Série D: os desafios de uma divisão quase esquecida
Sem dinheiro de televisão e com dificuldades de viagens mais longas, sobreviventes da série D buscam acesso à terceira divisão
Disputar a série D do Campeonato Brasileiro é o primeiro desafio de muitos clubes que querem chegar às divisões superiores, mas também é o desafio de equipes que já estiveram lá em cima, e desejam retornar ao topo. É o caso do América-RN, que disputou a primeira divisão em 2007, mas foi rebaixado à série D em 2016. Neste ano, o clube jogou com a pressão do retorno por sua tradição, mas sabendo da dificuldade que existe em uma quarta divisão nacional.
“São 68 times e seis jogos definem a vida de um clube. São 12 jogos para o acesso e é importante que o torcedor entenda que precisa abraçar o clube para colocar o América-RN na série C do Campeonato Brasileiro“, afirmou o treinador do time, Leandro Campos, em maio, antes do início do torneio. Ele foi fundamental na boa campanha no torneio, por sua experiência, segundo o executivo de marketing do clube, André Tavares. “Contratamos um treinador disciplinador, campeão da séria C com o nosso rival (ABC), que conhece o mercado e esse tipo de competição. A preparação foi planejada pela comissão de futebol e comissão técnica e nosso treinador foi fundamental nessa caminhada”.
Disputar a série D é mais caro ao clube. Com folha salarial média de 200.000 reais mensais (jogadores mais comissão técnica), o time foi montado pensando em 2018. “Futebol é caro em qualquer série. Mesmo na D, temos de montar um time de série C ou B para conseguir o acesso”, afirmou Tavares. A confiança é grande, justamente pela história do clube nos campeonatos nacionais. “Temos tradição de cair e levantar. A cobrança da torcida e o afastamento de receita são fatores que dificultam a administração do clube. Nosso presidente do conselho (José Vasconcelos da Rocha, desembargador do TRT-RN) assumiu a presidência e nunca deixou o clube na mão.”
Desde 1998, quando jogou a primeira divisão nacional, o clube potiguar foi rebaixado na série B de 1999, mas beneficiado pela Copa João Havelange, jogou o Módulo Amarelo, espécie de segunda divisão, em 2000. Jogou a segunda divisão de 2001 a 2004, quando foi rebaixado. Foi vice-campeão da série C em 2005 e voltou a jogar a segunda divisão em 2006, ficando em quarto lugar e garantindo o retorno à série A. Foi o último colocado na primeira divisão em 2007, e voltou a ser rebaixado. Lutou contra o rebaixamento na série B em 2008 e 2009, até que foi rebaixado em 2010, na última posição. Na série C de 2011, ficou em quarto lugar e voltou a conquistar o acesso. Disputou a série B em 2012 e 2013, mas voltou a cair em 2014. Na série C de 2015, pela primeira vez, não conseguiu o acesso direto (desde 1998), e acabou rebaixado em 2016.
Para o acesso, o América-RN enfrentará o Juazeirense, da Bahia. Com a melhor campanha do torneio, o clube deu sorte de fazer uma das viagens mais curtas desta fase, contra um clube do Nordeste. Mesmo assim, para não correr riscos, o clube iniciou a preparação para esses jogos decisivos cedo. “Saímos de Natal na quarta e jogamos no sábado. Série D é isso, campos não tão perfeitos, cidades distantes, enquanto recebemos todos na Arena das Dunas, de Copa do Mundo”, afirmou André Tavares.
Os problemas dos clubes menores
Com despesas de transporte, hospedagem e alimentação para jogos como visitante, além dos gastos com a arbitragem, sob responsabilidade da CBF, disputar a série D ficou mais fácil nos últimos anos. As desistências por falta de dinheiro diminuíram. Neste ano, a competição começou em maio, após os estaduais. Em 2016, foi no começo de junho, mas até 2015, começava no início de julho. Com alguns meses de buraco, vários clubes não conseguiam se planejar para a disputa.
Mesmo assim, a quarta divisão não é barata. Para José Alvaro Góes Filho, presidente do Operário de Ponta Grossa, o torneio custa muito. “Jogar a série D é muito mais caro que o Campeonato Paranaense. Tenho um gasto de 400.000 reais na série D, com alimentação, salário e hospedagem”. Luizinho Lopes, treinador do Globo, concorda. “Não recebemos dinheiro de TV e apesar da CBF pagar passagens e hospedagens, temos despesas com alimentação. Fizemos uma viagem de 15 horas a Parnaíba (Piauí) e tivemos de almoçar e jantar no caminho”.
O diretor de futebol do São José de Porto Alegre, João Lock, acredita que disputar um torneio nacional que dure o ano todo alivia as contas. “Temos elenco cheio, por isso é bom jogar o ano todo. Quando não temos competições, temos de emprestar. Por isso, a série D não é cara, porque dá resultado”. A folha do clube gaúcho diminui após a disputa do Campeonato Estadual. “Temos folha de 90.000 reais durante a série D. Os gastos totais giram em torno de 150.000 reais por mês. Na Gauchão, a folha é de 120.000 reais e nos obriga a emprestar atletas.”
A CBF paga o transporte e a hospedagem dos clubes que disputam o torneio, mas somente por dois dias. Como vai disputar as quartas de final no Maranhão, o Operário terá gasto maior. “O jogo é no domingo, por isso vamos na quinta, para melhor preparação, e voltamos só segunda. Dos quatro dias, terei de pagar dois”, afirmou o presidente do clube. O Globo, do Rio Grande do Norte, vive o mesmo problema, pela viagem a Minas Gerais.
O São José, que fará a viagem mais longa, para o Acre, já sabe que poderá gastar mais por isso. “Serão sete horas de viagem, chegaremos a Rio Branco à meia noite do sábado, com jogo as 19h do domingo. Pedimos para a CBF antecipar nossa viagem em um dia”, disse o diretor de futebol.
E mesmo com transmissão do Esporte Interativo os clubes não faturam. “Por causa da TV, marcaram nosso jogo de volta na segunda-feira à noite. Isso nos prejudica, porque temos menos torcida”, reclamou o presidente do Operário. “Nem Esporte Interativo nem CBF pagam direitos de transmissão”, reclamou José Alvaro Filho. Segundo o diretor de futebol do São José, essa decisão era conhecida. “Tudo foi combinado. Sabíamos que não íamos receber dinheiro da TV, não há do que reclamar”, disse Lock.
O sonho é o acesso
No geral, os maiores gastos dos clubes da série D são de logística. Sem dinheiro da TV e pouco patrocínio, o torneio nacional torna-se mais caro que os estaduais. As viagens para outros Estados geram despesas, mesmo com apoio da CBF. Mas o desejo dos clubes é o acesso.
O Operário confirmou que os maiores gastos são com hospedagem e alimentação. “Nosso sonho é Série A”, afirmou o presidente do clube. O São José se orgulha de seu trabalho de base e acredita que jogar divisões superiores ajudaria o clube. “O Campeonato Gaúcho é muito valorizado, chama a atenção de clubes da Europa e do centro do país. Hoje, 90% do nosso time é formado no clube e o objetivo é nos manter em competições nacionais. Vendemos atletas após a visibilidade, como o Keno, que hoje está no Palmeiras”, afirmou o diretor de futebol. O Globo, desde sua fundação, em 2012, tem um forte trabalho de base, fazendo contratações pontuais, com objetivo de, no futuro, ter condições de estar nas primeiras divisões nacionais..
Os uniformes
Diferente dos times da primeira divisão, as equipes da quarta não têm tanta visibilidade, o que dificulta a divulgação da marca. O Operário não recebe dinheiro do fornecedor de material esportivo e mas vende camisas. “Recebemos uma cota de uniformes no ano e temos uma loja do nosso patrocinador dentro do clube”, disse José Alvaro, lembrando que o lançamento de camisas todo ano ajuda na arrecadação.
O Globo já é um clube-emprea e produz o próprio uniforme. Já o conterrâneo América-RN, com mais estrutura, tem um esquema parecido com a maioria dos clubes de séries superiores. “Tudo é na base de royaltes. O clube recebe um repasse da venda dos uniformes para lojistas e e-comerce”, afirmou o executivo de marketing do clube. “Recebemos apenas para o futebol profissional, mas estamos em negociação para viabilizar os uniformes da base e dos esportes amadores”.
OS OITO PARTICIPANTES
Atlético-AC
Em sua quarta participação na série D, neste ano joga as quartas com a quarta melhor campanha. Não joga a série C dede 1995.
Maranhão
Clube 15 vezes campeão estadual, tenta ser o terceiro time do Estado nas divisões superiores (Sampaio Corrêa e Moto Club estão lá). Participou da série A do Brasileiro duas vezes: 1979 e 1980. Não joga a série C desde 2006.
Globo
Vice-campeão potiguar nesta temporada, tenta se classificar para a série C pela primeira vez. Já com a melhor campanha de sua curta história (fundado em 2012), busca seu primeiro acesso nacional. Classificou-se nas oitavas ajudado por um gol de goleiro.
Juazeirense
Tem a pior campanha dentre os oito clubes classificados às quartas. Está em sua terceira participação na série D e já faz a melhor campanha.
América-RN
Mais tradicional entre os oito que buscam acesso na série D. Tem a melhor campanha dos qualificados e busca o retorno à série C após um ano. É a primeira participação nessa divisão. Já jogou a série A, sendo a última em 2007.
URT
A URT de Patos de Minas tem poucas participações em campeonatos nacionais. Jogou a terceira divisão uma vez e disputa a quarta divisão pela segunda vez na história.
Operário
Campeão paranaense de 2015, já participou de todas as divisões nacionais, inclusive a primeira, em 1979. Esteve afastado do Brasileiro entre 1994 e 2009. Jogou a série D em 2010, 2011 e 2015.
São José
O São José de Porto Alegre joga a quarta divisão pela quarta vez e tenta o acesso pela primeira.
Quartas de final da série C
IDA
Sábado, 5 de agosto
15 horas – São José-RS x Atlético-AC
16 horas – Juazeirense-BA x América-RN
Domingo, 6 de agosto
16 horas – URT-MG x Globo-RN
16 horas- Maranhão x Operário-PR
VOLTA
Sexta-feira, 11 de agosto
21 horas – Globo-RN x URT-MG
Domingo, 13 de agosto
16 horas – América-RN x Juazeirense-BA
19 horas – Atlético-AC x São José-RS
Segunda-feira, 14 de agosto
21 horas – Operário-PR x Maranhão