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La Popular ícone blog La Popular Por Enrico Benevenutti Aqui contamos histórias do futebol sudaca, aquele que catimba y baila milongas com a bola no pé

A tensão no Atlético Nacional e o confronto entre torcida e diretoria

Organizada teve benefícios cortados, vive escalada de violência e último clássico foi adiado com 89 feridos; entenda o drama e o que é Barrismo Social

O Campeonato Colombiano Apertura conta com o modesto e jovem Águilas Doradas como líder do torneio, perseguido pelo tradicional Millonarios (com dois jogos a menos). Apesar da inesperada campanha do time de Rionegro, a competição caminha para uma nova rodada de clássicos e todos os olhares colombianos estarão voltados para as cidades de Cali e Medellín: no primeiro palco, América e Deportivo fazem o dérbi da cidade, enquanto Independiente Medellín e Atlético Nacional se enfrentam pelo Clásico Paisa. Fora das quatro linhas, a torcida do Nacional vive uma escalada de violência com a diretoria do próprio clube. No último clássico da equipe verdolaga, contra o América de Cali, houve confrontos com a polícia, 89 pessoas ficaram feridas e a bola não chegou a rolar no Atanasio Girardot. Neste sábado, 29, o blog La Popular viaja para a Colômbia para entender melhor a relação entre torcida, clube e governo, o que é Barrismo Social e, claro, ficar de olho nos clássicos da rodada.

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Há duas semanas as arquibancadas do estádio Atanasio Girardot se tornavam um campo de guerra. Antes da bola rolar para o clássico Atlético Nacional e América de Cali, válido pela 14ª rodada do Campeonato Colombiano, a torcida do Nacional realizou protestos que tinham a diretoria do clube como alvo. Uma escalada de tensão aconteceu e a polícia reprimiu as manifestações, gerando uma onda violência que terminou com 89 pessoas feridas. A bola não rolou e a partida terminou suspensa.

O evento se tornou apenas uma camada na complexa teia que cerca o futebol colombiano. Antes de entender os protestos e o confronto com a polícia, é preciso entender quem são Los del Sur e a relação política-social do futebol no país, que persegue um caminho do chamado Barrismo Social.

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Antropólogo e sociólogo argentino, Nico Cabrera define o barrismo como “um conceito desenvolvido multi autoralmente por acadêmicos, funcionários públicos e torcedores organizados na Colômbia para reconhecer as barras de futebol como movimentos sociais, políticos, culturais e econômicos”.

“Tanto na Colômbia como na Argentina ou no Brasil, as torcidas organizadas são grupos identificados pela mídia e parte da opinião pública como criminosos e violentos. Esse conceito de barrismo supõe a implementação de ações políticas que procuram estimular os fatores positivos desses grupos: como a produção de cultura, geração de emprego e o exercício da cidadania”.

A barra do Atlético Nacional, Los del Sur, representa o máximo barrismo. Criada durante os anos 90, a barra cresceu nas ruas de uma Medellín tomada de violência e frequentemente vinculada ao cartel de drogas comandado por Pablo Escobar. Durante essa época, Medellín recebeu o título de cidade mais violenta do mundo. O contexto influenciou diretamente na formação dos torcedores, que, aos poucos, foram abandonando o histórico de violência para se tornarem referência no “barras colombianas por la convivência”, um dos projetos que compõem o barrismo.

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“Não há soluções simples para problemas complexos, mas ainda assim a Colômbia conseguiu manter essa política com resultados positivos – em 2007, foi criado o coletivo barrista colombiano que juntou a maioria das principais barras do país assinando um compromisso de paz, tolerância e união que antigamente não existia no futebol”, exalta Nico.

A relevância permitiu que Los del Sur ganhassem certos benefícios e privilégios, como ingressos com desconto, mesa de diálogo com a própria diretoria do clube verdolaga e o monopólio da segurança dentro do estádio – bancada pela própria barra, sem polícia ou segurança privada -.

Na Colômbia, os clubes são Sociedades Anônimas (SAF, no Brasil) formadas no molde mais empresarial possível. Sem eleições, a diretoria do Nacional trocou os nomes máximos de poder: Maurício Navarro se tornou presidente e Benjamin Romero vice. A dupla cortou relações com a barra Los del Sur e coleciona medidas impopulares que resultaram em protestos e confrontos: demissão de técnico, aumento de ingressos, diálogos com organizadas são barrados e a segurança do estádio muda de controle.

O vice-presidente, Benjamin Romero, é torcedor declarado do Millonarios, equipe rival do Atlético Nacional, fato que causou ainda mais revolta nos torcedores.

Após a tragédia no estádio Atanasio Girardot, Juan Pablo Ramírez, secretário do governo de Medellín, se posicionou contra as decisões do clube: “Rechaçamos de maneira categórica a violência por parte dos torcedores. Mas é necessário estabelecer a responsabilidade dos dirigentes do clube nestes destroços, nas lesões dos policiais, nos jovens feridos e ensanguentados, tudo pela renúncia em escutar sua torcida”.

“O barrismo não fez a violência desaparecer, ainda há casos fora dos estádios. Estamos falando de um dos países mais violentos da região, e a violência no futebol é um problema estrutural e de longa data”, reforça Nico.

“É uma batida forte o que aconteceu com Los del Sur, mas o episódio não foi o primeiro e não será o último. A violência acontece, mas a Colômbia mostra uma fortaleza e convicção muito forte em relação à política. O estado colombiano tem uma tradição de negociação com grupos violentos internos muito forte”.

Javier Escobar
Atlético Nacional é líder do grupo H na Libertadores sob o comando de Autuori

O Campeonato Colombiano caminha para novos clássicos e naturalmente, depois do incidente em Medellín, a relação entre torcidas organizadas e clubes chama a atenção para novos episódios. Apesar do histórico, a expectativa é de que o clima fique mais ameno com o tempo – isso porque a rodada de clássicos coloca frente a frente equipes de mesma cidade.

“A possibilidade de confrontos nos clássicos existe, mas os riscos de confronto não estão tanto nos clássicos de mesma cidade, se não que clássicos interestaduais – encontros entre times de Medellín e times de Cali -“, destaca Nico Cabrera.

“Em geral, na Colômbia sempre houve uma rivalidade entre Medellín, Cali e Bogotá pelos poderes econômicos, políticos e de cartéis de droga. Todo esse contexto se reflete no futebol”, completa o jornalista colombiano Juan David Londoño.

Com isso e apesar do evento recente, o encontro entre Independiente de Medellín e Atlético Nacional deve acalmar os ânimos na cidade e mostrar que a política de barrismo tem efeitos positivos para além da confusão da 14ª rodada: “A expectativa é de bom comportamento e tranquilidade graças a intermediação da prefeitura, da barra e do clube, que conseguiram acordos para desacelerar os enfrentamentos que repercutiram nos meio de comunicação semanas atrás”, conclui Juan David.

O Clásico Paisa, entre Independiente Medellín e Atlético Nacional, acontece neste sábado, às 22h30, no Atanasio Girardot, mesmo estádio palco do confronto com a polícia anteriormente. Na cidade de Cali, América e Deportivo se enfrentam no domingo, às 20h20, no estádio Olímpico Pascual Guerrero.

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