Há exatos 31 anos, Brasil conquistou o tetracampeonato mundial nos pênaltis contra a Itália; relembre a histórica edição "Toma que a taça é tua, Brasil"
Há exatos 31 anos, em 17 de agosto de 1994, a seleção brasileira conquistou o tetracampeonato da Copa do Mundo.
O Rose Bowl, em Los Angeles, com quase 100 000 torcedores presentes, foi o palco da final épica diante da Itália, vencida pelo Brasil nos pênaltis após empate em 0 a 0. A consagração de Romário, Taffarel, Dunga e companhia findou um jejum de 24 anos sem a taça.
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PLACAR acompanhou tudo de perto no calor americano. Na edição especial do tetra, o diretor de redação Juca Kfouri narrou a batalha de tricampeões: “É o leão contra o tigre, briga de bicho grande”.
Edição especial do tetracampeonato em 1994 – PLACAR
O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas-feiras recupera um tesouro de nosso acervo, sauda os tetracampeões, e reproduz na íntegra o texto da época:
Em um espetáculo de outro planeta, o astro Romário e seus cometas vencem as estrelas italianas e levam a Seleção Brasileira a dominar o futebol do Sécul XXX
Juca Kfouri
Quase cem mil terráqueos tiveram o privilégio incomparável de assistir, no domingo, nas arquibancadas do Rose Bowl, em Los Angeles, ao maior choque da história. Pouco menos de 24 horas antes, o planeta Júpiter havia sido espetacularmente abalroado por um cometa desgovernado, causando uma explosão milhares de vezes maiores que o de uma bomba atômica. Nada comparável, no entanto, ao impacto causado pelo astro Romário e seus cometas numa Itália compreensivelmente assustada.
A proporção do jogo era mesmo planetária. Estava em disputa o primeiro título de tetracampeão mundial e a hegemonia no Século XX. E a partida demoraria um século e um segundo. Já dizia o falecido técnico irlandês Bil Schankley que “o futebol evidentemente não é uma das coisas mais importantes das nossas vidas — é a mais importante.” E era exatamente disso que se tratava ali: a partida mais importante da vida dos dois países que mais amam o futebol no mundo. Só tinha que dar Brasil e seu futebol que os europeus insistem em considerar de uma outra galáxia.
A Itália entrou disposta a queimar todas as suas cartas. Baresi e Roberto Baggio, sem as melhores condições físicas, foram para o sacrifício que o jogo merecia, mas é o Brasil que vive o primeiro drama: Jorginho se machuca depois de sua melhor jogada e sai aos 20 minutos, dando lugar a Cafu (o plano de Parreira — confidenciado a PLACAR antes da Final — era de eventualmente usar Cafu para o lugar de Mazinho no segundo tempo). Até aí Mauro Silva fazia uma partida espetacular. Romário tivera uma chance cabeceando, Bebeto outra ainda mais clara e Massaro chutara para Taffarel defender cara a cara, nada comparável à furada de Mazinho no rebote de uma falta bem cobrada por Branco, quando Romário e Bebeto só esperavam para abrir o marcador.
Taffarel, do Brasil, defendendo pênalti de Massaro, da Itália, da Itália, na finalíssima da Copa do Mundo de 1994, no Estádio Rose Bowl – Alexandre Battibugli
Era um primeiro tempo quase solene, de muito respeito e com o Brasil melhor. O juiz húngaro Sandor Puhl só marcava faltas contra o Brasil e o paraguaio Venancio Zarate não assinalava os impedimentos do Brasil. O Mazinho do fim da Copa era o Zinho do começo e Arrigo Sacchi tira Mussi, põe Apolloni para marcar Romário e devolve Maldini à lateral esquerda, sua posição de origem. Roberto Baggio está preocupantemente sossegado e Baresi mostra porque é um dos maiores zagueiros do mundo, orientando e até levando a Itália à frente. Fosse uma luta de boxe e o Brasil teria ganho no primeiro tempo por pontos. Mas não era. Era o Jogo do Século.
Recomeça o duelo de titãs, disputado palmo a palmo do gramado, uma verdadeira guerra de posições, embora com cavalheirismo e quase sempre só entre as duas linhas intermediárias do campo. A iniciativa é toda brasileira, mas não como numa briga de gato e rato — como fora Brasil e Suécia. É o leão contra o tigre, briga de bicho grande, nenhum pode bobear. Aos 30, Pagliuca bobeia num chute de Mauro Silva, mas a danada da trave evita uma injustiça com o belo goleiro. Ah, como queríamos essa injustiça, Itália!
O jogo é lá e cá, mais lá do que cá, na verdade, e a prorrogação se aproxima, como se o Jogo do Século precisasse de todo tempo do mundo. Jamais, nas catorze Copas anteriores, nenhuma Final acabou 0 x 0. Tinha de ser essa.
93 minutos do Jogo do Século, sim 93. Bebeto desperdiça uma chance de diamante e Pagliuca e Apolloni salvam o rebote de Romário. Aos 96, Roberto Baggio obriga Taffarel a fazer uma defesa de ouro. Aos 99, é Págliuca quem salva o tiro cruzado de Zinho.
Viola, o predestinado corintiano, entra no lugar de Zinho para o segundo tempo da prorrogação. O Brasil ainda quer ganhar e põe em campo, além do mais, um jogador que também bate pênalti. Viola entra feito fera. Aos 109, Cafu deixa Romário na cara do gol e o gol não acontece. Aos 111, é Viola quem faz tudo, dá para Romário e Baresi — o melhor em campo ao lado de Mauro Silva — salva na hora H.
Aos 113, Roberto Baggio e Taffarel. Taffarel ganha. 116, Baresi corre atrás de Viola e cai numa cãimbra só… Sai de maca, heróico. O Jogo do Século termina com o segundo 0 x 0 da Copa dos Estados Unidos. Que ironia, mas que 0 x 0!
Iríamos aos pênaltis novamente contra um time de camisa azul, como a França, em 1986. Baresi na primeira cobrança, que injustiça!, bota a bola em órbita. E como nós queríamos essa injustiça, Itália! Lembra da de 1982? Agora é Márcio, por todos os santos, e Pagliuca. Dá Pagliuca. Que pena! Albertini, 1 x 0. Romário, que não bate pênalti, bate! 1 x 1. Evani, 2 x 1. Lá vem o Branco. Contra a França, em 1986, no México, ele fez. E fez de novo! 2 x 2. Massaro e Taffarel, TAFFAREL!!!!
Dunga, o capitão que vai erguer a taça. DUUUNGA! Roberto Baggio em órbita!!!!! Que outra injustiça maravilhosa! Só existe um tetracampeão na face da Terra! E como foi justo! O Brasil merecia.
Roberto Baggio e Taffarel no pênalti que decidiu o tetra no Estádio Rose Bowl – Alexandre Battibugli/PLACAR