Ódio ao PSG, polícia em CT e não ao Brasil: quem é Gignac, ídolo do Tigres
Dono de personalidade forte, francês acumulou histórias antes de construir idolatria surpreendente no México; jogador já recusou o Flamengo e o Boca Juniors
“Eu só odeio o Paris Saint-Germain, preferia morrer a assinar contrato com eles. Se o PSG me oferecesse dez vezes mais dinheiro mesmo assim não iria para lá”.
O atacante francês André-Pierre Gignac, 35 anos, definitivamente não se enquadra ao perfil mais comum encontrado nos jogadores de futebol. O principal nome do Tigres, adversário do Palmeiras neste domingo, às 15h (de Brasília), no estádio Cidade da Educação, pela semifinal do Mundial de Clubes, tem a carreira marcada por momentos tão imprevisíveis quanto intensos.
A declaração dada em 27 de março de 2017, meses antes do anúncio de Neymar como reforço do clube francês por 222 milhões de euros (821 milhões de reais) era uma clara resposta ao melhor estilo Gignac as perseguições dos rivais, que contestavam a sua forma física durante a passagem pelo Olympique de Marseille, entre 2010 e 2015. Mesmo durante o auge na França, jamais engoliu uma espécie de “bullyng” que sofria pelos quilos a mais
“Um BigMac para Gignac, um BigMac para Gignac”, cantavam os torcedores do PSG, em alusão ao hamburguer da rede de fast-food McDonald’s. O caso ganhou ainda mais força pela aparição da rede Burger King, em ação de marketing aproveitando a repercussão do caso: “”Um Whopper para Gignac! Nós nunca fomos bons com rimas. Nosso assunto principal é o hambúrguer”.
Gignac é o tipo que encara cada treino como se fosse um jogo. Começou a carreira no Lorient, onde passou entre 2004 e 2007, com um empréstimo ao modesto Pau, até chegar ao Tolousse, em 2007. “Tínhamos um camisa 9 de peso, que era o Elmander, sueco e companheiro do Ibrahimovic na seleção. O Gignac cobrava o treinador para jogar, até achávamos estranho, tinham discussões muito acaloradas. Pensávamos: que moleque audacioso, mal chegou”, relata o ex-volante Fabinho a PLACAR, que atuou no clube nas temporadas 2006/2007 e 2007/2008.
Nascido na cidade de Martigues, no sul da França, Gignac é filho de ciganos espanhóis e já contou publicamente que ajudava a sogra a vender roupas em feiras e caravanas pelo país. Assim que chegou, causou temor no clube a presença de policiais no centro de treinamento, em Tolousse. Eles o procuravam devido a um registro em radar de transitar em estrada próxima a mais de 200 km/h dirigindo um luxuoso Bentley.
Ainda com dias de clube, causou alvoroço no vestiário uma entrada desproporcional que deu em Fabinho, tirando o brasileiro mais cedo da atividade. Ele dizia a quem o questionava que jogo e treino, para ele, eram a mesma coisa. Irritado, o brasileiro respondeu a altura: “Eu falei olhando para ele que estava acostumado, mas que quando devolvesse ficaria nove meses na cama. Quando estava chegando no carro ele já estava no estacionamento me esperando para pedir desculpas”.
O atacante construiu já no Tolousse credenciais de atacante de respeito, como sonhou. Terminou a temporada 2008/2009 como artilheiro da Ligue 1, com 24 gols marcados em 38 jogos. A chegada ao Olympique de Marseille consolidou o atacante como referência no país, e rendeu as primeiras convocações.
“Assim que chegou, a torcida do Olympique pegou no pé dele, ele ficava louco com isso. Me chamava atenção que era sempre um dos primeiros a chegar no treino, nunca parava de trabalhar finalizações. Depois deslanchou, era o nome mais festejado pela torcida quando entrava em campo”, lembra o zagueiro Lucas Mendes, que atuou no clube com Gignac, atualmente no Al-Wakrah, do Catar.
“Quando estava, ele jogava pelas laterais do campo. Estava com mais dificuldades, mas jogávamos juntos e tivemos bons momentos. Era um jogador de muita qualidade técnica e extremamente determinado”, relata o ex-atacante Brandão, também ex-companheiro em Marselha.
Gignac demorou a brilhar no clube nas primeiras temporadas. Voltou a melhor fase com a chegada de Marcelo Bielsa. Em alta após temporadas em Marselha – havia terminado a última delas como vice-artilheiro do francês, com 21 gols, a frente de Ibrahimovic e Cavani – e com uma série de propostas em mãos, uma delas era do West Ham, da Inglaterra, surpreendeu ao anunciar o acordo com o Tigres, do México.
“A gente estava há seis meses atrás dele. Quando ele veio a Cancún [de férias], a gente pediu para conversar com ele. Apresentamos o projeto, explicamos qual era a intenção, e ele aceitou”, contou à época o técnico brasileiro do clube Ricardo “Tuca” Ferretti.
Gignac chegou para ser o jogador de maior investimento da história da liga mexicana, com contrato pago por empresa ligada ao clube e salários de 4 milhões de dólares anuais (pouco mais de R$ 13 milhões à época). Os motivos da contratação passaram a ser constantemente questionados. “Os críticos que vão a m…”, respondeu o empresário francês Jean-Christopher Cano.
“Ninguém esperava isso, tinha muito mercado. Fazer isso foi a cara dele, mas pegou todos de surpresa. Sabíamos que estava em fim de contrato e que tinha muito mercado, muitas opções, ele nos falava algumas equipes. Então, causou surpresa, mas não nos surpreende pelo profissionalismo ter se tornado um ídolo”, explica Lucas.
O sim ao Tigres foi, também, o não aos brasileiros. “O Boca me contatou. Nunca na vida eu imaginei que o clube de Maradona e Riquelme pudesse me chamar. O Boca, a Bombonera! Também tive um contato do Flamengo, um dos times com mais torcida no mundo, Maracanã… Estamos falando de clubes lendários. Mas eu não pensei muito”, disse Gignac ao L’Equipe, em 2019.
Em 2018, Fabinho, então auxiliar técnico do Corinthians, aprovou Gignac como um dos nomes levantados pelo clube para repor a recente saída de Jô para o Nagoya Grampus, do Japão. Informado sobre a condição salarial de Gignac no clube mexicano, os brasileiros preferiram recuar. Meses depois, apostou no argentino Mauro Boselli, então destaque do León.
No Tigres, a escolha exótica e até inexplicável de Gignac foi construída com números avassaladores. Conquistou três títulos nacionais e a taça inédita da Liga dos Campeões da Concacaf, em 2020, competição que encerrou como melhor jogador e artilheiro, com seis gols.
Na chegada ao Mundial, já fez do Ulsan Hyundai a sua mais recente vítima. Após ver a equipe ser surpreendida e iniciar perdendo, comandou a virada por 2 a 1 com dois gols, chegando a 146 pela equipe, condição que alarga os números de maior goleador da história do clube. Contra o Palmeiras, se brilhar, seguirá surpreendendo e poderá fechar uma história improvável como sonhou.