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‘Os atletas não se incomodarão com arquibancadas vazias’

O nipo-americano Roy Tomizawa, especialista na Olimpíada de Tóquio-1964, reconhece os riscos dos Jogos durante a pandemia – mas vê válvulas de escape

O pai de Roy Tomizawa, Thomas, foi um dos coordenadores da pioneira transmissão via satélite da Olimpíada de 1964, em Tóquio, feita pela americana NBC. Roy era recém nascido, e tem guardado as lembranças que o pai trouxe do Oriente. Começava, naquela relação familiar, de para o filho, o interesse pelo esporte e sobretudo pelas olimpíadas do consultor de empresas de 58 anos. Ele é autor do livro 1964 – The Greatest Year in The History of Japan, ainda sem tradução para o português, volume dedicado a medir a influência dos primeiros Jogos de Tóquio para a metrópole de hoje. Roy respondeu a VEJA por e-mail. 

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Os Jogos Olímpicos de 1964, em Tóquio, serviram de símbolo e atalho da reconstrução do Japão depois da Segunda Guerra. Como olharemos para a os Jogos de Tóquio de 2021? É difícil prever como as pessoas vão se lembrar dessa Olimpíada. Dependerá de quem você é e onde você está, dependerá das circunstâncias de cada um. Se o medo da pandemia no Japão for de algum modo controlado, e a população conseguir acompanhar com mais tranquilidade a Olimpíada e a Paralimpíada, então, é claro, haverá boas lembranças da emoção e conquistas dos melhores atletas do mundo. Novas estrelas vão surgir. Mas há um aspecto interessante dos Jogos durante a pandemia: ela pode servir de alerta para os organizadores de grandes eventos globais. Tóquio deixará ainda mais claro para o Comitê Olímpico Internacional e seus parceiros, dentro de todo o ecossistema olímpico, de que será sempre preciso mais rigor para que as cidades e os países mostrem os reais benefícios de sediar uma competição – e que o contribuinte não seja obrigado a pagar pelo que não quis. Haverá, imagino, esforços ainda maiores para evitar exagerados encargos financeiros. Pode significar também a construção de um conjunto mais claro de políticas de gestão de risco e planejamento.

Pesquisas de opinião pública mostram a maioria da população contra os Jogos, com medo da pandemia. Como conviver com um pedaço imenso da sociedade na contramão? Mas isso não é verdade em quase todas as olimpíadas? Os Jogos sempre foram realizados com cidadãos a favor e contra a organização dos eventos. É briga pública de décadas. No Rio de Janeiro foi assim. Dito isso, convém ressaltar uma característica peculiar de Tóquio em 2021. Há uma ameaça à saúde de todos os envolvidos, o risco de a Olimpíada se transformar em propagadora do vírus. Mas o resultado final dessa possibilidade só poderá ser inteiramente compreendida algum tempo depois dos Jogos.  Com o ritmo de vacinação mais acelerada, imagino ter diminuído o medo, mas ele ainda está aí. Ressalvo, contudo, que seria desse modo em qualquer cidade e nação anfitriãs. Nunca houve unanimidade.

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Não haverá publico nos estádios e arenas. Qual pode ser o efeito do ponto de vista do espetáculo, mas também do desempenho esportivo? Estádios e arenas vazias farão diferença para muitos atletas, mas não para todos. Mas convém lembrar: os atletas, como todos nós, convivem com a pandemia há mais de um ano e meio. Acompanham os torneios em outras partes do mundo – sem público ou com plateia reduzida, salvo exceções. Sabem, enfim, não ter controle sobre esse aspecto. E os esportistas de classe mundial são treinados a ignorar o que não podem controlar e se concentram no que realmente importa: competir.  Suponho que não se incomodarão com arquibancadas vazias. Estão construindo esse momento há anos. E a grande maioria das pessoas que os seguem estariam, naturalmente, mesmo sem a pandemia, diante da televisão. Enfim, depois de tanto tempo de pandemia, quase já não há surpresa ou preocupação com  os locais em silêncio, sem fãs.

O Japão pretendia de fazer da Olimpíada de Tóquio atalho para abertura ao mundo de um país talvez excessivamente fechado ao exterior. Era uma forma de gritar contra a xenofobia. A pandemia fechou as fronteiras para os turistas. E agora? A pandemia já matou 4 milhões de pessoas em todo o mundo. Me pergunto: haveria algum outro país com capacidade para acolher milhares de pessoas de mais de 200 nações. Poucos, talvez, conseguiriam manter o rigor sanitário do Japão. E certamente com angústia e muito debate. Assim é o cotidiano de Tóquio, agora. 

Capa do livro 1964
Capa do livro 1964 ./Divulgação
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