

A rigor, Alex não foi mais nem menos do que havia sido em sua primeira passagem pelo Parque Antártica, entre 1997 e 2000. Decidiu jogos, fez gols de placa, deu passes inacreditáveis. Encantou. Só que com a mesma irregularidade de antes. A diferença é que, naquele tempo, quando Alex não brilhava, alguém tratava de resolver a situação. Zinho, Paulo Nunes, Evair, Oséas… Desta vez, foi sua a responsabilidade de resolver tudo.

Ele decide ou não?

“Nosso problema foi que quando o Alex estava bem, o Lopes não acompanhava. Quando o Lopes estava ligado, o Alex não estava”, diz o zagueiro Gilmar, de mala arrumada para jogar pelo Flamengo no segundo semestre. Com dois meias de nível técnico semelhante, Alex dividiu a criação, mas não a responsabilidade. E, na hora do aperto, lembrava-se mesmo era do nome de Alex. “Ele decidiu grande parte das partidas do primeiro semestre”, afirma Américo Faria. Só que o título não veio. “Quando o time cresce, meu desempenho melhora também. Mas é natural que meu futebol apareça menos num time desarrumado”, diz Alex.

Craque é o jogador que resolve os problemas mais graves de seu time, decide os jogos importantes e, por isso, é ídolo da torcida. Alex resolveu jogos, não campeonatos. “Fomos perder logo a primeira cobrança”, afirmou Marcos, depois da derrota nos pênaltis para o Boca Juniors. A torcida não crucificou seu jovem talento, mesmo após ele ter desperdiçado a sua terceira cobrança consecutiva (as outras duas foram nas quartas-de-final, contra o Cruzeiro). Muito menos o aplaudiu.

A favor de Alex pesa o fato de ele querer continuar no Palmeiras por longo tempo. A dispensa do Parma, assim que chegou à Itália, ano passado, e os meses sem receber salário no Flamengo deixaram o meia com o pé atrás. “Dou mais valor a coisas que antes não valorizava. Como a estrutura do clube onde estou.” A estrutura do Palmeiras é uma coisa que Alex nem ousa discutir. Por isso, prefere continuar.

Cruzeiro ou Parma?

Alex, do Palmeiras, comemorando gol contra o Cerro Porteño, Taça Libertadores, no Parque Antártica -
Alex diante do Cerro Porteño, pela Libertadores, no Parque Antártica –

O sonho de fazer história no Palmeiras, a identidade com a camisa do clube é um ponto a favor. Mas não serviu até agora para transformá-lo em um ídolo inquestionável. Na enquete que o site de PLACAR realizou para saber quem é o grande ídolo da torcida, Alex teve 17% das preferências. Ficou em segundo lugar. Marcos, o eleito, recebeu 71% dos votos. A pesquisa começou dias depois da eliminação da Libertadores. Mas mostra como o balanço do semestre não comove a torcida em relação à sua permanência.

Segunda-feira, o presidente do Cruzeiro, Zezé Perrella, viajou para Parma a fim de tentar acertar a contratação de Alex. O meia faria parte de um supertime que se formaria em Minas Gerais e que já conta também com a presença do colombiano Rincón. O Parma estuda ficar com o jogador no segundo semestre. Espera para isso uma regulamentação da liga italiana a respeito do número de estrangeiros que poderão ser utilizados no próximo Campeonato Italiano. Na última temporada, havia a possibilidade de contar com cinco não-comunitários (jogadores nascidos fora da Comunidade Econômica Européia) e escalar quatro deles. Mas no final da temporada a federação abriu as portas e acabou com a limitação. Se a regra continuar, Alex deve ser do Parma na segunda metade do ano.

Os advogados de Alex

Quer dizer que Alex não terá problemas de emprego no semestre, mas que seguirá em sua luta para se firmar como um ídolo histórico do futebol brasileiro. No Palmeiras, Alex tem bons advogados. Um deles é Américo Faria, que faz o meio-de-campo entre o técnico Celso Roth e o presidente Mustafá Contursi, maior advogado da política pés-no-chão, das contas em dia, do dinheiro guardado nos cofres do Palmeiras. Para desembolsar mais 120 mil reais por mês até o final do ano e prolongar o empréstimo em condições maiores é preciso convencer o presidente do clube. Entre os defensores de Alex no Palmeiras está também Celso Roth: “Ele é nossa referência em campo, nosso maior fator de desequilíbrio nas partidas”, afirma o treinador.

Ídolos como Marcelinho, Rogério e Alex, em outros tempos, já sofreram do mesmo veneno. Lá mesmo, no Palmeiras. Em 1968 o Palmeiras chegou à final da Taça Libertadores, mas terminou em 14º lugar no Campeonato Paulista e escapou por pouco do rebaixamento. A campanha pífia causou a liqüidação do elenco e jogadores históricos, como Tupãzinho, perderam lugar. Entre os sobreviventes, ficou Ademir da Guia, mas também chamuscado pela ameaça de terminar o ano na Segunda Divisão de São Paulo. Quem olha para trás sabe o risco que o Palmeiras correu de dispensá-lo num impulso de um dirigente. Por outro lado, os custos eram muito menores. “O Alex é um jogador decisivo, que não pode ser deixado de lado”, diz Ademir.

Diferente de Marcelinho e Rogério, Alex não arde no fogo das discussões com dirigentes, nem na nebulosa lógica das arquibancadas. Sofre mesmo na ponta do lápis, na matemática de quantos milhares de reais significam um título. Na conta do primeiro semestre, o Palmeiras saiu no prejuízo. Gastou perto de 700 mil reais de salário, mais 500 mil e não levantou nenhuma taça no semestre. Nessa fogueira, Alex arderá por um longo período. Pelo menos até que levante uma taça.

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