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Entrando no Jogo ícone blog Entrando no Jogo Por Leandro Miranda Analisando o que realmente acontece dentro de campo. Porque futebol vai além do trivial

Como o City dominou o Real Madrid graças à nova ‘invenção’ de Guardiola

Zagueiro Stones jogou como meio-campista, teve muita liberdade e foi peça fundamental na batalha tática entre o espanhol e Carlo Ancelotti

Se tem uma constante no trabalho de Pep Guardiola, é a inovação. Desde o lendário Barcelona que montou no início da carreira, passando pelos experimentos no Bayern de Munique, até o ciclo atual no Manchester City, o técnico espanhol sempre está mudando, testando, evoluindo. Muitas vezes, e com razão, já foi criticado por “inventar” demais, sobretudo em jogos decisivos de Liga dos Campeões. Mas no empate por 1 a 1 com o Real Madrid, pelo jogo de ida das semifinais, a mais recente “invenção” deu muito certo: o posicionamento do zagueiro John Stones como meio-campista foi fundamental para a superioridade do time inglês na maior parte do jogo.

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Não é exatamente uma novidade, já que o City faz há alguns anos esse movimento de avançar um defensor para o meio-campo quando tem a bola – o lateral Cancelo, por exemplo. Mas Stones assumiu esse papel recentemente, e o fato de ter funcionado tão bem contra um time como o Real Madrid, que também gosta de ter a bola, trocar passes e ditar o ritmo do jogo, mostrou a efetividade dessa tática.

Na hora de marcar, Stones compunha a linha defensiva normalmente:

Stones como zagueiro em um 4-4-2 no momento defensivo
Stones como zagueiro em um 4-4-2 no momento defensivo

Com a bola, Stones avançava e virava volante ao lado de Rodri, deixando o City com três defensores, um quadrado no meio-campo (dois volantes e dois meias) e três atacantes:

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Quando o City tinha a bola, Stones avançava para jogar como meio-campista
Quando o City tinha a bola, Stones avançava para jogar como meio-campista

Mas qual a lógica desse movimento? Basicamente, são duas vantagens geradas. A primeira, defensiva, é a pressão para retomar a bola assim que o time perde a posse: com os jogadores mais agrupados, perto uns dos outros, é mais fácil fazer isso. A segunda, ofensiva, é simplesmente dar ao City um homem a mais no meio, para controlar a posse. Contra o Real Madrid, a vantagem numérica que o posicionamento de Stones gerou foi nítida: o tempo inteiro, foram quatro contra três no meio-campo.

Nessa jogada, os três meio-campistas do Real já estão ocupados com três do City: Modric marca Rodri, Valverde fica em Gündogan e, mais atrás, Kroos vigia De Bruyne. Stones recebe com total liberdade…

Stones

Modric é obrigado a deixar a marcação de Rodri para dar combate em Stones, que espera o companheiro ficar desmarcado e faz uma rápida tabela com ele…

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Stones

Para depois conduzir a bola até a entrada da área e ser parado apenas por um carrinho de Camavinga. O City ficou pedindo falta no lance.

Stones

Nesse outro exemplo, a mesma coisa acontece: Stones tem muita liberdade com a bola, com os três meio-campistas do Real já ocupados. Modric fica com a tarefa impossível de marcar dois jogadores ao mesmo tempo. O croata hesita entre avançar em Stones ou ficar para marcar Rodri…

Stones

Nessa hesitação, Stones tem tempo de encontrar um excelente passe para Bernardo Silva bem aberto na direita…

Stones

E Bernardo joga de primeira para a infiltração de De Bruyne, que aproveitou o espaço deixado pelo movimento de Haaland para sair na cara do gol. Ele só parou em grande defesa de Courtois, apesar de ter sido marcado impedimento no lance.

Stones

O gol de empate do City nasceu de uma recuperação de bola de Rodri aproveitando passe ruim de Camavinga, mas a jogada imediatamente anterior, em que o City de novo colocou a defesa do Real sob pressão, foi novamente gerada pela liberdade de Stones. O camisa 5 conduziu sem ser incomodado…

Stones

E depois de tocar para De Bruyne na direita, continuou a corrida e até invadiu a área, arrastando de novo a marcação de Modric.

Stones

O cruzamento não deu em nada, mas logo na sequência o City retomou a bola com Rodri – a famosa “pressão pós-perda”, reagindo para recuperar a posse imediatamente após perdê-la – e fez o gol, cortesia de um chute indefensável de De Bruyne.

Esse padrão se repetiu quase o tempo todo e deu grande superioridade ao City, principalmente no início do jogo. Até o golaço de Vinicius Júnior aos 36 minutos – em uma das raras vezes em que o Real conseguiu sair limpo desde trás, superando a marcação adiantada – a posse de bola dos ingleses era superior a 70% em pleno Santiago Bernabéu, com seis finalizações a zero. Como mostrado nos exemplos, apesar de ser zagueiro de origem, Stones usou muito bem a liberdade que teve: não se limitou a dar passes de lado, mas conduziu a bola com coragem, deu passes arriscados e até invadiu a área agressivamente algumas vezes.

Em nenhum momento Carlo Ancelotti procurou igualar numericamente o meio-campo, recuando um dos atacantes para marcar Stones, por exemplo. Mesmo assim, o Real Madrid – ao contrário dos duelos do ano passado, quando foi dominado pelo City praticamente os 180 minutos – teve um período de superioridade na partida, no início da segunda etapa. A melhora teve a ver com os fantásticos Kroos e Modric recuando cada vez mais para fazer a saída de bola e ajudar o time a sair da marcação pressão do City. Curiosamente, um desses lances foi bem parecido com o que Stones fez do outro lado o jogo todo.

Tanto Kroos quanto Modric estão bem recuados, alinhados com os zagueiros do Real Madrid, para ajudar o time a superar a primeira linha de pressão. A bola chega em Modric na esquerda…

Stones

Quando Bernardo Silva avança para pressionar Modric, o croata vê um espaço vazio deixado pela movimentação de Camavinga, que atraiu Rodri para o lado do campo, e faz um sinal com a mão para Kroos…

Stones

O alemão avança nas costas dos atacantes do City, recebe com liberdade e supera a pressão do Real. A jogada termina com uma finalização perigosa de Benzema na área.

Stones

Um defensor avançando para o meio-campo para receber livre, em vantagem numérica? É a mesma lógica usada por Guardiola com Stones. Claro, esse foi um lance isolado, nascido mais de uma interação natural e da liberdade dos jogadores do que de um movimento treinado e predeterminado. Ou seja, uma contraposição perfeita entre os estilos de Ancelotti e Guardiola, em um embate que promete mais duelos de altíssimo nível no jogo da volta.

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