De memes à confusão com Mano: Yuri Alberto conta superação no Corinthians
À PLACAR, camisa 9 narra detalhes do novo momento após ser chamado de burro e virar motivo chacota até mesmo entre torcedores do Timão
Há exatos 127 dias o atacante Yuri Alberto se tornava assunto viral na internet. Logo após um clássico contra o Palmeiras, em 1º de julho deste ano, pela 13ª rodada do Brasileirão, repercutiam nas redes sociais uma chuva de memes por conta de uma queda brusca no chão, de cara no gramado do Allianz Parque, fruto de um tropeço nos cadarços de uma das chuteiras. O Timão perdeu por 2 a 0 e viu aumentar a enorme crise na temporada.
Na última segunda-feira, 4, contra o mesmo rival, ele deixou o campo da Neo Química Arena ovacionado pela atuação decisiva na vitória do Corintians por 2 a 0 no dérbi, confirmando a redenção vivida em 2024.
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Capa da edição de novembro de PLACAR, Yuri abriu as portas de sua casa, em São José dos Campos, para contar como superou este e outros memes, a desconfiança de torcedores e o polêmico episódio em que foi chamado de burro pelo então técnico corintiano Mano Menezes. Durante a conversa de quase uma hora, citou por diversas vezes as palavras “humilhação” e “resiliência”.
“Este ano passei por momentos de muita humilhação. Hoje me sinto feliz e leve de poder comentar sobre esse episódio, tudo isso me incomodava muito. Durante os jogos os torcedores repetiam o ‘burro’ que ele falou. No aquecimento eu fazia um gol e a torcida comemorava como se fosse no jogo, aquilo para mim era uma chacota, me deixava muito desconfortável. Tive resiliência para passar por isso”, contou.
Autor de 25 gols em 2024, a melhor marca pessoal da carreira, o jogador empatou com Jô com o terceiro maior artilheiro do clube no século contabilizando uma única temporada. Ele só fica atrás das marcas de Deivid, autor de 30 bolas na rede em 2002, e do argentino Carlos Tévez, com 31 gols em 2005.
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Confira alguns dos principais trechos:
O episódio com o Mano foi muito marcante pela exposição. Foi um divisor de águas? É a primeira vez que vou falar sobre e estou muito feliz de poder ser de forma leve porque após o episódio isso me incomodava muito. Acho que até durante os jogos, quando alguns torcedores começavam a repetir o que ele tinha me falado aquele dia, ainda me tocava muito. Me incomodava demais. Eu tenho e tive essa resiliência de conseguir passar por mais essa. Foi um momento difícil, a gente não estava tão bem. Após aquilo, eu falei: ‘cara, não é possível que eu escutei isso’. Durante o jogo, ele falou para o Wesley para falar para mim. Só que eu escutei, e o Wesley não queria repetir. Pensei: ‘não, não é possível que ele falou isso, cara’. Eu muito estressado, muito nervoso, só comecei a orar para Deus me dar sabedoria. Do jeito que eu estava ali mesmo, com a cabeça a milhão, sabe? Parece que o jogo meio que ficou de lado, estava no meu mundo dentro do campo. Só orando, só orando e intercedendo para que eu tivesse sabedoria para passar por aquilo. E na hora que eu saí de campo, ele veio falar comigo: ‘não, não foi isso que você entendeu’. Eu disse: ‘entendi muito bem, só peço que o senhor me respeite e nunca mais fale assim comigo’. Daí ele: ‘não, não foi bem assim’. Até dentro do clube tiveram outras pessoas que me perguntaram o que eu achei aquilo. Eu falei: ‘pô, cara, acho que no momento do jogo, ele nervoso também e tal acabou acontecendo aquilo’. Sei que pode ter interpretado muito mal, ter falado num momento errado, alguma coisa assim. Não sei o que aconteceu, sabe? Mas é um cara que está desculpado, eu não guardo mágoa de ninguém.
Na leitura labial feita pelo Gustavo Machado, você diz: ‘não precisa me chamar de burro para o estádio todo ouvir’. Não, não.. (risos).. não falei isso, não. Só falei assim: ‘você nunca mais fala assim comigo, cara. Só peço que o mesmo respeito que eu tenho por você, você tenha por mim’. Sabe, aquilo no pé do ouvido ali? A partir daí o pessoal já começa a criar várias coisas.
O que aconteceu foi semelhante a casos como o envolvendo Tchê-Tchê e Diniz, por exemplo. Qual o limite para isso? Foi uma parada que, quando ele falou aquilo pra mim, e ali no São Bernardo é tudo muito próximo, a torcida inteira de São Bernardo escutou. Depois, a cada hora que eu tocava na bola, a torcida inteira começava a gritar: ‘burro, burro…’, sabe? E foi subindo, por isso comecei a orar. E, graças a Deus, pude ter a sabedoria para passar por aquilo.
Hoje trabalhar a cabeça para um jogador é tão importante quanto os pés? Para jogar no futebol brasileiro, acho que antes de querer se preparar fisicamente,antes de querer fazer alguma coisa técnica, a primeira coisa é ter muito controle emocional sobre si mesmo, sabe? Porque é pesado, é difícil… E eu sempre tive muita dificuldade de me abrir para o meu pai, sabe? Ele sempre tentou ser aberto para que eu pudesse me abrir com ele, mas nunca tive essa facilidade. Eu tenho esse defeito, aliás, não consigo me abrir com ele. Com a minha mãe, às vezes, mas aí a gente até acaba evitando porque se não passo uma preocupação maior ainda para eles. Voltando de um jogo, ele foi me buscar no aeroporto e falou: ‘Yuri, o que está acontecendo?’ Disse: ‘pô, pai, se eu soubesse, eu te falava, mas está difícil.’ E aí eu comecei a chorar. E ele tentando entender. Conheço o meu pai, ele tem o jeitão ansioso dele, quem conhece sabe. Muitas vezes eu evitava falar alguma coisa para ele porque acabava me pressionando um pouco. Quer ajudar, não é por maldade dele. Graças a Deus tive incentivo de não me fechar tanto e procurar ajuda, de uma psicóloga que tem me ajudado bastante. Eu passo uma ou duas vezes por semana, me ajuda muito, a gente está descobrindo algumas coisas. Estou me reconhecendo, sabe? E me conhecendo. Tem me ajudado bastante na convivência com minha filha, com meus pais, com meus companheiros de clube. É uma coisa que quero seguir para o resto da vida. Se eu puder falar algo para alguém é: não espera chegar um momento difícil para procurar ajuda. Acabei demorando um pouco, mas só tenho 23 anos, então é bacana e tem me ajudado bastante.
Você citou o termo ‘humilhação’. Em que momento se sentiu mais para baixo? O António [Oliveira] foi um cara muito importante para mim. Tinha uma amizade muito boa com ele do Santos, quando foi auxiliar do Jesualdo [Ferreira] e, consequentemente, tocava o sub-23 ali. Depois daquele episódio com o Mano, estava muito para baixo. O pessoal do clube falava que não aguentava mais me ver assim. O Mancha, que é o cara que que faz o nosso café da manhã, falava: ‘pô, cara, estava incomodado já de não poder ajudar’. E quando António chegou, me deu uma força absurda. Ele me deu uma liberdade muito grande e, graças a Deus, foi com ele que eu comecei a alavancar, aumentando bastante os números. Foi um cara que me deu muita confiança. Todos no grupo me deram muita força: o Paulinho foi um cara super importante, o Cássio… e eu sou eternamente grato a esses caras. Tenho uma amizade boa com o António, até hoje a gente conversa. Ele falou: ‘nunca esqueça de quem você é. Eu sei, todo mundo que te conhece sabe do seu potencial e tal’. Isso me trouxe muita força e depois da cirurgia pude retomar a minha melhor condição física. Ter esses caras que me passaram muita confiança, junto com meu fisiologista, o pessoal da nutrição, a minha terapeuta, o meu pai, os meus amigos pude voltar ainda melhor e encontrar a minha melhor versão aqui no Corinthians.
Alguns corintianos ficam na bronca quando você ri após uma finalização errada. Eu dou risada? Nunca reparei (risos). Pode ser nervosismo, mas acho que é algo como: “Mentira que não acertei esse chute”. Entende? É o meu jeito, quem me conhece sabe que sou assim. Quem não conhece se assusta pela forma como encaro as coisas.
Não é indiferença, então? Não, não… negativo. Sou um cara que se cobra bastante. Me cobro por uma finalização errada, por um gesto técnico não tão bom ou por um passe que não acertei. Seria desrespeitoso estar relaxado. Imagine para o torcedor ver: “Pô, ele está rindo”. É só o meu jeito, mesmo.
Mas esses erros têm rendido memes. Qual deles? (risos) O escorregão do Palmeiras? Esse foi embaçado.
O que houve ali, afinal? Eu cheguei no vestiário dizendo: “Não é possível, só comigo que acontecem essas coisas”. Fui pressionar o Weverton e aí ele tocou para alguém. Quando tentei virar o corpo, o cadarço estava um pouco grande e a trava darefechuteira me puxou. Meu, parece que tomei um rapa. Caí, e caí feio. No chão eu falei: “Nossa, mentira”. Levantei, continuei no jogo, mas é incrível como essas coisas acontecem na hora errada.
E você acompanha esses memes? Querendo ou não, eles chegam. Dos amigos de resenha e até entre nós [jogadores]. Lá no clube às vezes brincamos. Dia desses fiz um gol, o Garro tropeçou na placa e caiu, e mandamos no grupo [de WhatsApp] zoandoele também. Tem que saber ter o equilíbrio de levar na esportiva.
No meio do jogo você chega a pensar que algo pode virar meme? Não, aí não. Se eu for pensar isso, aí já era. Dentro de um jogo você tem que estar com a cabeça vazia. Se ficar pensando nisso, pode nem ter uma determinada oportunidade por estar imaginando essas coisas, sabe? É algo que pode retrair um jogador. Então é importante esquecer.
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