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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

Capa de PLACAR ajudou a eternizar porco como mascote do Palmeiras

Revista com Jorginho Putinatti segurando um simpático leitão reforçou o orgulho do grito que já ecoava nas arquibancadas. Entenda origem do apelido, que nasce pejorativo

Afinal, qual é o mascote do Palmeiras? Originalmente é o periquito, mas já há muitos anos o clube reconhece o porco como seu segundo mascote oficial. Nesta semana, o animal suíno ganhou as manchetes depois que um torcedor corintiano atirou uma cabeça de porco no gramado da Neo Química Arena no último dérbi, dia 4. Antes usado de forma pejorativa pelos rivais, o bicho foi adotado pelos palmeirenses na década de 1980, com uma importante forcinha da revista PLACAR.

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Em 10 de novembro de 1986, o meia alviverde Jorginho Putinatti topou posar com um simpático leitão na capa. A reportagem explicou de onde surgiu a alcunha e os responsáveis pela aceitação como novo mascote. Na ocasião, o jogador aprovou a canção “Dá-lhe porco” que começava a ganhar as arquibancadas.

““Gostei da musiquinha e do impacto deste novo grito de guerra”, aprovou Jorginho, enquanto afagava os pelos róseos e espetados de um leitãozinho, com que posou para uma foto especial para PLACAR.”“, dizia o texto de Nelson Urt (leia íntegra abaixo).

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Periquito ou porco?

O primeiro mascote do Palmeiras, o periquito, surgiu em 1917, quando o clube, então chamado de Palestra Itália, adotou o verde como sua cor principal, três anos depois de sua fundação. Além do fato da ave tipicamente brasileira ser verde, pesou o fato de vários periquitos frequentarem os bosques do Parque Antárctica.

Como explica a matéria de PLACAR, inicialmente a alcunha de porco era usada como um insulto aos palmeirenses, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, quando o clube de origem italiana foi associando ao governo fascista de Benito Mussolini. Outro episódio, em 1969, quando apenas o Palmeiras votou contra a inscrição de dois jogadores para os lugares dos corintianos Lidu e Eduardo, mortos num acidente de automóvel, reforçou o tom das ofensas.

A história começou a mudar em 1983, quando João Roberto Gobbato, então diretor de marketing do Palmeiras, decidiu virar o feitiço contra o feiticeiro e adotar o porco como mascote. A diretoria alviverde da época relutou, mas foi convencida pela aceitação dos torcedores nos estádios.

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Edição de 10 de novembro de 1986 exaltou porco como mascote do Palmeiras - Reprodução/PLACAR
Edição de 10 de novembro de 1986 exaltou porco como mascote do Palmeiras – Reprodução/PLACAR

Dizia trecho da reportagem:

“Quando não se pode com um inimigo, junta-se a ele”, lembra um ditado a socióloga Sílvia Calegari. “Assumir o apelido é um antídoto para se livrar dele”, recomendava aos palmeirenses. Sílvia, corintiana de 28 anos, foi uma das pessoas que mais estimularam seu patrão, o empresário João Roberto Gobbato, a lutar pela adoção do porco como símbolo palmeirense, ideia defendida pelo falecido repórter Marco Aurélio Borba, em PLACAR, há três anos.

Em 1986, os cantos de “E dá-lhe Porco, e dá-lhe Porco, olê, olê, olê!” já eram um sucesso nas arquibancadas do Parque Antártica e do Morumbi, o que inspirou a icônica capa com Jorginho Putinatti. Atualmente, o Palmeiras reconhece o porco como seu segundo mascote oficial e em 2016 batizou o animal de Porco Gobatto, em homenagem a seu criador.

O blog #TBT PLACAR, que toda quinta-feira recupera um tesouro de nossos arquivos, reproduz abaixo o texto na íntegra:

Edição de 10 de novembro de 1986 exaltou porco como mascote do Palmeiras - Reprodução/PLACAR
Edição de 10 de novembro de 1986 exaltou porco como mascote do Palmeiras – Reprodução/PLACAR

E DÁ-LHE PORCO!

Antes era ofensa e dava briga. Mas, com muito bom humor, a torcida do Palmeiras vira o feitiço contra os feiticeiros e já lança seu novo grito de guerra

Por: Nelson Urt

Muita gente gente custou a acreditar no que estava ouvindo. Para comemorar a vitória por 1 x O contra o Santos, quarta-feira passada, 29 de outubro, no Pacaembu, a torcida do Palmeiras, ainda com certa timidez, tomava o veneno atirado pelos adversários. “E dá-lhe porco, e dá-lhe porco, olê, olê, olê…””, cantava o refrão. Domingo, no empate de O x O com o invicto São Paulo, no Morumbi, a massa alviverde assumiu de vez, e o porco virou moda — uma espécie de novo parceiro para o tradicional periquito. “Gostei da musiquinha e do impacto deste novo grito de guerra”, aprovou Jorginho, enquanto afagava os pelos róseos e espetados de um leitãozinho, com que posou para uma foto especial para PLACAR.

Até há pouco tempo, chamar palmeirense de porco era bem pior que lhe xingar a mãe. Como o nome do animal também designa indivíduos sujos, grosseiros e obscenos, não havia maior provocação à honra palestrina. Nas derrotas, o humilhante coro de “porco, porco” ecoava pelos estádios a perseguir a galera. Estava reacesa uma ofensa usada na época do pós-guerra, para designar os italianos fascistas. No futebol, fora recriada por corintianos, em 1968, quando só o Palmeiras votou contra a inscrição de dois jogadores para os lugares dos alvinegros Lidu e Eduardo, mortos num acidente de automóvel.

“Quando não se pode com um inimigo, junta-se a ele”, lembra um ditado a socióloga Sílvia Calegari. “Assumir o apelido é um antídoto para se livrar dele”, recomendava aos palmeirenses. Sílvia, corintiana de 28 anos, foi uma das pessoas que mais estimularam seu patrão, o empresário João Roberto Gobbato, a lutar pela adoção do porco como símbolo palmeirense, ideia defendida pelo falecido repórter Marco Aurélio Borba, em PLACAR, há três anos.

Há dois anos, ao iniciar no Parque Antártica um movimento para a adoção e comercialização do porquinho, Gobbato provocou um deus-nos-acuda. Perdeu o cargo de diretor de marketing do clube, quase ficou sem a carteirinha de conselheiro e ainda por cima ganhou o apelido de *“Porcato”. Quarta-feira passada, no Pacaembu, ao ouvir a torcida cantando o refrão, ele se sentiu, enfim, recompensado.

“Ninguém mais segura o porco”, bradou Gobbato, sob o olhar de reprovação dos velhos cardeais da Onorata Società que povoavam a tribuna de honra do estádio. “Agora o movimento está partindo de um universo de mais de 3 milhões de palmeirenses em todo o país”, orgulha-se.

“É A MÃE” — O apoio vem de todas as camadas. Como Jorginho, os outros jogadores sentiram boas vibrações vindas da arquibancada. “Até aplaudi quando ouvi o corinho”’, conta o capitão do time, Vágner, que também é chegado num pagode. Dessa maneira, já não há mais briga quando os históricos desafetos corintianos se referem ao Parque Antártica, antigo Jardim Suspenso, como “Torresmão”, ou, ainda, “Pururucão”

Nem todos, porém, concordam’ que o porquinho passe a ocupar, ao lado do periquito, que já ganhou até estátua nos jardins do clube, um lugar de destaque na gloriosa história do Palmeiras. Os radicais contra- atacam com velocidade: *“Porco é a mãe de quem falou”’, ralha o conse- lheiro Vittorio Alessandro. “É um desrespeito a nossas tradições”, dispara o delegado de polícia Affonso della Monica, diretor de esportes amadores.

Os torcedores nem querem dar ouvidos às reações contrárias e comemoram a adoção do suíno como mais uma memorável vitória sobre “aquele timeco da Marginal sem número” — referência ao não menos glorioso alvinegro do Parque São Jorge. “Porco é o nosso novo grito de guerra”, festeja José Carlos Burti, presidente da TUP, a maior torcida uniformizada do Palmeiras. “De agora em diante, quem gritar porco só estará ajudando a incentivar o Verdão.”

Há dois anos a TUP ensaia seu contragolpe. Os chefes da torcida chegaram a comercializar, com sucesso, um casal de porquinhos de porcelana, vendido a 5 cruzados. Dado o êxito, eles sentiram que a idéia ganhava força e unanimidade entre os adeptos. Outras torcidas uniformizadas aderiram à estratégia, que tinha como quartel-general o es-critório de Gobbato. “Agora é porco na cabeça deles”, bombardeia Cleo Sóstenes, presidente da Mancha Verde, a segunda mais numerosa força palmeirense. “Os conservadores terão de engolir.”

O presidente Nélson Tadini Duque não é contrário à idéia. Se fosse, tarde demais. Como um rastilho de pólvora, o movimento incendiou a massa e está fora de seu controle. “É sensacional mas não iremos oficializar o porco, já que temos o periquito”, pondera. Apesar dos óculos fundo-de-garrafa, Duque enxerga longe. Ele sabe o quanto é importante respeitar o sentimento de uma das maiores torcidas do país.

Isso ajuda a garantir altos lucros como o de domingo, no Morumbi, que, segundo o borderô, acolheu mais de 60 000 pagantes e 1,717 milhão de cruzados de renda. Numa curiosa ilusão de óptica, contudo, a impressão era de que havia bem mais gente no estádio. Outra curiosidade: apesar da presença em campo de dois irretocáveis artilheiros, Careca e Mirandinha, o rapaz que pilota o marcador eletrônico teve uma tarde ociosa. Palmeiras e São Paulo fizeram o único jogo da rodada a terminar como começou, tudo igual e em branco.

Durante a semana passada, no entanto, o próprio presidente Duque tratou de estimular o comparecimento ao grande clássico travando com o seu colega do São Paulo, Carlos Miguel Aidar, um duelo de bastidores. *“Será uma festa verde”, provocava. *“Colocaremos no Morumbi meia dúzia de palmeirenses para cada são-paulino.”

O verde não foi maioria. As torcidas, entretanto, cumpriram sua parte e dividiram o estádio. Quem estava de volta de uma viagem que durou quatro meses, desde a excursão para ver a Copa do Mundo, no México, surpreendeu-se com as diferenças. “Fiquei espantado ao ouvir os palmeirenses gritando “porco”, admirava-se Hélio Silva, chefe da Torcida Uniformizada do São Paulo. “Acho que isso pode deixá-los mais raivosos”’, teme.

E O GAMBÁ? — Gobbato, patrono do projeto porco, não acredita que o novo mascote trará uma carga de agressividade aos torcedores. ““Poderá, isto sim, reforçar nossa masculinidade”, acredita. Gobbato se refere ao suíno como um animal de enorme resistência e insaciável apetite sexual.

“Achei lindo de morrer”’, delira a bela torcedora Sílvia Toledo, militante da TUP. “E um animal bonito”, define Marcelo Lima, diretorda torcida. “Quero ver se os outros vão ter peito de assumir o Gambá ou o Bambi”’, desafia.

Prendendo as patas e afagando a nova vedete da massa, de pelos clarinhos que encobrem o couro avermelhado e muita banha, Jorginho sente-se à vontade. Há sete anos no Palmeiras, ele é remanescente da época em que, das arquibancadas, os inimigos gritavam “porco” para humilhar e intimidar. Agora, quando a torcida canta “e dá-lhe porco”, Jorginho tem a sensação de que a vitória está muito mais perto.

“Só espero estar aqui para ouvir o grito de porcão campeão”, sonha. Para isso, o Verdão conta com um aliado a mais e um inimigo a menos. E não será a associação com um animal que ronca e fuça que irá diminuir o Palmeiras.

Porcão ou não, ele tem o destino dos gigantes pela própria natureza.

 

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