Brigas, champanhe e áudio: a guerra entre Cuca e Felipe Melo
Atritos entre volante e treinador começaram bem antes de confusão no Mineirão e chegaram ao ápice com conversa vazada
Uma longa história de desentendimentos entre o técnico Cuca e o volante Felipe Melo, agravada por um incidente na semana passada, culminaram com o fim da passagem do jogador pelo Palmeiras. Nesta segunda-feira, o jogador escancarou a crise com o vazamento de um áudio. Se arrependeu, culpou o excesso de champanhe, mas já era tarde. No choque de duas personalidades fortes, pesou a vontade do treinador sobre a do jogador, que deve ser negociado.
Os atritos começaram bem antes da última sexta-feira, data do afastamento do jogador. Os dois trabalharam juntos no Grêmio, em 2004. Na época, Cuca dirigiu o clube por 46 dias, lidou com a ameaça de rebaixamento e um ambiente conturbado por desentendimentos com vários jogadores, entre eles Felipe Melo, à época com apenas 21 anos.
Cuca assumiu ao Palmeiras pela segunda vez em maio, já preocupado com Felipe Melo. O técnico considera o volante alguém com ascendência muito forte no ambiente do elenco e capaz de atrapalhar a voz de comando. Fora isso, o treinador analisou que o atleta não se encaixava na proposta de jogo pensada para a equipe e em sua opção por marcação individual e não por zona.
A convivência entre os dois no Palmeiras teve o primeiro atrito no fim de maio. Ao fim de um treino, Felipe Melo discutiu com o preparador físico Omar Feitosa por discordar da marcação do placar da atividade recreativa. O desentendimento começou no campo e continuou no vestiário, onde Cuca tentou acalmar os dois e achou excessivo o tom das reclamações.
O desentendimento acelerou as divergências. Felipe Melo esteve machucado por cerca de um mês e, como retornou na reserva, ficou descontente. Os dois voltaram a bater de frente na última quarta, após a eliminação do Palmeiras para o Cruzeiro no Mineirão, pela Copa do Brasil.
Substituído no segundo tempo, o jogador reclamou da atuação do time no vestiário. Cuca interveio e chamou para si o papel de dar broncas coletivas. O clima ruim foi acentuado pelo gesto do lateral-esquerdo Egídio ao fim do jogo. O ex-cruzeirense trocou de camisa com Thiago Neves e acabou questionado por alguns colegas.
O técnico palmeirense teve ano passado divergências parecidas com jogadores, principalmente Lucas Barrios e Robinho. Este último acabou negociado com o Cruzeiro.
Na sexta-feira, véspera do jogo com o Avaí, Cuca anunciou ao time o afastamento de Felipe Melo daquela partida. O diretor de futebol Alexandre Mattos e o presidente do clube, Maurício Galiotte, estiveram presentes no treino e tentaram convencer o técnico a rever a decisão, mas não conseguiram.
Antes desse episódio, a diretoria do Palmeiras havia se empenhado em amenizar a suspensão do volante de seis para três jogos na Libertadores. Os dirigentes marcaram reuniões na sede da Conmebol, levaram vídeos e fizeram lobby para conseguir reduzir a pena. Felipe Melo poderia voltar no próximo jogo contra o Barcelona do Equador, dia 9, porém já nem deve estar mais no clube até lá.
Áudio e desculpas
Nesta segunda-feira, o jogador foi dispensado do treino realizado na parte da tarde. À noite, um áudio no qual o jogador escancarada sua má relação com Cuca em conversa com um amigo vazou. “Aqui não tem jeito, aqui já era. Com esse cara eu não trabalho, entendeu? Esse cara é covarde, mau-caráter, mentiroso, falou uma coisa e fica ligando para imprensa para falar um monte de coisa. Quando eu falar eu vou rasgar ele no meio, mas, enfim, agora vamos ver. Confesso que tem vários clubes interessados. Vários. Corinthians, Inter, São Paulo, Grêmio, Atlético-MG, Flamengo. Todo mundo está interessado”, disse Felipe Melo, em um dos trechos do áudio.
Diante da repercussão, Felipe Melo decidiu esclarecer o ocorrido em entrevista à ESPN Brasil. Ele disse ter exagerado no álcool no aniversário da esposa, negou a si mesmo ao dizer que não tinha propostas e assumiu que houve um desentendimento com Cuca no Mineirão – no sábado, o treinador negou problema de relacionamento e disse que o afastamento se deu apenas por questões táticas e técnicas.
“Errei naquele dia, falei alguma coisa do Cuca, dois dias depois nós nos reunimos, tivemos uma conversa com o presidente, todo o grupo, treinador. Aquele dia pedi desculpas, nunca tinha passado por isso na minha carreira, é muito nova essa situação. Confesso que fiquei muito abalado com essa eliminação para o Cruzeiro, e realmente errei, assumi o erro perante ao grupo, à diretoria, e fui muito claro, olhando nos olhos do Cuca. Naquele exato momento ele me desculpou, apertou minha mão e disse que não trabalharia mais comigo, isso na frente dos jogadores”, contou, antes de assumir a autoria do áudio, mas negar que tenha propostas de clubes brasileiros.
“O áudio é meu. Não lembro com quem eu falei. Na verdade, ontem foi o dia do aniversário da minha esposa. Por mais que tenhamos esse problema, comemoramos o aniversário da minha esposa, tinha muita gente aqui em casa, eu queria esquecer um pouco dos problemas, é normal, você acaba trazendo problemas para casa também. Tomei algumas champanhes, não lembro para quem eu falei. Tive ofertas de dois clubes turcos, nenhum deles era o Galatasaray, e as duas foram prontamente recusados. No Brasil não tive oferta de nenhum clube.”
Nesta terça pela manhã, Felipe Melo estará de volta e, apesar de não estar mais nos planos de Cuca, vai trabalhar no mesmo horário dos demais companheiros. “Eu queria fazer uma história bonita aqui. Vou me apresentar, vou treinar, o grupo vai viajar, mas estou à disposição, sou empregado do Palmeiras, vou treinar e, se tiver alguma conversa, vou ouvir e ver o que acontece”.
A tendência é Felipe Melo deixar o Palmeiras para reforçar outro time brasileiro. O jogador já recusou sondagens de clubes da Turquia, país onde defendeu o Galatasaray. O volante fez 27 jogos pelo time alviverde, com dois gols marcados e nenhuma expulsão.
(Com Estadão Conteúdo)