Para Carlo Ancelotti, o coronavírus estourou a ‘bolha’ do futebol mundial
Treinador italiano diz que cifras relacionadas ao esporte voltarão para “realidade” após pandemia; personalidades do futebol ouvidas por PLACAR debatem
O futebol está parado no mundo todo – exceto na Bielorrússia, onde o presidente receitou vodka contra o coronavírus – e não há qualquer previsão de retorno. Não se sabe de que forma as ligas serão recomeçadas e o tamanho do buraco econômico que a pandemia causará, mas já é possível prever que as consequências serão graves. Nos últimos dias, clubes como o Barcelona, na Europa, e o Atlético Mineiro, no Brasil, já anunciaram redução dos salários dos elencos para tentar combater a crise. Uma figura importante do esporte mundial, no entanto, tem uma tese mais “otimista”: para Carlo Ancelotti, técnico italiano do Everton, da Inglaterra, o futebol ficará mais próximo da realidade, com salários mais baixos e ingressos mais baratos.
“Em breve a economia mudará e, em todos os níveis, os direitos de TV valerão menos, jogadores de futebol e treinadores ganharão a metade, ingressos custarão menos, porque as pessoas terão menos dinheiro. Vamos nos preparar para uma contração geral”, afirmou Ancelotti ao diário Corriere dello Sport‘, citando que, “talvez tudo será melhor”. A teoria de Ancelotti, chamada de “utópica” por muitos, causou grande repercussão nas redes sociais. Nesta segunda-feira, 30, PLACAR reuniu personalidades do futebol nacional pra o suposto “estouro da bolha”.
Wagner Ribeiro, agente de grandes estrelas, como Neymar, dá razão a Ancelotti. “Da mesma forma que o cidadão em qualquer parte do mundo não sabe viver sem o futebol, sem a NBA, sem o tênis e outros esportes, as empresas que bancam estes eventos vão entrar em profunda recessão. A TV que pagamos para ver os jogos no conforto de casa também terá dificuldades. Haverá um equilíbrio entre os clubes, uma vez que apenas quem fatura muito sentirá no bolso, os pequenos que já recebiam pouco vão continuar com o mesmo pouco. A médio prazo, creio que não haja volta.”
José Carlos Brunoro, consultor de marketing com passagem marcante como executivo do Palmeiras e atualmente consultor das categorias de base do Fortaleza, além de cargos em voleibol, Fórmula 1 e basquete, é menos otimista, mas concorda que valores deverão ser readequados. “Coisas interessantes podem ocorrer. No futebol, logicamente haverá um pouco mais de dificuldade de receitas e em função disso haverá mais seletividade na contratação de atletas, isso poderá aumentar as ofertas no mercado. Isso também coincide com as novas normativas da Fifa sobre o limite de transações e isso pode fazer com que os clubes sejam mais seletivos. Porém, creio que os clubes grandea manterão uma distância razoável dos clubes médios e pequenos, porque as audiências e cotas de TV seguirão sendo maiores para eles. Os grandes serão sempre os mais beneficiados.”
Marquinhos Chedid, presidente do Red Bull Bragantino, acredita que a crise poderá ser uma deixa para que os clubes do Brasil pensem em um sistema de equiparação de salários. “É necessário estabelecer um critério, alinhando junto com clubes e CBF, um fair play de salários. Não seria um tabelamento, mas uma adoção de critérios de gestão salarial em cada divisão, como ocorre em outros países. Assim não haveria problemas trabalhistas enormes e poderíamos acabar com a irresponsabilidade de contratar sem receita, como Cruzeiro, Figueirense e outros clubes fizeram”
O treinador Renê Simões, que recentemente contraiu coronavírus e se recupera bem em casa, acredita que as reduções serão proporcionais, mantendo a desigualdade entre os clubes, mas crê em outros benefícios. “Acho que pode haver um futebol mais humano nas relações das pessoas, mas na parte financeira, não vejo. Terá de haver um grande pacto do qual todos terão de participar. Porque as emissoras não vão dar as mesmas cotas, os funcionários não vão receber o tanto que recebiam, as confederações vão faturar menos, os ingressos terão de ser mais baratos.”
O dirigente Rui Costa, que recentemente deixou o cargo de diretor de futebol do Atlético Mineiro, discorda do treinador italiano. “Sou fã do Ancelotti, mas não vejo essa questão desta forma. O mercado tem suas regras, acredito que essas adequações serão sazonais. Haverá uma retração inevitável agora, mas as desigualdades vão persistir.”
O ex-goleiro e atual empresário Gilmar Rinaldi, acredita que os atletas terão de se adequar às novas condições de mercado. “Não sei quanto tempo vai durar essa crise, mas tenho certeza de que todos nós sairemos diferentes, em todos os setores. Os jogadores também terão de se adaptar aos novos tempos, que são imprevisíveis. É realmente como se estivéssemos em guerra, onde todas as nações estão envolvidas, contra um inimigo desconhecido.”
O presidente do Grêmio, Romildo Bolzan, que também foi infectado pela Covid-19, prefere não fazer previsões. “É impossível avaliar este cenário no meio da crise. Vamos ver mais adiante. Com contratos em andamento e nenhum sinal de novos cenários para discutir, será melhor aguardar.” Na semana passada, Bolzan admitiu que o Grêmio “dificilmente conseguirá honrar seus compromissos em dia.”