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O Comentarista do Futuro ícone blog O Comentarista do Futuro Ele volta no tempo para dar aos torcedores (alerta de!) spoilers do que ainda vai acontecer

Bate-volta — dia 6: A ‘zebra’ nº 1 de todas as copas

No Brasil de 1950, cronista vê ‘Milagre de Belo Horizonte’: vitória dos EUA sobre a Inglaterra, favorita em seu 1º Mundial; eles se enfrentam hoje de novo

Nunca haverá, repito, nunca haverá uma ‘zebra’ em Copas do Mundo maior do que essa de ontem, a vitória dos Estados Unidos (1 x 0) sobre os ingleses, os inventores do Futebol. E entendam por ‘zebra’, queridos leitores e queridas leitoras de 1950, um ‘resultado totalmente inesperado’, quando um time mais fraco ganha do mais forte, situação nada rara no futebol e que assim passaremos a chamar a partir da próxima década, por influência do ‘Jogo do Bicho’, em que o animal não aparece. “Bem feito!”, diziam os torcedores brasileiros presentes ontem no Estádio da Independência, em Belo Horizonte, reação natural à soberba com que a seleção da Inglaterra desembarcou por aqui para disputar seu primeiro Mundial. Quem poderia imaginar que o selecionado semiamador dos americanos – em que jogam um professor, um carteiro, um lavador de pratos e até motorista de carro funerário – alcançaria tal proeza. Para os ingleses, uma derrota tão traumática que camisas e meias azul-escuro do uniforme de ontem, adianto a todos, eles nunca mais vestirão. E posso garantir por ser um Viajante do Tempo, vindo de 2022. Desembarquei neste aprazível Rio de Janeiro de 1950 porque deixei o futuro durante mais uma Copa, a 22ª, no Catar (Oriente Médio), que será palco, daqui a 72 anos (pra mim ainda hoje, quando retornar), de novo confronto entre os dois países. Até 2022, os EUA ainda terão que amargar oito derrotas (incluindo um 10 x 0, tragédia anunciada para 1964) contra apenas uma vitória. Mas em Mundiais só terá havido uma outra partida, em 2010, empate de 1 x 1. Ou seja: em Copas do Mundo, o time inglês é freguês dos americanos. Toma!

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E não venha ninguém querer diminuir o feito alegando que cinco jogadores do time dos EUA nasceram em outros países: Bélgica, Croácia, Escócia, Polônia e Haiti. Nos Mundiais do Século 21, posso lhes adiantar, atletas de outras nacionalidades disputando jogos por Seleções de todo o mundo será corriqueiro, provando não ser utopia sonhar que algum dia seremos um planeta só. Em 2022, na já citada Copa do Qatar, 137 dos 691 jogadores inscritos defenderão países em que não nasceram. E somente quatro dos 32 países na disputa (sim, serão 32, a partir de 1998) não terão atletas naturalizados: Arábia Saudita, Argentina, Coreia do Sul e o nosso Brasil. Hoje mesmo, nesta Copa, o elenco americano é de fato exemplo (precoce) da tendência, pois são 8 os descendentes de europeus, sejam italianos, alemães ou portugueses. E daí? Era o escudo dos EUA no peito dos onze jogadores da conquista épica aqui em Minas. Os ingleses vinham tão favoritos que o jornal Daily Express publicou ontem que “seria justo que a partida já começasse 3 x 0 para os americanos.” É mole? Mas o pior ainda vem: no futuro saberemos que outro jornal de Londres, ao receber pelo telégrafo a informação sobre o placar do jogo, achou tratar-se de um erro do teletipista, não hesitando em cravar em suas páginas que o time da casa vencera os norte-americanos por 10 x 1. Santa prepotência!

De fato, o mundo todo esperava a vitória dos britânicos, que trouxeram na bagagem 23 vitórias em 31 jogos que realizaram após o fim da Guerra. A expectativa era tanta que a estreia da equipe na competição (2 x 0 sobre o Chile) teve a presença do escrete brasileiro, que foi conferir de perto o provável maior rival na disputa pelo título. Como acreditar que esta badalada formação sucumbiria diante de um time em que um dos jogadores, o centromédio Charlie Colombo, ganhou o apelido ‘Gloves’ (“luvas”, em inglês) porque usava um par delas para se lembrar que não podia colocar as mãos na bola? Por essa e outras, uma casa de apostas londrina pagava 500 para 1 a quem fizesse fé nos Estados Unidos. E até o técnico da seleção americana, Bill Jeffre, soltou esta antes da bola rolar: “Não temos chance” – pra em seguida comparar seus jogadores com “ovelhas prontas para serem abatidas”. Super motivador, né? Mas relevem: o cara é escocês.

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Quis o destino que o nome do jogo, grande responsável por conduzir os ingleses ao seu fim, fosse o motorista de ‘rabecão’ (carro funerário) e goleiro nas horas vagas Frank Borghi, que teve seu dia de ‘muralha intransponível’. Não faltaram personagens e heróis, num roteiro dramático e digno de cinema – tanto que, adianto a vocês, a trama vai mesmo virar filme, mas só daqui há 55 anos, em 2005, deixa pra lá… (‘Nota da Redação da Placar em 2022: ‘The Game of Their Lives’/‘O Jogo das suas Vidas’, depois rebatizado como ‘The Miracle Game’/‘O Jogo do Milagre’, baseado no livro de Geoffrey Douglas’).

Quis o destino que o nome do jogo, grande responsável por conduzir os ingleses ao seu fim, fosse o motorista de ‘rabecão’ (carro funerário) e goleiro nas horas vagas Frank Borghi, que teve seu dia de ‘muralha intransponível’. Não faltaram personagens e heróis, num roteiro dramático e digno de cinema – tanto que, adianto a vocês, a trama vai mesmo virar filme, mas só daqui há 55 anos, em 2005, deixa pra lá… (‘Nota da Redação da Placar em 2022: ‘The Game of Their Lives’/‘O Jogo das suas Vidas’, depois rebatizado como ‘The Miracle Game’/‘O Jogo do Milagre’, baseado no livro de Geoffrey Douglas’).

A pressão e o domínio também foram grandes ontem, dos ingleses, com o primeiro tempo terminando com 30 chutes ao gol ‘ianque’, contra apenas dois em direção contrária – mais ou menos como os navegadores britânicos, armados, atacando tribos indígenas da América do Norte, com seus arcos-e-flechas. Daqui a 72 anos, não será assim. Os EUA já terão evoluído no esporte, tanto que estarão se preparando para sediar um segundo Mundial, em 2026, o que farão em conjunto com Canadá e México (no primeiro, em 1994, serão os únicos anfitriões). O fantasma do jogo de ontem, claro, ainda será lembrado, mesmo o Amanhã nos reservando novas ‘zebras’ em Mundiais – como uma derrota da Itália para a Coreia do Norte (0 x 1, em 1966), uma da Argentina para Camarões (0 x 1, em 1990), da França para Senegal (0 x 1, em 2002), e novamente da Itália (1 x 2, em 2002) e também da Alemanha (0 x 2, em 2018) para a mesma Coreia do Sul. Deixei 2022 em meio a uma manada de ‘zebras’, com ‘repetecos’ ´de duas nações pródigas em serem vítimas do imponderável: derrota da Argentina (que então já terá dois títulos mundiais) para a Arábia Saudita (1 x 2); e da Alemanha (que já terá quatro!) para o Japão (mesmo placar). Na primeira rodada!

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Mas nada que supere o triunfo americano de ontem. Daí no futuro o jogo ser chamado de ‘O Milagre de Belo Horizonte’. Pena que a capital mineira não tenha guardado esta sua bênção especial para o nosso próprio escrete, que vai sentir muito a falta de algo miraculoso que o salve do vexame que passaremos em 2014, aqui mesmo, em Beagá. Mas esta história também vou deixar passar… Magias e místicas do Futebol.

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Ficha técnica
Inglaterra 0 x 1 Estados Unidos

Competição:
 Copa do Mundo de 1950, no Brasil (Primeira Fase)
Data: 29 de junho de 1950
Horário: 18h
Local: Estádio Independência, em Belo Horizonte (MG)
Público: 10.151 pagantes (13.000 presentes)
Árbitro: Generoso Dattilo (ITA)
Assistentes: Charles de la Salle (FRA) e Giovanni Galeati (ITA)

Estados Unidos: Frank Borghi; Harry Keough, Joe Maca, Walter Bahr e Ed McIlvenny (capitão); Charlie Colombo, Frank Wallace, Gino Pariani e Joe Gaetjens; John Souza e Ed Souza. Técnico: William Jeffrey (Escócia)

Inglaterra: Bert Williams; Alf Ramsey, Sr. John Aston, Billy Wright (capitão) e Laurie Hughes; Jimmy Dickinson, Wilf Mannion, Tom Finney e Jimmy Mullen; Stan Mortensen e Roy Bentley. Técnico: Walter Winterbottom

Gols: Joe Gaetjens, aos 38′ do primeiro tempo

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