Bate-volta — dia 5: A pior estreia do Brasil em Copas
Cronista vai à abertura da Copa de 1974 e vê Brasil 0 x 0 Iugoslávia, única vez, nos 21 Mundiais até aqui, que a Seleção não marcou gol em sua 1ª partida
“Jogo de estreia é sempre tenso!” Quantas vezes já ouvimos e ainda ouviremos esta frase numa mesa redonda de futebol no rádio ou na TV? É fácil não resistir à escorregadia tentação do clichê quando nos arvoramos a comentar ou falar de futebol. “Clássico é clássico!”, é outro muito usado. Ou: “Camisa pesa!”. Saibam vocês, queridos torcedores e queridas torcedoras de 1974, que o tempo trará novas “verdades absolutas” ao Século 21, como esta: “Não existe mais bobo no futebol!” “Nunca existiu!”, poderia bradar qualquer pessoa que, como eu, tivesse vindo de 2022 e assistido a esse enfadonho empate sem gols entre Brasil e Iugoslávia, ontem, na abertura da Copa da Alemanha. Acreditem ou não, terminando esta resenha, retornarei ao futuro a tempo de assistir à estreia da Seleção Brasileira no 22º Mundial, que será realizado no Catar – país virtuoso, mas que daqui a 48 anos ainda não será capaz, por convicções religiosas, de respeitar os homossexuais, entre outras senões. E, curiosa e coincidentemente, nosso adversário na primeira rodada daqui a quase meio século será uma das seis nações que, nos anos 90, vão florescer das rachaduras política do nosso adversário de ontem. Para aumentar o nervosismo, ‘de lei’ nessas largadas do escrete nacional em Copas, lembro a todos que as nossas duas derrotas em estreias até aqui foram: em 1934, 3 x 1 para Espanha; e em 1930, no 2 x 1 para… a Iugoslávia! ‘Mêda’ … Mas tenho motivos de sobra para voltar à 2022 muito otimista, pois nosso time terá mostrado muita qualidade na preparação para a disputa. Se bem que, a gente sabe como é: “Treino é treino; jogo é jogo!” Mil desculpas, não resisti… E escorreguei.
Assine #PLACAR digital no app por apenas R$ 9,90/mês. Não perca!
Uma boa notícia que trago a vocês é que este negócio de abrir Copas sempre com jogos do último campeão – novidade que o Brasil estreou aqui na Alemanha – vai gerar, com exceção desta ‘pelada’ de ontem, jogos de razoáveis pra bom. Bem piores serão os confrontos iniciais a partir de 2006, quando novo protocolo será adotado: jogo de abertura sempre com o país-sede. Imaginem… Vai ter Mundial em tudo que é canto! O último campeão a cumprir o formato atual será a França, que em sua estreia na Copa de 2002 vai levar de 1 x 0 do Senegal – e há quem diga que terá sido esse o motivo da mudança.
Voltando às escolhas da Fifa para palcos da Copa, a lista de equívocos começa daqui a quatro anos, vou logo avisando, quando a bola rolar em plena Argentina oprimida por uma Ditadura, fazendo com que, infelizmente, gols venham a ser comemorados a poucos metros dos salões de tortura no país. As polêmicas sobre os anfitriões da festa maior do Futebol só voltarão no próximo século, mas antes já terão se transformado em escândalos, quando vierem à tona esquemas de corrupção na cúpula da FIFA, aguardem… Essa ‘novela’ ainda demora a estrear.
Outra boa nova que trago do porvir é que o Brasil chegará a 2022 ainda com apenas essas duas derrotas em inícios nas Copas. Serão 16 vitórias e, mesmo nos 3 empates, a seleção nunca deixou e nem deixará de carimbar as redes. Foram seis gols em 1938 (6 x 5 Polônia), quatro em 1950 (4 x 0 México), cinco em 1954 (5 x 0 México) … Depois, e até 2022,
os placares não foram e nem serão tão “elásticos”, mas ficar ‘de lona’, ‘no zero-a-zero’, só ontem, nunca mais!
Imagino a decepção de vocês, queridos torcedores e queridas torcedoras de 1974, aí no Brasil. Afinal, fomos mal acostumados, com três conquistas nas últimas quatro Copas, somos “o País do Futebol!”, ora bolas! Qual nada… Ontem não teve tricampeão, Rivellino, Paulo César Caju ou Jairzinho que desse jeito. Paramos no ferrolho dos ‘Acimovics da vida’, para citar um dos nomes do elenco iugoslavo, quase todos terminados em ‘ic’. Botando um ‘r’ no meio vira aquela interjeição de ‘repulsa’ que vai desaparecer aos poucos, talvez por se confundir com a ‘onomatopeia’ do soluço. Profundo isso…
Sobre a escalação da Iugoslávia, gostaria de registrar duas curiosidades por ter revivido essa partida ‘in loco’, com atenção aos detalhes. No meio-campo da equipe figura o esforçado ‘Petkovik’, homônimo de um futuro meia-esquerda que brilhará no futebol brasileiro nos anos 90 e 2000, em especial pelo Flamengo e Fluminense. E de nacionalidade sérvia! (Natural da Sérvia, país que nascerá da Iugoslávia, lembram?) Vai se dar tão bem por aqui o malandro que, mesmo depois de abandonar os campos, seguirá entre nós, mostrando habilidade também como comentarista esportivo. Adianto a todos que o ‘Petkovic’ de ontem, de prenome Ilija, retornará à Alemanha em 2006, para um novo Mundial, desta vez no papel de treinador da seleção da Sérvia e Montenegro, outra nação fruto da dissolução da Iugoslávia. E encarnará o clássico personagem do ‘técnico teimoso’, recusando-se a atender aos apelos dos torcedores em seu país pela convocação do xará, craque, atuando em terras brasileiras. A segunda história tem a ver com a lateral-direita dos nossos oponentes, ocupada por Katalinski! Vejam vocês: precisei viajar ao passado para compreender de onde tirei o nome com que batizei, mais ou menos nesta época, na infância, um dos craques do meu time no Futebol de Botão. Um galalite bom de bola!
Me despeço confessando que voltarei ao Meu Tempo de dedos cruzados, iniciando o ritual de superstições para acompanhar a Seleção numa Copa, ainda mais na estreia. Se quiserem me ajudar nesta nova ‘corrente pra frente’, torçam e rezem para que, daqui a 48 anos, o Brasil não tome conhecimento da Croácia em sua estreia na Copa do Catar. E que abra logo dois gols à frente do adversário. Se bem que, lembrei agora, sei que é clichê também, mas… “Dois a zero é um placar perigoso!” Enfim, ‘o jogo é jogado’. Brasil!!!!!
Para assistir aos melhores momentos do jogo clique aqui.
Ficha técnica
Brasil 0 x 0 Iugoslávia
Competição: Copa do Mundo de 1974 (Alemanha), jogo de abertura
Data: 13 de junho de 1974
Local: Estádio Waldstadion, em Frankfurt (ALE)
Árbitro: Rudolph Scheurer (SUI)
Assistentes: Luis Pestarino (ARG) e Vital Loraux (BEL)
Público: 62.000 presentes
Brasil: Leão; Nelinho, Luís Pereira, Marinho Peres e Marinho Chagas; Piazza e Rivelino; Valdomiro, Jairzinho, Leivinha e Paulo César Caju. Técnico: Zagallo
Iugoslávia: Maric; Buljan, Katakinski, Bogicevic, Hadziabdic; Muzinic, Oblak, Acimovic; Petkovic, Surjak, Dzajic. Técnico: Milan Miljanic
Cartões Amarelos: Oblak e Acimovic (IUG)
QUER FALAR COM O COMENTARISTA DO FUTURO? QUER CONTAR ALGUMA HISTÓRIA OU SUAS LEMBRANÇAS DESTE JOGO?
Escreva para o colunista: [email protected]