Sob comando de Fernando Diniz, o Vasco reencontrou o bom futebol e vive fase de crescimento. Com a terceira melhor campanha do segundo turno do Campeonato Brasileiro, o Cruzmaltino alia um ataque poderoso aos bons resultados.
Assim, com Diniz novamente no centro de um debate que instiga amor e ódio, o assunto tática entra em pauta. Simultaneamente, falas que buscam igualar o estilo do brasileiro ao de Pep Guardiola, lendário técnico espanhol do Manchester City, voltam a aparecer.
Todavia, na contramão da ideia que surge de uma análise equivocada de ambos, as figuras têm mais semelhanças do que diferenças. Desse modo, PLACAR explica em quais pontos Fernando Diniz e Pep Guardiola são distintos; confira.
Guardiola brasileiro?
Quando Fernando Diniz emergiu na primeira prateleira do futebol brasileiro, foi comum dizer que ele e Pep Guardiola seriam treinadores semelhantes. A associação se apoia em pontos simples: valorização pela posse de bola, construção desde o goleiro participativo e busca pelo protagonismo.
Mas essas semelhanças são superficiais. Em essência, eles pertencem a linhagens opostas do futebol: Guardiola vem da tradição do Jogo de Posição europeu, enquanto Diniz é um dos grandes nomes do relacionismo, também batizado de Jogo Funcional por alguns teóricos.

Pep Guardiola e Fernando Diniz em 2018 – Reprodução
O próprio treinador do Vasco já se colocou em outra posição, quando questionado sobre as semelhanças com o catalão. Em entrevista ao SporTV, em 2022, disse: “Por gostar de ter a bola, obviamente as pessoas me associam ao jeito do Guardiola jogar, mas para por aí. A maneira dele ter a bola é quase o oposto da minha.”
“É um jogo mais posicional. Os jogadores respeitam muito a posição e a bola vai no espaço. Os atletas obedecem um determinado espaço para ficar, e o jeito que eu vejo futebol no momento é quase que aposicional. Os jogadores conseguem migrar mais de posição, o campo fica mais aberto e o jogo fica mais livre. Em determinados setores do campo a gente se aproxima”, explicou.
Pep Guardiola também apontou diferenças, em coletiva de imprensa na véspera de seu embate contra Diniz, na final do Mundial de Clubes de 2023, vencido pelo City, que goleou o Fluminense. ”Eles jogam o estilo típico do Brasil. Com passes curtos, a combinação é muito boa. Precisamos aceitar que vamos jogar contra um time atípico, que não é posicional. Eles se movem muito: a bola se movimenta, e os jogadores vão junto”.
Por que Diniz e Guardiola são diferentes?
Guardiola é herdeiro da escola de Johan Cruyff no Barcelona e do Ajax de Rinus Michels. O campo é organizado em zonas pré-definidas, o posicionamento antecede o passe, e a vantagem nasce do controle racional do espaço.
Já Diniz, por sua vez, segue uma lógica brasileira, que teve grandes nomes como Flávio Costa, Vicente Feola, Telê Santana e Vanderlei Luxemburgo. Com organização que usa a bola como uma das referências, suas equipes costumam buscar vantagens técnicas, numéricas e sócio-afetivas.
- Jogo funcional de Fernando Diniz no Vasco
- Ataque posicional de Pep Guardiola no Manchester City
No campo, essas diferenças ficam claras. Os times de Pep têm desenho tático bem mais visível. Desde a fase inicial da construção, o passe busca liberar o espaço ou atrair o adversário para gerar vantagem em outro setor.
Em ataque posicionado, é muito comum ver a equipe postada em 2-3-5, com atletas presentes em todos os corredores (esquerdo, central e direito) e meio-espaços (central-esquerdo e central-direito). Assim, com a circulação da posse, busca gerar vantagens e encontrar espaços, movimentando a defesa adversária.
- Manchester City de Guardiola, com quadrado bem estabelecido no meio, ponta em condição de “um contra um”, e área povoada em fase final de ataque – Montagem sobre TNT Sports
- City de Pep em construção ofensiva. Meio-campo técnico, com posições marcadas, e ponta em amplitude – Montagem sobre Premier League
- Nos anos de Bayern, Pep montava equipe em formato similar. Dois pontas em amplitude, dupla central no meio e três peças ofensivas no corredor central e meios-espaços – Montagem sobre TNT Sports
Diniz, por outro lado, aproxima peças para criar superioridade técnica dentro de zonas congestionadas. Assim, com atletas em alturas diferentes, cria situações de “escadinha” (jogadores em diagonais) e permite progressões por tabelas, corta-luzes e interações entre muitos atletas em um setor, além da possibilidade de atrair a marcação do rival para atacar o lado oposto.
- Construção no próprio campo do Vasco de Diniz. Paralelas cheias, com opção de escape, para desencadear saída ao campo ofensivo – Montagem sobre Cazé TV
- Meio-campo com jogadores próximos, em alturas diferentes e diagonais curtas. Jogador com posse tem espaço para passe vertical – Montagem sobre ge tv
- Pelo Fluminense, era extremamente comum a “saída radicalizada”. Destacado, setor cheio, atraindo marcação – Montagem sobre ge tv
Nem mesmo na saída curta existem tantas semelhanças, além da ideia central de atrair o adversário para atacar o espaço. Guardiola utiliza conceitos mais clássicos do Jogo de Posição, como a busca por “homem-livre”, partindo de sistemas com um goleiro qualificado, três jogadores à frente e dois conectores, todos posicionados e fiéis a suas alturas.
Fernando Diniz, por sua vez, apresenta variações menos previsíveis em formato. Ou seja, atualmente, no Vasco, não é incomum que Philippe Coutinho, meia-armador, recue na própria área para gerar superioridades e desequilibrar a pressão do time oposto.
A radicalização dessa estratégia foi muito vista durante sua passagem pelo Fluminense. Inclusive, durante a derrota para o Manchester City de Pep Guardiola na final do Mundial, um lance em que o time de Diniz circula a bola sem ceder à pressão na própria área viralizou. O lance, inclusive, mostra sete jogadores de linha e o goleiro do Fluminense em um curto espaço.

Famosa saída de bola de Diniz executada contra uma equipe de Guardiola – Montagem sobre Cazé TV













