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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

Gol relâmpago na Copinha alçou Fred ao estrelato

Um dos grandes artilheiros de sua geração ganhou as primeiras manchetes ainda como revelação do América-MG na Copa São Paulo de 2003

“Se eu não marcasse aquele gol, talvez nem jogaria em nenhum clube profissional.” Foi assim que um dos maiores artilheiros da história do futebol brasileiro definiu o tento que lhe tornou famoso, ainda jovem. Janeiro é o mês da tradicional Copa São Paulo de Futebol Júnior, torneio mais que especial para o agora aposentado Fred Guedes, ídolo do Cruzeiro e do Fluminense, com duas Copas do Mundo disputadas pelo Brasil.

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Na edição de 2003 da Copinha, apesar dos maus resultados do América-MG, Fred ganhou todas as manchetes do país ao marcar pelo Coelho com apenas três segundos e dezessete milésimos de jogo. Foi o tempo que bastou entre o passe do companheiro e o chute do meio-campo, na única alegria do América na derrota por 5 a 1 para o Vila Nova, na primeira fase, em Indaiatuba.

Em entrevista à PLACAR de novembro de 2004, já como jogador do Cruzeiro, Fred, então com 21 anos, traçava metas para sua carreira, enquanto relembrava o gol que lhe tornou uma celebridade em BH. Na época, o atacante de topetinho e jeito debochado convivia com a fama de marrento. “Quem diz isso não me conhece pessoalmente. Apenas sei onde posso chegar. Tenho que crescer muito, mas o meu futebol sempre vai aparecer porque nasceu comigo. É um dom inato”, afirmou Fred na entrevista ao repórter Edson Cruz.

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Fred se aposentaria em 2022 pelo Fluminense, com incríveis 417 gols marcados na carreira, mais até do que seu ídolo Ronaldo Fenômeno. O blog #TBT PLACAR, que toda quinta-feira recupera um tesouro de nossos quase 55 anos de acervo, reproduz abaixo o texto de novembro de 2004 na íntegra.

Eu me amo

Ele coleciona gols e fãs com a mesma facilidade com que se promove e se auto-elogia. Esse é Fred, a nova pedra preciosa do Cruzeiro

Edson Cruz

Bastaram três segundos e dezessete milésimos de um jogo da primeira fase da Copa São Paulo de futebol júnior do ano passado para o atacante Fred decolar a sua carreira. Naquele dia, Fred fez um dos gols mais rápidos da história do futebol. “O time só jogou aqueles três segundos, mas foi o suficiente para que os cartolas vissem que eu tinha algum talento. Se eu não marcasse aquele gol, talvez nem jogaria em nenhum clube profissional”, diz o hoje atacante do Cruzeiro. Na época, Fred jogava nos juniores do América-MG e a partida terminou com uma ruidosa goleada do Vila Nova de Goiás (5 x 1) sobre o time mineiro.

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Depois do jogo, todos os repórteres que estavam presentes cercaram Fred e ignoraram os jogadores do Vila Nova. No mesmo dia, o gol foi exibido à exaustão nos principais telejornais do país e Fred virou celebridade instantânea. O gol em questão foi marcado do meio de campo. Depois do apito inicial, um companheiro rolou a bola para Fred, que acertou as redes do gol adversário. “Alguns disseram que seria o gol mais rápido da história do futebol. Outros contaram que seria o gol mais rápido da história do futebol brasileiro. Outros ainda falaram que não valia para ser indicado como recorde porque foi marcado numa competição de juniores e, por isso, a Fifa não reconheceria. Tenho essa dúvida até hoje.”

Como prova documental, Fred, 21 anos, editou uma fita com várias reportagens sobre a proeza. “Foi daí que ele começou com o hábito de colecionar jornais. Tudo que é publicado a respeito dele, ele recorta e coloca em pastas”, diz o irmão e procurador Rodrigo Guedes. As volumosas pastas são arquivadas e colocadas em lugar de destaque na sala de visitas do apartamento do atacante.

Eugenio Savio/PLACAR

A fama emergente também lhe rendeu ascensão e a posição de titular no time profissional do América-MG. No campeonato mineiro de 2003, Fred mostrou que tinha muito mais futebol do que sorte e se livrou do estigma de “craque de um gol só”. Foi o vice-artilheiro da competição, com dez gols ” três a menos do que Guilherme, que, na época, vestia a camisa do Atlético, e um a mais que Alex, então no Cruzeiro.

Contrato de celebridade

O bom desempenho também no Mineiro deste ano (foi novamente vice-artilheiro) chamou a atenção do Cruzeiro, que o contratou em definitivo. “Difícil foi fazer o acerto do contrato do Fred. O irmão dele, que era o procurador, sempre voltava atrás e refazia a proposta. Cheguei a temer que a torcida cruzeirense começasse a pensar que o Fred estava é menosprezando o nosso time”, afirma o presidente do Cruzeiro, Alvimar Perrella.

“O meu irmão, que era um procurador iniciante, conseguiu um contrato que muito profissional rodado no mercado não conseguiria (Fred começa ganhando uma vez e meia o salário dos tempos de América; no segundo ano a quantia é duplicada; no terceiro, triplicada e assim por diante)”, afirma Fred. No acerto final, um detalhe curioso: Fred não assinou um contrato de imagem com o Cruzeiro, acordo esse que representa hoje no Brasil a maior parte dos vencimentos de um atleta. “Com isso, se ele se destacar mais, as chances de ganhar algum dinheiro com publicidade será maior para nós”, afirma Rodrigo.

Nada mal para quem há dois anos tinha um futuro pra lá de obscuro. Apesar de sempre confiar no seu taco, Fred diz que jamais conseguiria a mesma projeção no América de Rio Preto-SP, onde jogou antes de se transferir para os juvenil do América Mineiro. Quem indicou Fred para o América foi o amigo e conterrâneo Bruno (os dois nasceram na mineira Teófilo Otoni), que já jogava pelo time de Belo Horizonte.

Sonhando (e falando) alto

Fred, pelo Cruzeiro, em 2004  – Eugenio Savio/PLACAR

Agora, com a camisa do Cruzeiro, foram 12 gols nos primeiros 16 jogos. Embalado pelo irmão, Fred já sonha com vôos mais altos. “Vou ficar no Cruzeiro até conseguir um grande título, vestir a camisa da Seleção Brasileira e depois vou para a Europa, mas tem que ser para um grande clube da Itália ou Espanha”, afirma, enumerando os planos, com convicção.

O excesso de confiança do artilheiro já fez um respeitado comentarista mineiro dizer, longe dos microfones, que Fred era “a máscara em pessoa”. “Quem diz isso não me conhece pessoalmente. Apenas sei onde posso chegar. Tenho que crescer muito, mas o meu futebol sempre vai aparecer porque nasceu comigo. É um dom inato.” O amigo Bruno tenta explicar a “fama” de Fred. “O que pega mais é a maneira como ele anda e não dentro de campo. O Fred parece “Mauricinho” e invocado. Mas isso é só impressão. Ele é um sujeito humilde. Eu garanto.”

O culto à auto-estima Fred diz ter adquirido quando teve que superar o pior momento de sua vida, a morte de sua mãe, quando tinha apenas oito anos. Gizelda foi vítima de uma doença fulminante (um câncer que a fez ficar internada em hospitais). “Houve um amadurecimento precoce depois da morte dela e passei a encarar a vida como um desafio e aprendi a superar limites com mais facilidades”, afirma Fred.

Se os gols continuarem a sair, Fred pretende colocar em prática outros dois planos: a compra de um apartamento em Belo Horizonte e o casamento com a noiva Amanda, a quem jurou amor eterno. “Ela é a dona da minha vida”, diz o artilheiro, ao falar da noiva, que tem pinta de modelo. Amanda, que também mora em Teófilo Otoni, foi apresentada pelo amigo Bruno (olha ele aí outra vez!) durante um churrasco.

Enquanto isso, ele se contenta em morar num apartamento alugado num bairro de classe média de Belo Horizonte. O artilheiro diz que pretende ainda dividir o dinheiro que vai começar a pingar cada vez mais com toda a família, diga-se dois irmãos (Rodrigo, o procurador, e Carina, uma estudante de enfermagem). Sem se esquecer de mandar algum dinheiro para o pai, o pedrista Juarez, que reside em Teófilo Otoni. “Meu pai trabalha numa atividade sazonal (negociante e extrator de pedras preciosas). Nunca se sabe quanto vai render no fim do mês. Na época da minha infância, vivi com conforto, mas houve épocas de vacas magras. Agora, se depender de mim, o dinheiro não vai sumir mais.”

Além do romance com Amanda, Fred gasta o tempo fora de campo curtindo o pagode de Dudu Nobre e do grupo Fundo de Quintal. É visto com freqüência nos shoppings. Não se esqueceu da turma do América e diz organizar churrascos com os vários amigos que colecionou sempre que há uma folga no calendário apertado.
Fred só mostra indecisão quando o assunto é a religião. Apesar de citar o nome de Deus para explicar o sucesso meteórico, ele diz que não tem uma religião definida. Já freqüentou missas na Igreja Católica e cultos evangélicos num intervalo de poucos dias. “O que importa é acreditar em Deus”, diz. Só mesmo uma força sobrenatural para explicar o sucesso meteórico do novo xodó cruzeirense.

 

Fred, jogador do Cruzeiro – Eugenio Savio/PLACAR

Triângulo das bermudas

Entenda a complicada trajetória de Fred até a chegada ao Cruzeiro

O primeiro enrosco: o América-MG, clube que revelou Fred, tem uma parceria com o Feyenoord. O time holandês investe por ano 500 mil dólares nas categorias de base. Ao final de cada ano, os holandeses recebem em troca um atleta sub-20. Fred foi a bola da vez em 2003, mas não aceitou ir para um período de testes. O segundo enrosco: em troca de 90% dos direitos de Fred, o Cruzeiro forneceu ao Feyenoord 90% dos direitos sobre o meia Gérson Magrão. O clube holandês ainda pagou 500 mil dólares de indenização ao América

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