(Texto publicado originalmente por PLACAR em 27 de março de 2021, dia do centenário de nascimento de Barbosa)

Barbosa: 100 anos

Barbosa: 100 anos – Montagem sobre Acervo pessoal

Não há um pedido sequer de entrevista em que Tereza Borba, 56, não se antecipe ao jornalista, com a agilidade de um atacante que faz valer o jargão “ensaboado”, emendando quase que de bate-pronto a resposta que guarda já na ponta da língua: “é para falar só de 1950? Se for, eu já quero deixar bem claro: não falo porque o Barbosa (1921-2000) foi muito mais do que isso”.

A cuidadora de profissão, que virou filha – pede para ser chamada assim, não gosta dos termos filha afetiva ou adotiva –, conheceu Moacyr Barbosa, que neste sábado, 27 de março, completaria 100 anos, já nos últimos anos de vida do ex-goleiro, na década de 1990, no quiosque que tinha na praia, no bairro Cidade Ocian, em Praia Grande, no litoral paulista, reduto improvável que o anti-herói do futebol nacional escolheu para morar com a mulher Clotilde, que faleceu em decorrência de um câncer na medula, em 1997, três anos antes de Barbosa partir.

Os laços, curiosamente, surgiram como uma perfeita obra do acaso – para os que acreditam em tal versão – ou pelo sobrenatural, a interpretação preferida de Tereza. Eram comuns, todas as manhãs, as visitas de um senhor negro, e sempre elegante, na cadeira de plástico do quiosque 79. Barbosa abria tranquilamente o jornal e, confortavelmente acomodado, pedia por uma dose de sua bebida alcoólica preferida,  “birinights”.

“Era uma pessoa completamente diferente das outras. Ele passava todo dia pelo quiosque, se sentava e pedia dois dedinhos de bebida para mim. Como tinha o dedo quebrado, os dois dedinhos dele davam um copo cheio e eu morria de rir com isso, mas nunca desconfiei que havia sido goleiro, jogador ou um grande profissional do esporte. Nos tornamos grandes amigos e ele falava: ‘eu queria ter uma filha como você’. Meu marido, vascaíno, um dia passando por lá, arregalou os olhos para ele e disse: ‘nossa, você não é o Barbosa do Vasco?’ O olho do Barbosa brilhou, como uma criança quando você dá um brinquedo”, conta Tereza.

Tereza Borba exibe orgulhosa as relíquias que herdou de Barbosa - Kaio Lakaio/Placar