Atlético bate o Cruzeiro de novo e conquista o título inédito
Foi um triunfo incontestável: depois de vencer primeiro jogo, a equipe de Levir Culpi fez 2 a 0 na partida derradeira, calando a maioria cruzeirense no Mineirão
O triunfo atleticano é tão significativo que ameaça roubar da�s outras duas grandes conquistas do clube (Brasileirão e Libertadores) o status de memória mais marcante e emocionante da vida de seus torcedores
Depois de encarar algumas décadas difíceis, o torcedor do Atlético-MG tem se acostumado a conquistas extraordinárias. Na noite desta quarta-feira, no Estádio do Mineirão – o mesmo palco de seus último grande triunfo, o título da Copa Libertadores de 2013 -, a equipe alvinegra de Belo Horizonte levou pela primeira vez em sua história o troféu da Copa do Brasil. O que torna a conquista ainda mais inesquecível, porém, foi a forma como ela foi obtida – com duas vitórias incontestáveis sobre o Cruzeiro, seu arquirrival. No jogo de ida, no Estádio Independência, o Atlético já tinha obtido uma ótima vantagem, 2 a 0. Nesta quarta, diante de um Mineirão lotado pelos cruzeirenses, a equipe do técnico Levir Culpi venceu outra vez, agora por 1 a 0, gol de Diego Tardelli. Foi um título com gosto mais do que especial – até por ter provocado uma enorme decepção no maior inimigo, o atual campeão nacional.
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Com quase cem anos de história – os primeiros duelos aconteceram na década de 1920 -, o clássico mineiro jamais havia decidido um título nacional. De um lado, o Atlético buscava sua primeira taça da competição; do outro, o Cruzeiro ambicionava o fechamento épico de uma temporada inesquecível, com a conquista de três títulos. A equipe alvinegra queria impedir ainda a transformação do rival azul em maior campeão da história da Copa do Brasil, além de ofuscar a conquista do quarto título nacional cruzeirense, confirmado no domingo, no mesmo Mineirão. Com a conquista, a metade alvinegra de Belo Horizonte abafa a euforia da torcida celeste, que durou só três dias. O título também garante ao Atlético uma vaga na fase de grupos da Libertadores de 2015 – que também já tem, é claro, o Cruzeiro entre seus classificados, o que abre a possibilidade de mais um encontro espetacular no ano que vem.
Superstição – Desgastado pela partida decisiva de domingo – enquanto o Atlético vinha descansado, já que poupou os principais atletas no fim de semana -, o Cruzeiro veio a campo trocando o tradicionalíssimo azul pelo branco. Foi com essa camisa que o time massacrou o rival por 6 a 1 na última rodada do Brasileirão de 2011, resultado que evitou sua queda à segunda divisão. Os atleticanos, porém, não se assustaram com a memória daquele desastre: com uma marcação firme, uma ótima organização em campo e um jogo dinâmico e inteligente, o time de Levir Culpi foi melhor na primeira etapa, criando mais oportunidades de gol e impedindo o adversário de impor seu estilo de jogo. Foram ao menos quatro chances claras de abrir o placar, enquanto o Cruzeiro teve só uma, ligação direta do goleiro Fábio para o matador Ricardo Goulart. Os chutões da defesa ao ataque, aliás, irritaram o torcedor cruzeirense.
Como Marcelo Oliveira optou por escalar Nilton e Henrique como volantes, o Cruzeiro ficou sem sua melhor opção de distribuição de bola no meio, Lucas Silva, jovem que interessa ao Real Madrid. Enquanto isso, o Atlético sabia muito bem como se aproveitar da falta de alternativas de jogo do oponente – sempre pressionando e nunca abrindo mão do ataque, o time deixava claro que não se limitaria a administrar o resultado. Aos 30 minutos, o talismã do Atlético na competição, Luan, sentiu uma lesão e foi substituído por Maicosuel. Mas nem a perda de seu jogador mais eficaz na atualidade atrapalhou: o Atlético abriu o placar pouco antes do fim da etapa inicial, ampliando sua vantagem. Dátolo cruzou da direita e Diego Tardelli, o titular de seleção brasileira que curiosamente não tinha marcado na competição até agora, subiu sozinho para completar de cabeça, já nos acréscimos do primeir�o tempo.
Assim como já ocorrera com o próprio Atlético nas duas etapas anteriores, o Cruzeiro precisaria de quatro gols no segundo tempo para reverter o quadro dramático. Henrique, que desceu carregado ao vestiário, deu lugar a Willian Farias. Na prática, no entanto, pouco mudou: muito consciente e sólido, o Atlético controlava bem a partida, mesmo diante de um adversário que não entregava os pontos e seguia em busca de pelo menos um gol. Marcelo Oliveira colocou o time todo no ataque, trocando o lateral Ceará pelo meia-atacante Júlio Baptista. Willian também saiu, dando lugar a Dagoberto. Agora jogando num 4-3-3, o Cruzeiro martelava e não desistia, mas as chances eram escassas. A cerca de dez minutos do fim da partida, a torcida cruzeirense começou a deixar o Mineirão. A essa altura, a minoria atleticana no estádio (menos de 2.000 pessoas) já festejava o título e fazia mais barulho que os rivais.
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Na história – O triunfo atleticano na noite desta quarta é tão significativo que ameaça roubar da�s outras duas grandes conquistas do clube o status de memória mais marcante e emocionante da vida de seus torcedores. Em 1971, com uma equipe extremamente talentosa, o Atlético levantou a taça do primeiro Campeonato Brasileiro (sob essa denominação, inaugurada justamente naquele ano). Em 2013, com o time liderado por Ronaldinho Gaúcho, Jô e Victor, foi a vez de festejar o primeiro título atleticano n�a Libertadores, acabando com décadas de provocações dos cruzeirenses, campeões da América desde 1976. A Copa do Brasil pode até não ser tão importante quanto o Brasileirão e a Libertadores, mas as circunstâncias da conquista garantem à taça erguida no clássico desta quarta um espaço absolutamente nobre na galeria de títulos da agremiação alvinegra – e não só por ter sido vencida em cima do inimigo.
Antes mesmo de chegar à decisão contra seu arquirrival, o Atlético já tinha aproveitado para exorcizar alguns de seus velhos fantasmas. Nas três fases que antecederam a decisão, o Atlético derrotou três grandes clubes do futebol brasileiro – times que, somados também ao Cruzeiro, reúnem nada menos de doze títulos da Copa do Brasil. Primeiro foi o Palmeiras, duas vezes campeão, eliminado nas oitavas de final. Depois foi a vez do Corinthians, tri do torneio, despachado nas quartas. Em seguida veio o Flamengo, também tri, eliminado na semi, deixando o caminho aberto para o duelo derradeiro contra o tetra Cruzeiro. Para deixar a conquista ainda mais saborosa, o Atlético superou dois de seus maiores algozes no caminho até a decisão. O Corinthians e o Flamengo foram responsáveis por algumas das derrotas e eliminações mais dolorosas do Atlético em torneios nacionais. O troco, porém, foi bem dado.
Depois de passar com relativa tranquilidade pelo Palmeiras, a quem derrotou tanto na ida como na volta, o Atlético acabou ficando duas vezes na beira do precipício. Nos dois jogos de ida das fases seguintes, contra o Corinthians no Itaquerão e o Flamengo no Maracanã, a equipe caiu pelo mesmo placar, 2 a 0, resultado terrível nos mata-matas em que o gol fora de casa é um critério de desempate. Para aumentar ainda mais o drama, nas duas partidas de volta o Atlético saiu perdendo. Contra dois de seus adversários mais odiados, o Atlético agora tinha de virar para 4 a 1. E assim foi: com um elenco iluminado e um técnico que nunca jogou a toalha, o Atlético de Levir Culpi operou dois milagres antes de garantir um lugar na final. No primeiro duelo da decisão, foi a vez de o time alvinegro abrir os 2 a 0. O arquirrival, contudo, não mostrou a mesma força para virar o jogo. A festa era atleticana.