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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

Em 1973, Falcão começava a voar no Inter — e nas páginas de PLACAR

Aos 19 anos, revelação colorada já era tratado como craque pelo capitão Elias Figueroa; leia na íntegra

Paulo Roberto Falcão, o maior ídolo da história do Inter, pelo qual conquistou o Brasileirão em 1975, 1976 e 1979, foi uma figura constante nas páginas de PLACAR, tanto nos tempos de jogador, como, mais adiante, como colunista.

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É dele até hoje, e muito provavelmente será para sempre, um recorde e tanto: o de maior nota de um vencedor da Bola de Ouro, prêmio criado por PLACAR em 1970 e oferecido ao melhor jogador do Campeonato Brasileiro.

A marca foi estabelecida no ano do tricampeonato, o último título do Inter no Brasileirão, que veio de forma invicta, com 16 vitórias e sete empates. Falcão, o líder daquela equipe, e que já havia sido o Bola de Ouro da edição anterior, terminou com a exuberante média de 9.20.

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Falcão está na história de PLACAR e vice-versa. A relação começou a ser construída ainda nos tempos de revelação da base colorada. Numa das primeiras matérias, na edição de 28 de setembro de 1973, o repórter Divino Fonseca destacou as qualidades do garoto catarinense de 19 anos.

“Ele não é daqueles que surgem da noite para o dia. Para nós, ele não é uma surpresa, sempre comentávamos que Falcão ia fazer sucesso desde a primeira partida”, contou na ocasião o capitão da equipe, o chileno Elias Figueroa. Os elogios vinham de toda parte, mas Falcão garantia estar focado.

“Os elogios entram por aqui e em saem por aqui [apontando para os ouvidos]. Pelo que em já vi por aí, quem elogia hoje pode estar malhando amanhã. De qualquer maneira, não estou livre de ser chamado de mascarado, mesmo não sendo.”

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O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas-feiras recupera algum tesouro de nossos arquivos, reproduz abaixo a reportagem na na íntegra:

O VOO DO FALCÃO

Acontece que o técnico Dino acha que o garoto Falcão reúne as qualidades de Carbone e Tovar: tanto defende quanto ataca e lança com precisão. E a torcida, encantada com o seu jogo virtuoso, já pensa até em Falcão na Seleção

Divino Fonseca

Foi só o Internacional vender Carbone ao Botafogo no mês passado, para todos acharem que estava terminada a briga pela camisa 5. Dali para diante, dizia-se, ela seria apenas de Tovar, o rival dos últimos três anos, um jogador que mostrou qualidades para se manter no time mesmo quando Carbone voltou da Seleção.

A certeza durou exatamente duas partidas e meia. No segundo tempo do jogo com o Cruzeiro, dia 2 deste mês, no Beira-Rio, entrou em campo um rapazola magro, alto, louro, com tanto futebol que até agora não devolveu a camisa. Naquele dia se materializou uma nova certeza: no mínimo estava começando outra luta — e essa, aparentemente, mais dura para Tovar.

Em sua estreia, Falcão não conseguiu evitar a derrota (quando entrou, já estava1 a 0), mas o que mostrou em campo serviu de compensação para a torcida. E até agora. no meio da campanha de altos e baixos do Inter, seu futebol permanece o mesmo: requintado é eficiente.

Carbone + Tovar

Dino Sani mal consegue conter sua euforia ao explicar a ascensão do novo ídolo:

— Eu tinha o Carbone para a cobertura dos beques, coisa que ele faz como poucos. O Tovar sobe mais e lança muito bem. Acontece que o Falcão reúne as qualidades dos dois. Era só esperar a hora certa de lançá-lo. Agora aí está ele, jogando uma barbaridade e com tudo para se tornar um dos grandes jogadores do Brasil.

Entre, os colegas, o cartaz de Falcão é o mesmo. Alguns brincam, como Valdomiro:

— É catarinense, só podia dar coisa boa. Na parte que me toca, não tenho o que reclamar: lançamentos longos não têm faltado.

Djair chega a exagerar:

— O que falta para o Falcão? Ser chamado para a Seleção.

Claudiomiro lembra o tempo em que estudou com Falcão no Grupo Escolar La Salle, em Canoas:

— Ele era franzino, um pingo de gente, mas bom de bola. Com nove anos já mostrava que seria um craque.

Ídolo do ídolo

Figueroa explica por que acredita em Falcão:

— Ele não é daqueles que surgem da noite para o dia. Para nós, ele não é uma surpresa, sempre comentávamos que Falcão ia fazer sucesso desde a primeira partida.

E Paulo Roberto Falcão, 1,80 m, 71 kg, catarinense de Xanxerê, às vésperas de completar vinte anos (dia 10 de outubro), o que está achando de tudo isso? Reservado, caladão mesmo, porém demonstrando uma boa dose de autoconfiança, o rapaz desliga o toca-fitas do carro (comprado há dois meses) e dá o seu recado:

— Estou tranquilo. Eu já sabia mais ou menos que teria a minha chance, porque o Dino gosta de lançar jogadores novos. Está tudo “acontecendo naturalmente. O Dino não inventa; então, eu vou lá e jogo o meu jogo. Está dando tudo certo.

Não se pode dizer que tenha sido uma ascensão repentina. No torneio que a Seleção de amadores disputou em Cannes, no ano passado, Falcão foi eleito “O Jogador Mais Elegante” pelos jornalistas franceses. Pouco depois, na preliminar do jogo do combinado Grenal com a Seleção Brasileira, 100 000 pessoas se entusiasmaram com a naturalidade com que ele comandou os olímpicos na goleada sobre o Hamburger, da Alemanha. Nas Olimpíadas, porém, entrou pelo cano.

— Joguei o segundo tempo contra a Dinamarca, os 90 contra a Hungria, e sai machucado aos 25
minutos do jogo com o Irã. O fracasso do nosso me também me serviu como experiência.

Falcão passa a mão no cabelo encaracolado e recorda as experiências de sua infância ainda recente.

— Sabe, minha história é diferente da maioria. Pra começar, eu era um garoto muito quieto, e ao contrário de muitos outros, meu pai me incentivava a praticar esporte, ele me comprava uma bola por mês E eu apesar de ser o dono da bola, jogava no gol. Até que levei uma bolada no olho é resolvi jogar na linha.

Aos onze anos, Pedro — o irmão mais velho — levou-o à escolinha do Internacional, dirigida pelo Jofre Funchal.

— Plenamente aprovado, me disse o Jofre. Lembro como se fosse hoje. E nunca mais saí do Inter.

Foi subindo de categoria, jogand de volante ou de armador, sempre ganhando elogios dos técnicos. Mas o pai, Bento, via todos os jogos e não acreditava que um dia Falcão chegasse ao primeiro time.

— Eu entreva na área e dava o passe ao companheiro bem colocado. O velho não se conformava. “Você tem de fazer gols, menino, gol, ele me dizia. Sabe como é pai.

Quando Antoninho foi vê-lo nos juvenis, onde jogava de médio-volante, antecipou que o usaria como armador na Seleção Amadora. Certamente por achar, como muitos ainda boje, que Falcão deveria ficar mais livre, para espalhar sua categoria por todo o campo.

Para Falcão tanto faz, mas para Figueroa seria uma pena se ele saísse de onde está.

— O guri tem uma colocação sensacional. Quando o goleiro lança a bola com o pé, pode-se contar que é dele.

Com Dino, Falcão será sempre médio-volante.

— Além das qualidades que já citei, ele possui a de comandar um avanço sereno da defesa.

Só um defeito

De repente, a gente se dá conta de que, mesmo tendo jogado poucas partidas, Falcão só tem recebido elogios. Não haveria o perigo de ele se mascarar? Dino acha que não, argumentando que a máscara só aparece em jogadores emocionalmente desequilibrados. O garotão aponta um ouvido, depois o outro, é responde sem mudar a fisionomia:

— Os elogios entram por aqui e em saem por aqui. Pelo que em já vi por aí, quem elogia hoje pode estar malhando amanhã. De qualqquer maneira, não estou livre de ser chamado de mascarado, mesmo não sendo.

Falcão tem defeitos e está consciente deles. O principal: não sabe cabecear. Nos treinos. enquanto os outros batem bola, ele pratica a cabeçada.

— O Dino me alertou para isso e ele tem razão. Desde garoto eu cultivei um certo virtuosismo: tinha vergonha de passar uma bola quadrada. Quando ela vinha pelo alto, sempre matava no peito. Mas nos profissionais, com a responsabilidade do conjunto, a gente tem de simplificar. Agora, recebo e toco. O Figueroa conta que também era assim quando jogava de médio-volante, mas aprendeu. Eu estou tentando aprender.

Mas, no final das contas, Falcão está muito mais para craque do que para aprendiz. Pena que ele tenha entrado num momento em que o ataque do Internacional praticamente não existe. As contusões já atingiram Valdomiro. Jangada, João Ribeiro, Escurinho. Borjão. Claudiomiro e Volmir. Mas Falção acha que o simples retorno de seu ex-companheiro de escola vai melhorar as coisas.

— O Claudiomiro preocupa dois beques. no mínimo. Aí fica mais fácil para o nosso meio-campo. O Paulo César e o Djair vão ooder entrar mais. No Campeonato Gaúcho, os dois foram os goleadores do time assim.

Satisfeito com o apoio que recebeu de todos, Falcão agora só pensa na recuperação do time, na classificação, no título. Está integrado e procura evitar comentários sobre a bronca de Tovar, quando soube que estava barrado.

— Até continuo a comprar na loja dele. Na verdade, não gosto de julgar os outros. Só posso dizer que vou continuar tão tranquilo quanto agora, se sair do time. O importante é confiar em si mesmo.

 

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