Trump é obstáculo para Copa de 2026 na América do Norte
Recente declaração do presidente americano sobre africanos fortaleceu candidatura do Marrocos e causou apreensão em cartolas dos EUA, México e Canadá
Na semana passada, um dos maiores astros da história do futebol nos Estados Unidos, Landon Donovan, mandou um recado diretamente a Donald Trump quando foi apresentado como jogador do clube mexicano Leon: “Não acredito em muros”. A mensagem era uma referência às promessas do presidente americano de construir a barreira entre o México e os EUA.
A frase foi exaltada por torcedores mexicanos, mas, nos bastidores da cartolagem dos Estados Unidos, evidenciou um problema: Donald Trump. O presidente é visto como um obstáculo real para o objetivo dos americanos de sediar a Copa do Mundo de 2026, ao lado de México e Canadá.
Com mais de quarenta estádios à disposição nos três países, promessas de renda inédita e uma infraestrutura invejável, a candidatura conjunta da América do Norte é considerada como a franca favorita para vencer a corrida por organizar a Copa do Mundo, a primeira com 48 seleções. A outra opção é o Marrocos, país que já tentou sediar o evento em quatro oportunidades, sem sucesso.
A votação está marcada para o dia 13 junho, em Moscou, na Rússia. Será também a primeira vez que todas as 209 federações nacionais votarão para escolher a sede do Mundial, um privilégio que se limitava aos 24 membros do Comitê Executivo da Fifa e alvo de escândalo de corrupção.
Mas, nos últimos meses, os comentários polêmicos de Donald Trump sobre política externa começaram a contaminar a campanha que era considerada como imbatível. Ao chamar os países africanos de “buracos de merda”, há menos de dez dias, o presidente americano disseminou o pânico entre os cartolas dos Estados Unidos. Afinal, será da África que virão mais de 25% dos votos que decidem a eleição.
Nesta sexta-feira, a Confederação Africana de Futebol (CAF) se reunirá e vai considerar um apoio dos 54 votos do continente para a candidatura do Marrocos. “Existe solidariedade na África” afirmou ao jornal The New York Times na semana passada o presidente da Federação de Futebol de Comores, Hassan Waberi. ” Nós nos sentimos insultados. Os africanos apoiarão o Marrocos”, confirmou Kwesi Nyantakyi, vice-presidente da CAF.
Donald Trump também criou problemas ao tentar impor barreiras para a entrada de imigrantes muçulmanos no país. Na Fifa, outros quinze votos fora da África são de países com maioria de sua população muçulmana. Na América do Sul não existe ainda uma posição comum da Conmebol. Mas com as sanções americanas contra a Venezuela, um consenso poderá ser difícil.
Crise de confiança
O mal-estar dos dirigentes americanos ficou ainda mais nítido quando, no início do mês, uma pesquisa de opinião revelou que a confiança do mundo em relação à liderança dos Estados Unidos era a mais baixa de todos os tempos. Segundo o levantamento da Gallup em 134 países, apenas 30% dos entrevistados afirmam ter uma visão positiva do governo americano. Com Barack Obama, a taxa era de 48%. A mesma pesquisa revelou que o mundo confia hoje mais na Alemanha e na China do que em Donald Trump.
Apesar do favoritismo total e de uma infraestrutura muito superior ao concorrente do norte da África, o presidente da US Soccer (a federação americana de futebol), Sunil Gulati, sabe do desafio que Donald Trump representa. Para ele, a candidatura “não é apenas sobre estádios e hotéis”. “É sobre a percepção que existe sobre os EUA e estamos em um momento difícil no mundo”, afirmou.
“Apenas podemos controlar alguns fatores. Não podemos controlar o que ocorre na Coreia, com as embaixadas em Tel-Aviv ou acordos climáticos”, disse o dirigente, em uma referência às polêmicas decisões política de Donald Trump nos últimos meses. “Não podemos controlar a política”, admitiu Sunil Gulati, há poucos dias, em Londres.
Os organizadores da candidatura garantem o “total apoio de Washington” e também prometem que, se a Copa do Mundo for levada à América do Norte, ela será a mais bilionária da história. Em dificuldades financeiras, a promessa de dinheiro soa como música nos corredores da Fifa.
No entanto, em março, outra exigência da entidade promete causar atritos. A Fifa pedirá que os governos garantam a suspensão de vistos para quem for ao torneio em 2026, medida que irá no sentido contrário da política de Donald Trump de endurecer as condições de entrada no país.
Pelas contas dos americanos, eles terão de somar 104 votos para ser escolhidos, mas fontes ligadas à candidatura de Marrocos acreditam que existe um espaço para roubar alguns votos da candidatura americana.
Para isso, o governo marroquino já contratou um dos maiores especialistas em comunicação, Mike Lee, que levou o Rio de Janeiro a ganhar os Jogos Olímpicos de 2016 e garantiu a Copa do Mundo para o Catar em 2022. Os marroquinos alegam que apenas não ficaram com a Copa do Mundo de 2010 por conta de um pagamento de 10 milhões de dólares que os sul-africanos fizeram para comprar votos na Fifa.
Dentro da entidade, porém, há quem duvide da imparcialidade do presidente Gianni Infantino. Um de seus principais cabos eleitorais, em 2016, foi justamente Sunil Gulati, que agora quer uma retribuição. Além disso, existe um sentimento entre os dirigentes do Conselho da Fifa de que a entidade precisa compensar os americanos pela decisão de dar a Copa do Mundo de 2022 ao Catar e não para os Estados Unidos.