Chamando atenção no Mundial, time sul-africano tem apelido "The Brazilians" e idealiza prática do futebol com talento e ofensividade
“The Brazilians jogam com talento, paixão e precisão, deixando torcedores admirados e os adversários com inveja. Por isso, o time foi apelidado de “Bafana ba Style” (Meninos com Estilo) devido ao futebol atraente que exibem.” Assim o Mamelodi Sundowns faz questão de se descrever em seu site oficial, como em uma espécie de manifesto, em que exalta feitos e apresenta a ideia central do clube que chama a atenção no Mundial de Clubes de 2025.
Adversário do Fluminense nesta quarta-feira, 25, às 16h (de Brasília), por uma vaga no mata-mata, o time empolgou nas primeiras rodadas. Depois de vencer o Ulsan HD, fez jogo duro e movimentado na derrota contra o potente Borussia Dortmund, se apresentando ao mundo fazendo jus ao próprio conceito futebolístico.
Sem grandes estrelas, o Mamelodi Sundowns somou 30 finalizações nas rodadas iniciais, com média de posse de bola em 63,5% (a quinta maior do torneio). No entanto, além dos números e futebol corajoso, a equipe também atraiu olhares a simbolismos repletos de carisma.
Um desses aspectos é o uniforme, que se inspira nas tradicionais cores da seleção brasileira. E, da mesma forma, carrega elementos culturais, como a filosofia Ubuntu-Botho (que significa, essencialmente, “eu sou, porque nós somos”) estampada na parte central e frontal das camisas.
Fundado como Sundowns Football Club em 1964, o clube nasceu em Marabastad, região cosmopolita de Petrória, a capital administrativa da África do Sul. Batizado homenageando um time de futebol amador dos anos 1940 que existiu na região, a equipe “se mudou” em 1970.
Assim, chegou a Mamelodi, município a nordeste de Pretória, criado em 1953 como uma “cidade para negros”. À época, o país vivia o Apartheid (1948 – 1994), sistema de segregação racial promovido por sucessivos governos sul-africanos, que separava a sociedade dos brancos da de negros, indianos e mestiços.
Mamelodi é um município a nordeste de Pretória, criado como “cidade para negros” – Wikimedia
O time, dessa maneira, iniciou sua trajetória em campeonatos exclusivos para negros, tendo em vista que as “ligas profissionais” aceitavam apenas brancos. Foi apenas em 1985, quando o futebol se tornou o primeiro esporte não-segregado do país, que o Sundowns ingressou na National Soccer League, unindo os clubes mais fortes.
Também em 1985, o Mamelodi Sundowns foi comprado pelo empresário Zola Mahobe, apelidado de “Mr. Cool”. Em um de seus primeiros atos à frente da equipe, trocou o uniforme principal para as cores atuais, inspiradas no uniforme da seleção brasileira.
O investimento, lado a lado à chegada do treinador Stanley Tshabalala, “institucionalizou” o estilo de jogo ofensivo, de posse e liberdade, também remetendo a grandes times do Brasil. O técnico, um dos grandes da história do futebol local, implementou o estilo “The shoeshine and piano”, que consiste em controlar o jogo com passes curtos, movimentação e controle de ritmo.
O modelo preparou o terreno para o primeiro título da liga da história, em 1988, e para o segundo, em 1990 (em retorno de Tshabalala). Ainda no século XX, conquistou o campeonato em 1993, 1998, 1999 e 2000.
Curiosamente, em 1993, o Mamelodi Sundowns levantou a taça de forma “ainda mais brasileira”. À época, o escudo remetia em formato e cores aos logos da CBF entre 1980 e 1991.
Mamelodi Sundowns conquistou título sul-africano de 1993 com emblema parecido com da CBF – Reprodução
A dominância nacional ficou ainda maior a partir de 2004, quando o empresário da mineração Patrice Motsepe, primeiro bilionário negro da África do Sul, se tornou acionista majoritário e presidente do clube — cargo que hoje pertence a seu filho Thlopie Motsepe. Desde então, foram 12 troféus da liga e um da Champions League da África (2016), levando a equipe ao posto de segunda melhor ranqueada de seu continente, garantindo vaga no Mundial de 2025.
Atual vice-campeão continental e campeão do Campeonato Sul-Africano, o Mamelodi Sundowns não deve abdicar de seu estilo contra o Fluminense. Ao menos, é isso que se espera se for seguido o padrão do treinador Miguel Cardoso na competição.
O português tem escalado sua equipe variando entre 4-1-4-1, 4-2-3-1 e 4-3-3, a depender das fases do jogo. Com bola, os Bafana ba Style aplicam uma posse de bola de mobilidade, com muitas ultrapassagens, tabelas e utilização do corredor central, com destaque para o meia-atacante brasileiro Lucas Ribeiro e o goleador Iqraam Rayners.
Uma das armas dos Brazilians é a construção partindo do goleiro Ronwen Williams, que atrai a pressão do adversário para, assim, atacar as costas da linha defensiva. Esse modo, no entanto, tal qual todos do futebol, gera riscos, como contra o Borussia Dortmund, que o arqueiro errou um passe na própria área e a jogada terminou em gol alemão.
Já sem bola, o Mamelodi não abdica de pressionar alto em momentos da partida. Todavia, contra o Tricolor, deve encaixar a compactação em bloco menos adiantados, para aproveitar a fragilidade da equipe brasileira em transições defensivas rápidas.
Rayners marcou para o Mamelodi Sundowns na estreia – Megan Briggs / Getty Images via AFP