Estaduais 2018: mercado morno e estrelas sem brilho
Maioria dos clubes está endividada e não consegue pagar altos salários. E os que ainda têm dinheiro não querem repetir erros de 2017
Enquanto na Europa o Barcelona gastou 120 milhões de euros (mais de 460 milhões de reais) por Philippe Coutinho e o Liverpool 80 milhões de euros (310 milhões de reais) por um zagueiro, o holandês Virgil van Dijk, no Brasil os clubes andam bem mais econômicos em reforçar seus elencos – e com soluções curiosas. Os Estaduais de 2018 começam nesta terça-feira com o mercado interno de transferência bem mais morno que em anos anteriores. Valores astronômicos? Só para as saídas, como as de Jô, o craque do campeão brasileiro Corinthians, que jogará no Japão, e Lucas Pratto, que trocou o São Paulo pelo River Plate, ambos por mais de 40 milhões de reais. Não se trata de austeridade dos dirigentes: na maioria dos casos, a economia é uma necessidade extrema e não opção.
Clubes como Santos e Corinthians assumiram suas frágeis situações financeiras e apesar de terem vendido estrelas ainda não conseguiram substitutos. O Fluminense, que por anos desfrutou do auxílio do patrocinador, abriu o jogo: precisa enxugar sua folha salarial urgentemente, o que significou constranger um ídolo como Diego Cavalieri, incluído em uma lista de dispensas. Até mesmo Palmeiras e Flamengo, os clubes mais ricos da atualidade, evitaram extravagâncias – nesse caso, para não repetir os erros do ano passado. A equipe paulista, inclusive, abriu mão do socorro quase ilimitado da patrocinadora Crefisa e apostou em contratações a custo zero, como a de Lucas Lima, que encerrou contrato com o Santos. Nesta segunda, anunciou uma contratação de certa forma badalada, a de Gustavo Scarpa, envolvido em confusão jurídica com o Fluminense.
Até o momento, as transações mais caras e estrondosas de 2018 envolvem jogadores veteranos: Fred, de 34 anos, que trocou o Atlético-MG pelo rival Cruzeiro, e Diego Souza, 32 anos, do Sport para o São Paulo. Cada um custou 10 milhões de reais, valores bem inferiores aos praticados nos últimos anos (tabela ao lado).
2017: a vitória da austeridade
Uma das explicações para a economia dos clubes do Brasil em 2018 está nas surpresas da última temporada, em que Palmeiras, Atlético-MG e Flamengo gastaram caminhões de dinheiro e deram vexames, e Corinthians e Grêmio, com contratações bem mais modestas, levantaram os troféus mais importantes, do Brasileiro e da Libertadores, respectivamente
Mesmo na elite do futebol europeu, a estratégia deu resultado: nas duas últimas temporadas: o Real Madrid, que antes abusava de contratações “galáticas”, apostou na manutenção do elenco e nomes pontuais de atletas jovens. Venceu duas vezes consecutivas a Liga dos Campeões e o Mundial de Clubes. Mesmo em má fase neste início de 2018, o técnico Zinedine Zidane diz não pensar em contratações.
Por aqui, o sucesso de treinadores jovens como Fábio Carille e Jair Ventura também certamente influenciou os cartolas. Não à toa, nomes mais caros como Vanderlei Luxemburgo, Luiz Felipe Scolari e Cuca estão desempregados. Diversos medalhões caíram em desgraça também em campo: Luis Fabiano, Lugano, Elias e Fred tiveram rendimento abaixo do esperado.
O mesmo ocorreu com Emerson Sheik, rebaixado com a Ponte Preta. No entanto, o Corinthians surpreendeu ao contratar o herói da Libertadores de 2012. Aos 39 anos, jogará apenas um semestre, como forma de homenagem, antes de se aposentar.
Ainda na categoria dos veteranos, Robinho, antes nome disputadíssimo no mercado, deixou o Atlético-MG e procura emprego. São Paulo e Santos parecem interessados, mas o altíssimo salário, e uma grave acusação na Itália, afugentam possíveis compradores.
Além de Robinho, há outros atletas que certamente estariam sendo especulados, caso os clubes não estivessem tão endividados, como Alexandre Pato, Oscar, Hulk, Ramires e Bernard. O argentino Carlitos Tevez, ídolo do Corinthians, chegou a conversar com clubes do país, mas sua pedida salarial assustou. Foi parar no time do coração, o Boca Juniors, apesar das dificuldades financeiras dos vizinhos argentinos.
Cruzeiro, o ‘mão aberta’
A maioria dos clubes brasileiros tem primeiro vendido para depois contratar. O São Paulo, por exemplo, trouxe Diego Souza (10 milhões de reais), o goleiro Jean (pouco mais de 9 milhões) e o zagueiro Anderson Martins (custo zero). Ou seja, usou apenas uma pequena parte do valor da venda de Pratto (40 milhões). O Corinthians fez o mesmo, aproveitando o valor pago por Jô e Guilherme Arana.
O Cruzeiro parece ir na contramão, mesmo acumulando dívidas milionárias. O time já fez sete contratações para 2018: o lateral-direito Edílson (ex-jogador do Grêmio), os laterais-esquerdos Egídio (Palmeiras) e Marcelo Hermes (emprestado pelo Benfica), o volante Bruno Silva (Botafogo), o meia Mancuello (Flamengo), David (Vitória) e Fred (Atlético).
O clube atrasou salários nos últimos meses e, segundo os atuais dirigentes, sua dívida total chegaria a 400 milhões de reais. No entanto, seu novo presidente, o economista Wagner Pires de Sá, diz ter traçado um plano para seguir contratando sem aumentar o calote. O time tem buscado investidores para ajudar nas compras e pediu empréstimos bancários para pagar os salários. O campeão da última Copa do Brasil acredita que a renda com bilheteria, sobretudo nos jogos da Libertadores, vendas de camisas e outras ações ajudarão o clube a ficar em situação confortável em até seis meses. Se tiver sucesso, é possível que em 2019 os clubes voltem a cometer “loucuras”. Por enquanto, o tempo é de vacas magras no mercado nacional.