As bobagens dos teóricos da conspiração
O pênalti que Fred não sofreu ganhou companhia numerosa no 2º dia da Copa. Festival de erros desmente os que viram sinais de complô a favor do país-sede
![As bobagens dos teóricos da conspiração](https://placar.com.br/wp-content/uploads/2021/10/esporte-futebol-copa-brasil-croacia-20140612-30-original.jpeg)
“Louvar o talento dramático de Fred seria cinismo. Daí a embarcar em teses conspiratórias existe uma distância. Sejamos honestos, mas não ingênuos”
Bastou um dia para que o erro do juiz japonês no Itaquerão perdesse parte do impacto. Isso se deu por diluição. O pênalti que Fred não sofreu ganhou companhia numerosa ontem. Aos dois gols mexicanos legítimos que o bandeirinha anulou se somaram, na demolição da Espanha pela Holanda, uma dupla de equívocos que se poderia chamar de equânime: o pênalti que Diego Costa inventou e a falta não marcada sobre Casillas no terceiro gol holandês.
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As conclusões que podem ser tiradas desse festival de lambanças não incluem a absolvição de Yuichi Nishimura – embora possam incluir uma parcela de culpa para quem escala em missão tão difícil um árbitro do Japão, país de futebol ainda em desenvolvimento. Também não incluem necessariamente o veredicto de que o nível da arbitragem nunca foi tão baixo.
Uma conclusão parece segura: falaram bobagem os teóricos da conspiração que mundo afora – e também no Brasil – se assanharam com o erro de Nishimura, vendo ali o sinal de um complô a favor do país-sede. Segundo algumas análises, a Croácia, com seu futebol de sólida mediocridade, merecia derrotar o Brasil. Claramente intranquila, mas ainda com lampejos, a equipe de Neymar e Oscar se viu escalada de repente no papel de vencedora sem mérito. Estranho.
![Nem sempre a nosso favor: Contra a Suécia, em 78, o juiz apitou o fim com a bola a caminho do gol Nem sempre a nosso favor: Contra a Suécia, em 78, o juiz apitou o fim com a bola a caminho do gol](http://msalx.vejasp.abril.com.br/2014/08/10/0431/alx_zico-suecia-brasil-copa1978_original.jpeg)
Ou nem tão estranho, se pensarmos bem. Se as arbitragens são fracas, vale todo tipo de influência sobre os juízes. Costumam ser lembrados erros importantes que favoreceram o Brasil: o absurdo “pênalti” sobre Luizão em 2002, contra a Turquia, e o não marcado a favor da URSS em 1982 são dois deles. Raramente citam os deslizes que nos prejudicaram. Pelo menos um desses foi mais ridículo do que dez “pênaltis” sobre Fred: em 1978, contra a Suécia, Zico fez de cabeça um gol que não valeu porque o juiz tinha apitado o fim do jogo meio segundo antes, quando a bola do escanteio estava no ar!
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Faz tempo que tal olhar seletivo alimenta o burburinho de que as arbitragens nos favorecem em Copas. Nada como a determinação de deixar claro que não participa de um complô para predispor um soprador de apito a errar contra o Brasil, confere? Louvar o talento dramático de Fred seria cinismo: a máxima de que “roubado é mais gostoso” cai bem em papos de arquibancada, mas deixo para Nelson Rodrigues, gênio da crônica esportiva, a tarefa de fazer o elogio do “juiz ladrão”. Personagem de “feérica, irisada, multicolorida variedade”, o árbitro canalha seria francamente superior ao honesto, cuja virtude “pode ser muito bonita, mas exala um tédio homicida e, além disso, causa as úlceras imortais”.
Que a torcida argentina reverencie até hoje o gol que Maradona fez com a “mão de Deus” contra a Inglaterra em 1986 – eu acharia mais bonito ter vencido a Croácia por 2 a 1. Daí a embarcar em teses conspiratórias existe uma distância. Sejamos honestos, mas não ingênuos.
![O histórico não ajuda: Em 2002, Luizão mergulhou de fora da área. Pênalti O histórico não ajuda: Em 2002, Luizão mergulhou de fora da área. Pênalti](http://msalx.vejasp.abril.com.br/2014/08/10/0431/alx_luizao-brasil-turquia-copa2002_original.jpeg)
E a Espanha, hein? Para não me chamarem de engenheiro de obra feita, reproduzo o que publiquei em VEJA.com há cerca de um ano, após a Copa das Confederações: “A roda de bobo – ou bobinho – que a chamada ‘escola espanhola’ aperfeiçoou e elevou a uma bem-sucedida tática de jogo nos últimos anos esbarrou dramaticamente em sua limitação natural: o baixo poder de penetração de um estilo baseado na roda quando privado da genialidade ofensiva que cabe a Messi (a partir de agora com a ajuda de Neymar) conferir ao Barcelona”.
E ainda: “Primeiro, aproveitando-se da precariedade física do craque argentino, o Bayern de Munique humilhou o time catalão na semifinal da Liga dos Campeões da Europa, em maio; no último domingo, coube à seleção brasileira atropelar a espanhola – que nunca teve um jogador como Messi e, já ao vencer a Copa de 2010, tinha deixado clara a fragilidade ofensiva do futebol-bobinho”.
É verdade que a Copa ainda não terminou para os atuais campeões. Mas que ficou uma pedreira, ficou.
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