Há 20 anos, PLACAR apresentou a revelação Marta, que ganhava 200 reais
Aos 17 anos, a craque alagoana era conhecida como Maria Bonita na seleção brasileira, mas ainda fazia bicos no futsal
Marta, a rainha do futebol feminino, inicia nesta semana sua sexta Copa do Mundo, em busca da coroação final, o inédito título, aos 37 anos. Há duas décadas, a goleadora alagoana já era tratada como prodígio, mas vivia uma vida sem qualquer luxo e repleta de preconceitos, em Belo Horizonte. Em sua edição de agosto de 2003, PLACAR apresentou aos leitores a mulher que elevaria para sempre o nível da modalidade, a baixinha e arretada “Maria Bonita” da seleção brasileira.
Ao repórter Patrick Moraes, Marta revelou seus hábitos, como tocar violão e torcer pelo Corinthians, e contou como superou rejeição até mesmo na própria casa, em Dois Riachos, para seguir carreira no futebol. Ela voltava animada de um período de treinos na Granja Comary, onde pôde conhecer o ídolo Rivaldo.
O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas recupera um tesouro de nossos arquivos, reproduzir na íntegra a primeira aparição da maior jogadora de todos os tempos em nossas páginas.
Baixinha arretada
A alagoana Marta é a nova estrela da Seleção Brasileira Feminina
Patrick Moraes
A mitológica camisa 10 da Seleção Brasileira lhe cai larga. As mangas descem um pouco além do cotovelo e sobra pano na hora de pô-la dentro do short. Não tem ainda idade para dirigir, tampouco tem grandes luxos. Mora no alojamento do Santa Cruz, clube de Belo Horizonte ao qual está vinculada, não joga partidas oficiais pelo time há um ano e recebe apenas 200 reais mensais como ajuda de custo. Para manter a forma, treina duas vezes por semana no campo e outras duas com a equipe de futsal, pela qual ainda disputa alguns torneios. Por outro lado, recebeu menção no site da Copa do Mundo como uma promessa a ser conferida e foi a goleadora da Seleção Brasileira campeã no recente Pan-Americano, com seis gols ” incluindo dois na semifinal contra a Argentina. Aos 17 anos, a mirradinha Marta, 1,60 m de altura, já conhece bem as peculiaridades do futebol feminino. “Não é fácil ser jogadora, não”, diz.
Nunca foi. Primeiro, ela teve de driblar a proteção do irmão José. Caçula entre cinco filhos, Marta, desde os seis anos, se metia a jogar entre os garotos. Depois, enfrentou a resistência dos colegas marmanjos ” “eles ficavam revoltados de sentar no banco enquanto eu jogava” ” e dobrou o professor de educação física da escola.
“Eu jogava handebol como ele pedia, mas depois tinha que me deixar jogar bola com os garotos”, afirma. Marta estudou apenas até a 5ª série antes de sair de Dois Riachos, em Alagoas, e chegar ao Rio, com 14 anos, para ser testada e aprovada no Vasco. No ano seguinte, já era titular do time adulto. A chegada à Seleção também foi meteórica. Escolhida depois do Brasileiro Sub-19, jogou o Mundial da categoria, no ano passado, quando foi a artilheira e eleita a segunda melhor do torneio.
A preparação física e as finanças de Marta agradecem. Na equipe principal, ganha 30 reais por dia de concentração ” as três semanas de preparação para o Mundial na Granja Comary lhe deram 630 reais. Deram também a chance de conhecer os ídolos da Seleção masculina. “Tirei até foto com o Rivaldo”, diz. O jeito decidido lhe rendeu o apelido de “Maria Bonita”, dado pelo supervisor Paulo Dutra em alusão à mulher do cangaceiro Lampeão.
Corintiana, anima a equipe tocando Cássia Eller e Marisa Monte ao violão. “Agora, meu irmão se orgulha de mim, né?”