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Não tem mais surpresa

No futebol globalizado, é raro encontrar um grande jogador que não tenha enfrentado um craque de outra seleção ao menos uma vez. O resultado: já não há mais o espanto dos nomes que saltam do nada para a glória

Copa: Confrontos de 2010 a 2014
Copa: Confrontos de 2010 a 2014 VEJA

Se a Fifa decidisse interromper a Copa do Mundo apenas por um dia para a realização de um amistoso entre Bayern de Munique e Manchester United no Maracanã, os dois clubes nem precisariam enviar delegações da Alemanha ou da Inglaterra. Cada um desses times tem catorze jogadores convocados em catorze seleções. Daria, enfim, para montar um onze completo e ainda pôr três jogadores no banco de reservas – o Manchester até técnico teria à disposição, já que o holandês Louis van Gaal é o atual treinador da seleção de seu país. A Premier League inglesa tem 114 jogadores de 28 países na Copa. Fica à frente da Série A italiana, com 81 convocados de 21 países. Bósnia, Costa do Marfim, Gana e Uruguai são as seleções mais globalizadas, com apenas um atleta atuando em casa (a contrapartida é a Rússia de Putin, com todos os 23 jogadores atrelados ao futebol russo). A seleção de Felipão tem apenas quatro jogadores no Brasileirão. Bem-vindo, portanto, ao Babel F.C., um espetacular torneio paralelo.

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Do ponto de vista da qualidade do futebol, qual o efeito de todos os onze titulares do Brasil contra o México terem jogado ao menos uma vez na Europa, de 2010 a 2014, contra um oponente de seleção forte, e no caso de Daniel Alves, do Barcelona, por exemplo, ter enfrentado dezoito vezes Cristiano Ronaldo, do Real Madrid? Uma resposta, um tanto óbvia mas fascinante: já não há mais sustos e ineditismos. Improvável é lermos uma descrição como a feita por Nelson Rodrigues em torno da estreia de Garrincha na Copa de 1958, contra a Rússia: “Na sua indignação impotente, o adversário olhava Garrincha, as pernas tortas de Garrincha e concluía: ‘Isso não existe!’. E eu, como os russos, já me inclino a acreditar que, de fato, no domingo Garrincha não existiu. Foi para o público internacional uma experiência inédita”.

Até a Copa de 1978, na Argentina, todos os jogadores brasileiros que foram convocados para os onze Mundiais até então disputados vestiam a camisa de clubes brasileiros. Os primeiros a quebrar esse tabu foram Falcão e Dirceu, os únicos “estrangeiros” no time de Telê Santana que disputou a edição de 1982, na Espanha. “Fui para a Roma em 1980 e, naquela época, os clubes não liberavam seus jogadores para as eliminatórias. Era o capitão do Telê, mas não podia jogar”, disse a VEJA Falcão, hoje técnico e comentarista de futebol.

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O espanto de descobertas de craques, desconhecidos, foi substituído pela qualidade. Diz Tostão, centroavante da seleção de 1970 (todos jogavam no Brasil) e craque da crônica esportiva: “A Copa hoje é uma repetição das grandes partidas que vemos na Europa. O torcedor deve estar se deliciando”. A frequência de encontros, com intensa troca de informações, faz quase todo mundo jogar do mesmo jeito: a maioria das seleções vai a campo com o hoje clássico esquema 4-2-3-1, ou seja, quatro defensores, dois volantes, três meias mais avançados e um único atacante fixo.

Antes da intensa migração, antes do domínio dos campeonatos europeus nas emissoras de televisão a cabo, antes de um torcedor mirim brasileiro muitas vezes preferir Messi a Neymar, descobria-se o que preparavam os inimigos de maneira quase romântica. “Na Copa de 70, tínhamos um observador que ia aos jogos e treinos dos adversários, mas ele não tinha instrumentos como os de hoje”, diz Tostão. “Na semifinal, entre Alemanha e Itália, o (Carlos Alberto) Parreira, que era preparador físico, foi ao jogo com uma câmera fotográfica. Fez fotos como um louco. Depois as levou à concentração e mostrou a sequência de lances.” Foi dessa forma que o Brasil descobriu, por exemplo, que o lateral-esquerdo italiano Rosato faria marcação individual sobre o ponta-direita Jairzinho. Munido dessa informação, Zagallo resolveu avançar Carlos Alberto Torres – decisão que colaborou para o quarto e antológico gol brasileiro, quando ainda havia surpresas.

Com reportagem de Renata Lucchesi

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