Torcida tem o direito de se apegar à tradição, mas diretoria parece igualmente contaminada por essa ilusão
Dos 12 clubes mais tradicionais do futebol brasileiro, apenas quatro ainda podem se gabar de nunca terem sido rebaixados para a Série B do Campeonato Brasileiro: Cruzeiro, Flamengo, Santos e São Paulo. Até outro dia, entretanto, o Internacional figurava nessa lista, alerta de que a história não salva o mau desempenho.
A torcida do São Paulo tem todo o direito de evocar o peso da camisa tricampeã mundial para afirmar que “time grande não cai”. Mas essa provocação sadia aos rivais que já sentiram o gosto amargo da queda deve se limitar à arquibancada, apesar de o clube do Morumbi parecer se apegar a essa ilusão. Afinal, ainda não se deu conta do estrago que o trouxe ao Z-4 até o momento.
Sintoma dessa miopia foi a declaração do presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, de que o insucesso de Rogério Ceni como treinador não era responsabilidade da diretoria, que havia dado “todas as condições” para o ídolo tricolor trabalhar. Disse isso, sem ruborizar, depois de desfigurar o elenco com a temporada em andamento.
O desafio do técnico Dorival Júnior de manter o São Paulo na Série A é dobrar sua pontuação nas últimas 16 rodadas. Com 23 pontos em 22 rodadas, precisa mirar o número mágico de 46, que nunca rebaixou uma equipe desde que os pontos corridos foram disputados por 20 equipes, a partir de 2006 — exceção ao Fluminense, em 2013, salvo pelo escalação irregular de Héverton, da Portuguesa.
Para tanto, Hernanes e companhia terão que fazer um aproveitamento de 48%, bem acima dos atuais 34%. Contas alarmantes para um time que sofre 1,5 gol por partida, não encontra o goleiro ideal e vê seu principal defensor, Rodrigo Caio, atravessar má fase.
Em 2016, o Internacional tinha 24 pontos na 22ª rodada, não reagiu o suficiente e foi conhecer a segunda divisão. Perdeu o argumento de que “time grande não cai” na prosa com os gremistas. Time grande cai sim. E cai mais de uma vez, quando não aprende a lição. Foi assim com o próprio Grêmio, com Fluminense, Palmeiras, Vasco e Botafogo.
Alguns dizem ser uma oportunidade de reinvenção, como Corinthians e Atlético-MG, que ganharam a Libertadores anos depois da queda. Mas os erros do São Paulo já estão aí, escancarados. O rebaixamento seria apenas um carimbo. Essa reinvenção pode começar agora, sob a pressão de uma implacável contagem regressiva.