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Red Bull Bragantino ganha asas e quer 1º título continental

Impulsionada pela empresa que a rebatizou, a equipe de Bragança Paulista retomou o protagonismo nacional e, de quebra, chegou à final da Sul-Americana

Nas arquibancadas do Nabi Abi Chedid, em Bragança Paulista (SP), camisas antigas com formas geométricas em preto, branco e cinza — o modelo “carijó” que marcou época na década de 90 — se misturam com as novas, em tons de vermelho e com grandes touros em destaque. Nos bares, o tradicional sanduíche de linguiça, patrimônio local, agora vem acompanhado de uma latinha de energético. Os torcedores, que puderam retornar ao estádio após longos meses de ausência por causa da pandemia de Covid-19, não têm do que reclamar. O Red Bull Bragantino recolocou a cidade, que fica a 80 quilômetros da capital, na elite do futebol brasileiro e, respaldado pelo projeto da empresa austríaca de bebidas, alça voos ainda maiores: no próximo dia 20, o clube disputará sua primeira final continental, a da Copa Sul-Americana, com o Athletico Paranaense, em Montevidéu, Uruguai.

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Ao longo da campanha, o time dirigido pelo jovem treinador Mauricio Barbieri, de 40 anos, encarou uma dura sequência com “cara de Libertadores”. Na primeira fase, superou Emelec (Equador), Tolima (Colômbia) e Talleres (Argentina). Em seguida, nos mata-matas, despachou Independiente del Valle (Equador), Rosario Central (Argentina) e Libertad (Paraguai), todos times com tradição no continente. O sonho de estrear na Liberta, portanto, está bem próximo, seja com o título da Sula, seja via Brasileirão — o time seguia no G4 faltando menos de dez rodadas para o final. “Os resultados estão acelerando os planos. A expectativa vai aumentando e nós, como gestores, temos de acompanhar esse processo”, admite Thiago Scuro, 40 anos, CEO do projeto desde o início da fusão, em 2019. “Nosso objetivo é fazer um Red Bull Bragantino forte, competitivo, com uma boa relação com a comunidade, formando uma equipe de sucesso para a marca no Brasil.”

Em 2020, o clube estava de volta à Série A após 22 anos de ausência. O investimento alto (200 milhões de reais) foi suficiente para sobreviver à pandemia e a um início de campeonato turbulento — conviveu a maior parte da temporada com o fantasma do rebaixamento, até terminar em décimo lugar. “Já esperávamos uma transição difícil. Passamos por um período sem resultados, o modelo foi criticado, mas mantivemos a estabilidade no ambiente e a confiança no plano”, diz Scuro, que tem contrato até o fim de 2023. Em 2021, com a pandemia ainda batendo à porta, o clube investiu um pouco menos, aproximadamente 115 milhões de reais, em reforços. O principal foi Praxedes, 19 anos, ex-Inter, comprado por 6 milhões de euros (cerca de 37,4 milhões de reais). O time conta também com cinco estrangeiros, incluindo o volante uruguaio Emiliano Martínez, 22 anos, ex-Nacional, e o argentino Tomás Cuello, 21, ex-Atlético Tucumán.

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O projeto de clube-empresa segue o modelo do de outros países em que a empresa atua, inclusive nas contestações. Por aqui, a maior crítica é a de ter “furado a fila”. A participação no país começou via Red Bull Brasil, em 2007. O time, fundado em Jarinu, estreou na quarta divisão paulista. Em 2019, chegou às quartas de final do Paulistão, o que valeu o título de campeão do interior. Após a conquista, veio a fusão: os destaques da equipe se “transferiram” para Bragança e o RB Brasil foi relegado a um papel secundário, uma espécie de equipe B, focada na formação de atletas. Na época, o Bragantino sofria para pagar as contas e manter-se na segunda divisão nacional, enquanto os dirigentes não escondiam a frustração pelo RBB não conseguir sair da Série D do Brasileirão.

A ideia de unir forças veio a calhar para ambos os lados e partiu do próprio Bragantino. O presidente, Marquinho Chedid, ligou para Thiago Scuro propondo o negócio. “Resolvemos tudo num almoço de duas horas. Eles fizeram duas ou três exigências, eu também, e fechamos um acordo”, lembra o cartola. Empresário e ex-deputado federal de 63 anos, Marquinho é filho de Nabi Abi Chedid (1932-2006), o controverso dirigente que chegou a ser vice-presidente da CBF e comandou o Massa Bruta em seus tempos de glória, na conquista do Paulistão de 1990 e do vice-campeonato do Brasileirão de 1991, com Vanderlei Luxemburgo e Carlos Alberto Parreira no comando. Uma das exigências feitas à Red Bull foi manter o estádio com o nome do pai. “Horas antes de partir, ele me fez um único pedido: não deixe o Bragantino morrer”, contou Marquinho, que virou presidente de honra e comanda compromissos institucionais, como a relação com federações, torcedores e imprensa, enquanto os gestores têm total autonomia para tocar o futebol.

Metamorfose bragantina
Metamorfose bragantina

O título da Sul-Americana, se vier, renderá 4 milhões de dólares e entrará para o hall de façanhas da Red Bull no esporte. A empresa austríaca sustenta, desde 2005, duas equipes na Fórmula 1: a RBR e a AlphaTauri (antiga Toro Rosso). A primeira já tem quatro títulos de construtores e outros quatro de pilotos — o holandês Max Verstappen está na briga pelo penta neste ano. No futebol, o Red Bull Salzburg, na Áustria, foi o primeiro case de sucesso. O time fundado em 1933 foi comprado em 2005 e logo se tornou uma potência, com quinze títulos nacionais, incluindo os sete últimos de forma consecutiva. A equipe de Nova York ainda não conseguiu conquistar a MLS, mas reforçou a presença da marca nos EUA, com nomes como Thierry Henry e Juninho Pernambucano no elenco. E o maior feito é mesmo o do RB Leipzig. Antes conhecido como SSV Markranstädt, começou a parceria em 2009, na quinta divisão da Alemanha. Alcançou a Bundesliga em 2016 e apenas quatro anos depois estava na semifinal da Liga dos Campeões (caiu diante do PSG de Neymar e Mbappé).

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No Brasil, o Bragabull segue o padrão estabelecido pelos executivos da marca: ter uma equipe ofensiva, focada na formação ou evolução de garotos, sempre tentando disputar títulos. “Nosso grande legado é mostrar que é possível ser vencedor com jovens jogadores e jogando para ganhar”, diz Scuro. Do Salzbug, saíram estrelas como Erling Haaland, hoje no Borussia Dortmund, e Sadio Mané, atualmente no Liverpool. Aqui, o time consagrou Claudinho, craque e artilheiro do Brasileirão 2020, um talento desperdiçado por Santos e Corinthians e que após o título olímpico pela seleção, em Tóquio, trocou Bragança pelo Zenit, de São Petersburgo, por 15 milhões de euros. A bola da vez é Artur, 23 anos, vice-artilheiro da Sul-Americana, com sete gols. Revelado pelo Palmeiras, ele se diz plenamente adaptado ao clube e, assim como Claudinho, recebeu oportunidades na seleção principal. “Quando me falaram sobre o projeto, abracei na hora. Tudo o que nos proporcionam em organização e estrutura é encantador.”

Da filial de Leipzig, o time trouxe o lateral Luan Cândido, 20 anos, um dos salários mais altos da casa (acima de 500 000 reais mensais). Os executivos garantem que o intercâmbio de informações é constante. “A parceria não se resume à compra e venda de atletas. Há uma troca em várias áreas, como medicina esportiva, fisiologia, metodologia de treino, marketing, comercial e gestão”, explica Scuro. As contas estão saneadas, os salários nunca atrasam (sem dúvida, um diferencial no país) e os investimentos seguem firmes. No mês passado, foi iniciada a construção de um novo CT, em uma área total de 157 000 metros quadrados em Atibaia (SP), com inauguração prevista para dezembro de 2023. O local terá oito campos, um miniestádio para os jogos da base e alojamento para todas as categorias, do sub-14 ao profissional. Formar os próprios atletas (e lucrar nas negociações) será a prioridade. O elenco atual tem média de idade de 24 anos, a mais baixa do Brasileirão, mas a imensa maioria dos atletas veio de outros clubes. O Bragantino também planeja completar as reformas no “Nabizão” e transformá-lo numa arena multiúso referência na região, aumentando a capacidade de 17 000 para 20 000 torcedores, o mínimo exigido pela Conmebol para jogos decisivos de campeonatos internacionais.

Os surpreendentes campeões paulistas em 1990: o jogador Nei, o presidente Nabi Abi Chedid e o técnico Vanderlei Luxemburgo
Os surpreendentes campeões paulistas em 1990: o jogador Nei, o presidente Nabi Abi Chedid e o técnico Vanderlei Luxemburgo

As mudanças na identidade visual vêm sendo feitas de forma gradual. Primeiro, entraram os touros na camisa. Depois, mudou o nome, daí o escudo. Finalmente, em 2021, o clube assumiu o vermelho com uma de suas cores principais (o uniforme titular tem camisa branca e calção colorado, mas em algumas partidas o time jogou inteiramente com a nova cor). “No início houve alguma reação negativa, mas fomos transparentes e explicamos que isso faz parte do projeto global que nos possibilitou chegar aonde estamos”, diz Scuro. Marquinho Chedid é ainda mais direto: “Torcedor gosta mesmo é de ver o time ganhar”. Um dos grandes ídolos do clube, o ex-volante Mauro Silva, hoje vice-presidente da federação paulista, endossa o projeto. “Ver o Bragantino numa grande decisão me traz lindas recordações. Fico feliz em ver a equipe que me projetou para o Brasil e o mundo chegar a uma final continental. Sem dúvida, Bragança só tem motivos para estar em festa.” O objetivo de se tornar o “quinto grande de São Paulo” ou ao menos ocupar de forma mais regular o espaço que um dia já foi de outras equipes do interior, como os campineiros Guarani e Ponte Preta, segue em marcha. “Queremos consolidar uma base de torcedores locais e angariar simpatizantes ou admiradores de todo o país”, sonha o CEO. Como diz o slogan da Red Bull, é hora de ganhar asas e levantar voo.

O CEO Thiago Scuro, com mandato até 2023: “Nosso legado é mostrar que é possível ser vencedor com jovens e jogando para ganhar”
O CEO Thiago Scuro, com mandato até 2023: “Nosso legado é mostrar que é possível ser vencedor com jovens e jogando para ganhar”

Matéria publicada na edição impressa 1481, de novembro de 2021

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