Investigação apontou que dinheiro entregue a intermediário do acordo com a da casa de apostas foi depositado na conta da UJ Football Talent, citada como braço do PCC no futebol; delegado diz que clube foi vítima
O Corinthians voltou às páginas policiais nesta quinta-feira, 15, em razão dos desdobramentos do caso VaideBet, a casa de apostas que chegou ao clube celebrada como maior patrocínio máster do futebol brasileiro, em janeiro de 2024, e cinco meses depois rescindiu contrato em meio a denúncias graves.
Uma Investigação da Polícia Civil de São Paulo, com apoio do Ministério Público, apontou suspeitas de lavagem de dinheiro e associação criminosa, além de identificar ligações com o Primeiro Comando da Capital (PCC). As novas revelações complicam ainda mais o presidente Augusto Melo, que enfrenta um processo de impeachment.
A investigação teve início com uma denúncia de que a empresa Rede Social Media Design LTDA, que intermediou o acordo entre VaideBet e Corinthians, teria repassado parte do valor da comissão a uma outra organização. Essa nova empresa foi identificada como Neoway Soluções Integradas em Serviços LTDA, mas a sócia da Neoway, Edna Oliveira dos Santos, moradora de Peruíbe, no litoral de São Paulo, disse desconhecer o caso.
De acordo com apurações da CNN, a investigação conduzida pelo Delegado Tiago Fernando Correia, do DPPC, área responsável por casos de lavagem de dinheiro, com o apoio do Promotor de Justiça Juliano Carvalho Atoji, do GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), utilizou a quebra de sigilo bancário para rastrear o caminho do dinheiro, pago em comissão pelo patrocínio. Descobriu-se, então, duas contas pelas quais circularam R$ 1,4 milhão, com a ação de “empresas fantasma” até chegar ao PCC.
O contrato com a VaideBet previa o pagamento de R$ 370 milhões em três anos, o que faria dela o maior patrocínio máster do futebol brasileiro, mas o acordo acabou rescindido em 7 de junho, com a empresa citando a suposta presença de um “laranja” e a violação de uma cláusula anticorrupção do contrato. O Corinthians diz não ter “responsabilidade por qualquer direcionamento de dinheiro que não esteja na conta bancária do clube’ e foi tratado pela polícia como vítima; entenda o caso:
A quantia de R$ 1,4 milhão, inicialmente desviada em duas remessas de R$ 700.000 para a conta da Rede Social Media Design – empresa de Alex Cassundé, figura central nas investigações -, teria sido repassado para a Neoway Soluções Integradas em transferências de R$ 580.000 e R$ 462.000.
Já em março do ano passado, a Neoway transferiu cerca de R$ 1 milhão para a Wave Intermediações Tecnológicas, que por sua vez fez mais três transferências para a UJ Football Talent Intermediação, na casa dos R$ 870.000, ainda de acordo com as investigações.
Foi justamente na UJ Football Talent Intermediação que a polícia identificou uma ligação com o crime organizado, pois a empresa foi citada por Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, delator do PCC morto em uma emboscada no Aeroporto de Guarulhos, em novembro de 2024. Segundo Gritzbach, a UJ seria informalmente controlada por Danilo Lima, conhecido como “Tripa”, um integrante do PCC.
Nesta quinta, o Blog do Fausto Macedo, do Estadão, teve acesso a um relatório das investigações que apontou que R$ 1.074.150,00 pagos pelo Corinthians a seus intermediários foi parar na conta bancária da UJ Football Talent Intermediação Ltda.
Além do empresário Alex Cassundé, membros da diretoria do Corinthians, incluindo o presidente Augusto Melo, o ex-diretor administrativo Marcelo Mariano, e o ex-superintendente de Marketing Sérgio Moura, foram ouvidos pela polícia como investigados. A Polícia Civil apontou divergências entre os três depoimentos, sobretudo sobre como Alex Cassundé, apontado como intermediário da negociação, teria chegado ao clube. O empresário atuou na campanha de Augusto Melo à presidência, no final de 2023.
Durante as investigações, Cassundé alegou que remeteu dinheiro à Neoway porque fora vítima de um golpe, uma tese que não se sustentou com base em documentações descobertas pela polícia. O intermediário informou, ainda em depoimento à polícia, que não conhecia a VaideBet até perguntar por “dicas de como encontrar uma empresa de bet” ao ChatGPT, inteligência artificial generativa da OpenAI, e que diante da resposta teria buscado sócios da empresa.
A Polícia Civil acredita em um desfecho da investigação ainda em maio, e caso a polícia identifique indícios de crime, os responsáveis serão indiciados junto ao Ministério Público. O Corinthians nega qualquer envolvimento com o crime organizado ou repasses a terceiros, e se diz vítima no processo, tese reafirmada pelo delegado do caso, de acordo com trecho do relatório divulgado pelo Estadão.
“Parece-nos nítido, destarte, que aqueles que deram causa ao desvio de dinheiro dos cofres do Sport Club Corinthians Paulista se utilizaram das tradicionais estratégias de lavagem de dinheiro para, não só introduzir os valores no sistema financeiro e distanciar o capital ilícito da sua origem, visando, assim, evitar uma associação direta com a infração antecedente” escreveu o delegado Tiago Fernando Correia, que presidente o inquérito.
O delegado afirmou ter colhido “evidências robustas” de que a Neoway “era uma empresa fantasma”, bem como outras três empresas que comporiam o grupo criminoso: ACJ Platform, a Thabs Soluções Integradas e a Carvalho Distribuidora. “Em suma, que o Sport Club Corinthians Paulista foi lesado, é indubitável; e concordemos que, não se trata de coincidência, muito menos de mero acaso, o dinheiro ter saído das contas de um renomado Clube brasileiro para ser abocanhado por uma afamada Agência de Assessoria Esportiva”, escreveu o delegado.
O clube informou em nota que mantém seu “compromisso contra qualquer prática ilegal”, disse colaborar com as investigações e que contratou uma empresa para apuração autônoma, além de realizar uma apuração junto ao Conselho Deliberativo.
O processo de impeachment de Augusto Melo no Conselho Deliberativo teve sua votação de admissibilidade aprovada, mas foi suspenso, aguardando pareceres e defesa, com data marcada para 26 de maio. A defesa de Cassundé ainda não se manifestou.