Publicidade
Elas na Área ícone blog Elas na Área Notícias, entrevistas e reportagens especiais sobre o futebol feminino

Torcida feminina do Coxa exalta ‘sensação de liberdade’ em jogo histórico

A PLACAR, fundadora do coletivo Gurias do Couto narrou as emoções vividas na partida do Coritiba apenas com mulheres e crianças nas arquibancadas

“Torcida” é substantivo feminino, derivada da palavra “torcedoras”, que se refere ao ato ou o efeito de apoiar algo. Tão visceral no futebol, a palavra ganhou ainda mais sentido na tarde do último domingo, 15, no estádio Couto Pereira, quando o desdobramento de uma punição se transformou em um dia histórico. Apenas mulheres e crianças puderam ir ao estádio acompanhar a vitória do Coritiba por 1 a 0 sobre o Aruko, pela primeira rodada do Campeonato Paranaense

Publicidade

Assine #PLACAR digital no app por apenas R$ 9,90/mês. Não perca!

Foi uma sensação de segurança. Não que a gente não se sinta segura em jogos normais, mas era uma sensação de liberdade. Estávamos mais à vontade. Vi muito mais mães com seus filhos, vi outras amamentando seus nenéns,” conta a PLACAR a advogada Natália Oliveira, uma das fundadoras do Gurias do Couto, um coletivo de torcedoras do Coxa Branca. 

No ano passado, Coritiba e o Athletico Paranaense foram punidos com portões fechados pelo TJD-PR (Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná) por causa de uma confusão generalizada entre as torcidas no clássico, em fevereiro. No entanto, na última quarta-feira, três dias antes da estreia do estadual, o TJD-PR acolheu o pedido feito pelos clubes e reverteu a decisão em uma conversão disciplinar, liberando o acesso ao estádio apenas as mulheres e as crianças de até 12 anos. 

Publicidade

A mobilização para convocar os torcedores foi feita rapidamente. Com a ajuda da torcida, entre elas, das Gurias do Couto e da Império Alviverde, principal torcida organizada do clube, o Coritiba divulgou nas redes sociais vídeos de torcedoras chamando as mulheres e as crianças para comparecerem ao estádio. Não houve cobrança de ingresso. A entrada era 1kg de alimento não perecível. 

Ação inédita foi resposta a confusão no Atletiba do ano passado
Arquibancada feminina: ação foi resposta a confusão no Atletiba do ano passado –

“Quando eu e minhas amigas entramos no estádio fiquei arrepiada. Senti que a situação fez com que a gente gritasse e apoiasse ainda mais o time. Até percebi que mulher é mais corneta”, diz, rindo, a torcedora do Coxa Branca, que apontou ainda que mesmo de forma espontânea, percebeu que se sentiu mais ‘livre até no jeito de torcer’. 

Ao todo, 8.871 mulheres e crianças lotaram o segundo setor do Couto Pereira e cantaram incessantemente durante toda a partida e, principalmente, torceram com respeito, do que, à princípio, seria uma estreia sem torcida. 

Publicidade

Durante o jogo, recebemos muitas mensagem da galera que estava fora do estádio elogiando a gente. Tinha um pessoal tentando enxergar a partida, e eles falaram que parecia que toda hora ou o Coxa tinha feito um gol ou sofrido um gol porque a gente estava gritando muito. Torcemos do nosso jeito. Me senti mais livre até no jeito de torcer”, afirma Natália. 

As torcedoras se concentraram perto da bateria e apoiaram umas às outras – em um ambiente que, muitas vezes, costuma ser hostil a presença feminina. Mas ali elas estavam para torcer como sempre torceram e apoiar como sempre apoiaram seu time.

Natália conta que em termos de aparato (instrumentos da bateria, faixas, bandeiras) não havia diferença para qualquer outro jogo. O que mais a surpreendeu foi o cântico. “Sempre vi muitas mulheres fazendo parte da bateria da torcida organizada do Coritiba, sabia que elas iam mandar bem. A única diferença era que o som dos cânticos eram de vozes femininas. Em estádios de futebol, nós mulheres, não estamos acostumadas a nos ouvir. É até maluco pensar nisso”, afirma. 

Para ela, outro fator que chamou a atenção foi o perfil das torcedoras presentes no estádio. “Fica claro que é um público que quer ir ao estádio, mas que por alguma razão, ou por várias razões, elas não estão lá sempre. Seja por não ter companhia, seja por causa do marido ou do companheiro que não gostam que vá sozinha, seja por causa do ambiente violento. O clube estava lá cumprindo uma decisão da Justiça Desportiva, mas acabou sendo um baita experimento social”, completa. 

Em dia histórico, mães amamentam seus filhos na arquibancada do Couto Pereira
Em dia histórico, mães amamentam seus filhos na arquibancada do Couto Pereira

No final da partida, em entrevista coletiva, o treinador da equipe, António Oliveira, exaltou a participação da torcida. “Nunca tinha presenciado tal situação. É a imposição de um gênero, fiquei emocionado. Hoje, sem dúvida nenhuma, foi o estádio mais bonito do mundo. O apoio das mulheres foi fundamental para a vitória” declarou o português. 

Um ambiente de arquibancada mais democrático e saudável, com maior presença de mulheres, idosas e crianças, é uma realidade – e um direito- que, mesmo a passos lentos, vem se consolidando no futebol nacional e mundial no últimos anos. Até que para isso seja necessário um incentivo. 

O Gurias do Couto, por exemplo, foi criado em 2019 depois do episódio de assédio sexual dentro do Couto Pereira. O movimento foi encorpado e, hoje, a rede de sororidade conta com mais de 11.000 seguidores nas redes sociais e mais de 100 mulheres participando ativamente. 

No próximo sábado, 21, será a vez da torcida do Athletico-PR escrever seu capítulo nessa história. Assim como o jogo no Couto, a partida na Arena da Baixada, válida pela 3ª rodada do Campeonato Paranaense, estará liberada para mulheres e crianças de até 12 anos. 

Publicidade