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Goleiros: na Argentina, o fantasma de Fillol

Diego Maradona os menospreza: “E o que você quer, se é goleiro?” Em uma entrevista televisiva em 2000, recordou assim sua visita ao Vaticano em 1990. “Entrei no Vaticano e o teto estava cheio de ouro. E ainda por cima o papa (João Paulo II) era goleiro!” A posição de goleiro, ser goleiro – esse […]

Diego Maradona os menospreza: “E o que você quer, se é goleiro?” Em uma entrevista televisiva em 2000, recordou assim sua visita ao Vaticano em 1990. “Entrei no Vaticano e o teto estava cheio de ouro. E ainda por cima o papa (João Paulo II) era goleiro!” A posição de goleiro, ser goleiro – esse bode expiatório futebolístico – é (sem novidades: sempre foi assim) um castigo. É, de forma mais profunda, um tipo de discriminação: o goleiro é o pobre diabo que não sabe jogar bola. O menosprezo que Maradona sente por eles é o mesmo que sentimos todos na Argentina. Ou quase todos: menos os goleiros.

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Goleiro, de posição maldita a protagonista em campo

No entanto, a Argentina foi, se não uma escola, ao menos um celeiro de goleiros talentosos. A mitologia futebolística está cheia: desde Rogelio Domínguez a Amadeo Carrizo, desde Ubaldo Fillol a Hugo Gatti. Por outro lado, pode ser que desde o dia 22 de dezembro de 1990 essa tradição tenha se quebrado. Nesse dia, Fillol, que jogava no Vélez, defendeu um pênalti de Rubén da Silva no Estadio Monumental e assim arruinou um campeonato para o River, o clube onde ele próprio sobressaiu entre 1973 e 1983. Também nesse dia, se aposentou. Desde então, nunca mais outro goleiro argentino se converteu em ídolo, muito menos em lenda. Nem Sergio Goycochea, que levou a Argentina à final do Mundial da Itália em 1990 ao pegar quatro pênaltis. Nem mesmo hoje se considera Goycochea um supergoleiro (que, de fato, não foi): se considera que foi um superdefendedor de pênaltis.

Entrevistas: cinco grandes goleiros contam o que mudou na posição

A história se acabou em Fillol (“o único goleiro normal”, para Maradona). Nos anos 90 se instalaria uma diarquia estrangeira: José Luis Chilavert e Carlos Navarro Montoya eram os goleiros a ser imitados (se a burocrática Fifa tivesse permitido a Navarro Montoya, que se naturalizou argentino, mas já havia sido reserva em três jogos da Colômbia, jogar pela Argentina, a Argentina teria tido goleiro durante, no mínimo, dez anos). Era a sobriedade e a arrogância (e o talento) de Chilavert contra a desfaçatez e espetacularidade de Navarro Montoya. Os goleiros argentinos? Bem, obrigado. Oscar Córdoba viria a continuar essa hegemonia dos goleiros estrangeiros.

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Zetti, de ídolo a professor

O fantasma de Fillol, como o fantasma do pai de Hamlet, vinha nos atormentar: não havia goleiros para a seleção argentina. Fillol havia defendido nos Mundiais de 1974, 1978 e 1982, e Nery Pumpido, nos de 1986 e 1990 (e uma lesão abriu as portas a Goycochea, uma intervenção do divino destino). Depois, o conformismo, filho da escassez. Luis Islas defendeu na Copa de 1994; Carlos Roa na de 1998; Pablo Cavallero em 2002; Roberto Abbondanzieri em 2006; e Sergio Romero em 2010 e 2014. Romero, que é o goleiro com mais partidas jogadas na história da seleção argentina, não é um supergoleiro e está a milhares de quilômetros de o ser. Quem o treinou foi o próprio Fillol. É o que temos. Lamentavelmente, Fillol não quer mais agarrar. Diz que, aos 64 anos, não está mais para essas coisas.

Federico Bassahún é diretor de radação da revista Don Julio

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