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O Comentarista do Futuro ícone blog O Comentarista do Futuro Ele volta no tempo para dar aos torcedores (alerta de!) spoilers do que ainda vai acontecer

Rita e a canção que batizou um gol

Cronista chora morte da roqueira, vê homenagens com lance de Casagrande, mas vai a 1981: o 'Baila Comigo' de Mendonça, do Botafogo

Ao lerem esta resenha, muitos vão me gozar mandando um “Alô! Alô, Marciano”! Mas como ‘Um belo dia resolvi mudar e fazer tudo o que eu queria fazer’, vou abrir logo o jogo com vocês, queridos leitores e queridas leitoras de 1981: sou um Viajante do Tempo, vindo do Século 21, pois tenho uma engenhoca que me permite retroceder no tempo – somente para ver jogos de futebol memoráveis. Não vou revelar de que ano parti por um motivo simples e nobre, que já, já todos entenderão. Do futuro, posso dizer que não sei se estarei pirando ou se as coisas estarão piorando. Va ser difícil, por exemplo, viver sem nossos ídolos e deuses na música popular, pois alguns já terão cumprido o destino inexorável de todos nós – e daí a sensatez de não revelar o ano em que vivo, para que não façam contas… Assim como John Lennon, que partiu há quatro meses, não estarão mais entre nós muita gente que gostaríamos que vivesse pra sempre e continuasse a encantar as futuras gerações com suas vozes e canções. Raul Seixas, Bob Marley (Nota da Redação da Placar em 2023: o cantor jamaicano faleceria menos de um mês após a partida), Elis, Gal Costa, Belchior… E também Rita Lee, artista de maior sucesso hoje na MPB. Pois saibam que será justamente o adeus dela que me trará até este Botafogo 3 x 1 Flamengo, ontem, no Maraca, jogo que classificou o alvinegro carioca para a semifinal do Campeonato Brasileiro, eliminando o atual campeão. E muitas serão as homenagens à cantora relembrando sua relação com o futebol, uma paixão recíproca que se fortalecerá nas próximas décadas e que teve seu primeiro capítulo ontem, no golaço que fechou a tampa do meia botafoguense Mendonça, depois de entortar o lateral Júnior. A jogada ganhará da torcida do Fogão (e para a eternidade) um apelido que está na abertura da novela da Globo e nas rádios de todo o Brasil: ‘Baila Comigo’, da Rita.

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“Um dia eu viro semente”, diz um dos versos da canção. E quando este dia, pra Rita, chegar, só nos restará louvar e entoar ainda mais a sua genialidade. “É que eu sei que não adianta mesmo a gente chorar”, escreveu ela em outra música. Rita Lee é corintiana, muitos já sabem. E este amor pelo clube do Parque São Jorge ficará escancaradamente (é Rita!) notório e público a partir do ano que vem, quando, na final do Campeonato Paulista, um atacante, cujo nome manterei em segredo (Nota da Redação da Placar em 2023: o centroavante Casagrande), vai fazer o gol do título – sim, anotem, o Corinthians será o campeão paulista de 1982 – e o batizará como ‘Gol Rita Lee’. Isso porque, dias antes, ele e outros dois jogadores e colegas de clube (Nota da Redação da Placar em 2023: o meia Sócrates e o lateral-esquerdo Vladimir) assistirão a um show da Rita, no Planetário do Ibirapuera, e ganharão os holofotes ao subirem ao palco e cantarem com a artista. Quando isso acontecer, todos aqueles que hoje me leem e debocham da veracidade de tão futurista procedência, lembrarão de mim. Sem ressentimentos. “Eu sinto prazer de ser quem eu sou, de estar onde estou”.

É curioso que o passado e o que ainda vem por aí na música brasileira foi e sempre será pródigo em criar canções que homenageiam o futebol e seus ídolos. Tipo ‘Fio Maravilha’, do Jorge Benjor. Mas uma canção que batizou ou que algum dia batizará um gol… Acho que só essa. Mais um sinal do estrondoso sucesso de que Rita desfruta nesse momento, principalmente após o lançamento, ano passado, do álbum ‘Lança-Perfume’, que vendeu 130 mil cópias só no primeiro mês. E incluía ‘Baila Comigo’. Não por acaso também, Rita é e também sempre será não apenas compositora e intérprete mas também inspiração para outros artistas, citada em letras de Gil, Ivan Lins, Itamar Assumpção, Jorge Benjor… Algumas ainda por vir. É como disse Caetano há três anos, em ‘Sampa’: a “mais completa tradução” de São Paulo (SP).

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O gol de Mendonça também foi a mais completa tradução da partida: um baile do Botafogo sobre o Flamengo de Zico, Adílio e Cia. Ltda. Ele e a bola são “um caso sério”. Depois daquele zero a zero sem graça da primeira partida pelas quartas-de-final, os dois times deram um espetáculo, “como um cinema, cenas de amor e drama”. “Nada melhor do que não fazer nada” e ver bom futebol. O ‘Galinho’ abriu o placar logo aos 4’ de jogo, mas no finalzinho da primeira etapa o Botafogo, com o próprio Mendonça, de cabeça, chegou ao empate, que já lhe garantia a classificação. E o solo do meia alvinegro apenas começava. No segundo tempo, foi Mendonça quem ajeitou a pelota para Jérson estabelecer a virada e, depois, aos 44’, aumentando a emoção, sacramentou a vitória com o gol ‘Baila Comigo’ … É assim, Júnior! “Como se baila na tribo” … Baila Comigo! Um gol de dar “água na boca”!

Outro legado deste 1981, posso adiantar a vocês, será a chegada do ‘post-it’, uns quadradinhos coloridos e adesivos que em breve vocês estarão colando e espalhando pela casa e no trabalho, com lembretes. Pois anotem num deles: daqui a quatro meses vai estrear nos EUA um canal de TV inteiramente dedicado à música, a ‘MTV’ (Musical Television Video), que, quando chegar Brasil, terá em Rita uma de suas costumeiras estrelas nacionais em videoclipes inspirados. Assim como Mendonça, ontem para a torcida do Botafogo, Rita Lee faz qualquer um mais feliz, com vontade de “Viver pelado, pintado de verde / Num eterno domingo.” Um domingo de futebol.

Não posso encerrar antes de dizer: “Desculpe o auê, eu não queria magoar você’, querido leitor ou querida leitora de 1981, escrevendo sobre o futuro falecimento de uma pessoa tão amada em todo o país. Por ela, todos nós buscaríamos “os anéis de Saturno”! Resta-me retornar ao meu Tempo, num ainda distante ano do próximo século, quando, além da saudade de meus ídolos, já terei me cansado “De escutar opiniões de como ter um mundo melhor”. Pelo menos, posso garantir, ainda poderemos “Tomar banho de Sol/ Banho de Sol /Banho de Sol / Sol”. Obrigado eternamente, Rita!

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PARA VER O GOL ‘BAILA COMIGO’

PARA VER CASAGRANDE E SÓCRATES INVADINDO O PALCO DE RITA LEE

PARA OUVIR A CANÇÃO ‘BAILA COMIGO’

FICHA TÉCNICA

BOTAFOGO 3 x 1 FLAMENGO
Competição: Campeonato Brasileiro (Taça de Ouro) – Quartas-de-Final (2º jogo)
Data: 19 de abril de 1981
Estádio: Maracanã
Local: Rio de Janeiro (RJ)
Público: 135.487 presentes
Renda: Cr$ 26.741.550,00
Árbitro: José Roberto Wright

BOTAFOGO: Paulo Sérgio, Perivaldo, Gaúcho, Zé Eduardo e Gaúcho Lima; Rocha, Ademir Lobo e Mendonça; Ziza (Édson Carioca), Marcelo (Mirandinha) e Jérson. Técnico: Paulinho de Almeida

FLAMENGO: Raul, Carlos Alberto, Luís Pereira, Marinho e Júnior; Vítor, Andrade (Paulo César Carpegiani) e Zico; Tita,
Peu (Anselmo) e Adílio. Técnico: Dino Sani

Gols: Primeiro Tempo: Zico, aos 4’ (Flamengo); Mendonça, aos 44’; Segundo Tempo: Jérson, aos 40; e Mendonça, aos 43’ (Botafogo)

Cartões Amarelos: Zé Eduardo, Marcelo Oliveira e Jérson (BOT); Júnior e Vítor (FLA)

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