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Justiça suíça anula condenação de Cuca em caso de estupro

Julgamento à revelia e prescrição levaram Tribunal Regional de Berna-Mittelland a anular o caso; técnico não foi inocentado no mérito

A Justiça da Suíça anulou o processo que condenou o técnico Alexi Stival, o Cuca, por abuso sexual contra uma menor de idade, em 1987, durante uma excursão do Grêmio ao país europeu. A informação foi publicada nesta quarta-feira, 3, pelo jornal Folha de S.Paulo

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Segundo a publicação, a juíza Bettina Bochseler, do Tribunal Regional de Berna-Mittelland, acatou a a argumentação da defesa do treinador de que o técnico foi condenado à revelia e que poderia ter um novo julgamento.

Como o crime já estava prescrito, o Ministério Público local sugeriu a anulação da pena e a extinção do processo. A decisão, apesar de favorável ao treinador, não inocenta Cuca.

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“Houve anulação da sentença, prescrição do processo (por isso não houve novo julgamento) e indenização ao Cuca de 13.000 francos suíços (75.000 reais pela cotação atual) pelos erros do processo”, disse a assessoria do treinador.

A reportagem ainda explica que o valor foi baixado para 9.500 francos (55.200 reais) após o desconto de custos processuais do caso julgado em 15 de agosto de 1989. A Folha informou também que as novas investigações levaram a uma novidade: Sandra Pfaffli, a suíça que acusou Cuca de estupro quando tinha 13 anos, morreu 15 anos depois. A Justiça, então, localizou um herdeiro, que não quis se envolver no caso.

Especulado em novembro como alvo do Botafogo para o cargo de treinador em meio a disputa do Brasileirão, pouco antes da contratação de Tiago Nunes, Cuca afirmou na ocasião, à PLACAR, que não cogitava um retorno ao futebol devido a não resolução do caso de Berna.

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O caso voltou à tona na apresentação de Cuca como novo treinador do Corinthians, em 20 de abril de 2023. A passagem foi conturbada e durou apenas sete dias, com o treinador anunciando sua saída pouco depois da classificação contra o Remo, pela Copa do Brasil.

O escândalo de Berna

Em 1987, o então jovem atacante do Grêmio e mais três colegas, Eduardo, Fernando e Henrique, foram detidos em Berna, na Suíça, acusados de terem tido relações sexuais com Sandra Pfaffli, uma adolescente de 13 anos, na concentração do clube gaúcho, que excursionava pela Europa. Um mês e meio depois, o quarteto acabaria liberado para retornar ao Brasil; dois anos depois, os atletas foram condenados à revelia a 15 meses de detenção, mas jamais cumpriram a pena, que prescreveu, pois o Brasil não extradita seus cidadãos.

Um dos envolvidos no escândalo, o zagueiro Henrique, inclusive, chegou a defender o próprio Corinthians entre 1992 e 1997, e conquistou dois Campeonatos Paulistas e uma Copa do Brasil pelo Timão.

Nas raras vezes em que falou sobre o tema, Cuca sempre se disse inocente. “É uma coisa que eu tenho uma lembrança muito vaga, até porque não houve nada. Não houve estupro como falam, como dizem as coisas. Houve uma condenação por ter uma menor adentrado o quarto. Simplesmente isso. Não houve abuso sexual, [não houve] tentativa de abuso ou coisa assim…”, afirmou Cuca ao blog da jornalista Marília Ruiz, no Uol, em 2021.

O blog #TBT PLACAR lembrou dias depois como foi a cobertura do caso pela revista na ocasião.

O escândalo de Berna nas páginas de PLACAR

A primeira vez que a história ganhou as páginas de PLACAR foi na edição 898, de agosto de 1987. Intitulada “O escândalo de Berna”, a reportagem assinada por Álvaro Almeida, Roberto José da Silva e Carlos Orietti, dizia que “estes quatro rapazes tidos como de boa reputação, jovens promessas do Grêmio tricampeão gaúcho, passaram rapidamente do banco de reservas para o banco de réus.”

“Na sexta-feira retrasada, dia 31, eles foram detidos em Berna, capital da Suíça, sob a acusação de prática de violência sexual contra uma menina chamada Sandra, de 13 anos, que esteve no apartamento número 204 do Hotel Metropol, ocupado pelo goleiro Eduardo, 20 anos, e o quarto-zagueiro Henrique, 21. A garota — cujo nome completo não foi revelado pela polícia de Berna — contou na delegacia que fora até o hotel atrás de emblemas, camisas e flâmulas do time gaúcho. Lá dentro, porém, encontrou também o ponta Femando, 22 anos, e o meia Cuca, 24 — emprestado pelo Juventude e que não fizera sequer sua estreia no Grêmio”, prossegue o texto.

“Depois da prisão dos acusados, ela reconheceu apenas Eduardo, conhecido também como Chico, e Henrique — a dupla que mais tarde, diante do juiz-instrutor Jurg Blaser, confessou ter cometido o estupro contra a menor”. A matéria cita que “Eduardo e Henrique — os mais implicados — permaneciam num presídio de Berna, enquanto Cuca foi levado para a cidade de Burgdorf, a 22 km da capital.”

A reportagem diz que o então presidente da Fifa, o brasileiro João Havelange tentou interceder, mas não conseguiu evitar a prisão do quarteto. Os advogados de defesa da vítima diziam que “dois jogadores se revezavam no ato sexual enquanto outros dois seguravam a menina à força.” A reportagem ressaltou que Cuca e Fernando não foram reconhecidos pela garota, o que poderia facilitar-lhes uma libertação sob fiança. Rejane Stival, que já era esposa de Cuca, então com 19 anos, contou a PLACAR que acreditava na inocência do marido. “Conheço bem o homem que tenho.”

Reportagem sobre o caso Cuca em 1987
Reportagem sobre o caso Cuca em 1987

Em nova reportagem, na semana seguinte, PLACAR destacou o retorno do Grêmio da excursão europeia, sem os quatro atletas. “Detidos depois do jogo de estreia em Bema — 2 x 1 sobre o Benfica —, os quatro aguardam o final da fase de instrução do processo. Irritado com a lentidão da Justiça, o advogado do Grêmio que acompanha o caso, Luís Carlos Silveira Martins, pediu a substituição do severo juiz Júrg Blaser. O resultado foi um novo período de incomunicabilidade para os jogadores.”

Lemyr Martins visitou o presídio onde Cuca permaneceu em Berna
Lemyr Martins visitou o presídio onde Cuca permaneceu em Berna

Na edição de 24 de agosto de 1987, o fotógrafo e repórter Lemyr Martins visitou AmthausBern, “uma espécie de cárcere e fórum ao mesmo tempo”, localizado no centro de Berna, e narrou o “drama dos prisioneiros”, que encaravam a “fase inicial de um rigoroso processo e correm o risco de uma pena de dois a vinte anos de prisão.”

De acordo com a reportagem, Henrique e Eduardo, viviam “momentos de incerteza e desespero”, em um cubículo e sem direito a uso de rádio, televisão ou qualquer tipo de lazer. “Eles não têm direito sequer a banhos de sol”, narrou Lemyr. Martins  Sobre Cuca, escreveu que “tem uma ampla biblioteca a seu dispor, mas não poder ler: as obras são em alemão. De sua cela de paredes de pedra, ele se comunica por gestos com o guarda que o vigia. Ninguém mais aparece por ali. Possui, no entanto, aparelhos de rádio e televisão. ‘Assisti à vitória de Nélson Piquet na Hungria’, contou a seus advogados. O jogador não se conforma com a idade de Sandra. ‘Fiquei com a impressão de que ela tinha 18 anos’, revelou.”

A matéria cita que a situação mais tranquila era a de Fernando, que estava detido em outra penitênciaria, pois “seria o único do grupo a se manter afastado da garota”. “Cuca e Eduardo teriam induzido Sandra à relação sexual, e Henrique ao sexo oral — durante os 30 minutos em que permaneceram trancados no apartamento”.

À PLACAR, o volante China, do Grêmio, disse ter visto a jovem entrar no quarto dos atletas e sair “bem alegrona”. “Qualquer homem dificilmente resistiria a uma mulher bonita que invadisse seu quarto e tirasse a roupa”, afirmou China na ocasião.

Em 19 de outubro de 1987, Cuca e seus colegas falaram sobre o caso
Em 19 de outubro de 1987, Cuca e seus colegas falaram sobre o caso

Três meses depois do ocorrido, Cuca e os outros três envolvidos, falaram à PLACAR na edição de outubro de 1987. A reportagem de título “Trauma e lição do escândalo”, assinada por Divino Fonseca, revela como os jogadores, de volta ao Brasil depois de 45 dias presos na Suíça, lutavam “para afastar as sequelas deixadas pelo espírito de Berna”.

Cuca, então com 24 anos à época, foi o primeiro a ser citado na reportagem. “Depois da partida contra o Vasco, o ponta-de-lança Cuca descansava na banheira do Grêmio. Relaxado, deu uma ligeira cochilada. Quando abriu os olhos, percebeu que os colegas não estavam mais ali. Veio-lhe um pavor. Saiu rapidamente da banheira e correu para o vestiártio onde havia gente”, começa a matéria. O texto se refere a Cuca como “sensível” e diz que o jogador revelou ter ficado com trauma semelhante ao de um menino com medo de escuro.

Na sequência, o texto diz que Cuca assim que chegou ao Brasil viajou logo à Curitiba para dar explicação à esposa, Rejane, e aos pais dela. “O paranaense é aquele que, por temperamento, mais se angustia com as lembranças de Berna”, diz o texto, já o atacante afirmou: “Eu ficava imaginando que conclusão minha mulher poderia tirar de tudo. E eu a amo muito”, constatou o jogador.

A matéria aponta ainda que, segundo o advogado que o Grêmio enviou para tratar do caso na Suíça, “Cuca de fato era o que mais se revoltava, muitas vezes chegando às lágrimas. Pelo menos até agora, os adversários estão respeitando o drama. Em campo, não apareceu nenhum catimbeiro fazendo referência à história”, apontou a reportagem.

Em seguida, o texto diz que os jogadores não corriam perigo na Justiça suíça, uma vez que se o processo em Berna pudesse condená-los, eles deixariam de cumprir a pena. O único detalhe que os fazia lembrar mensalmente do caso, diz a matéria, eram os 400 mil cruzados que deviam ao Grêmio pelos gastos com o advogado.

Cuca, do Grêmio, durante jogo contra o Palmeiras, pela Copa União de 1988
Cuca, do Grêmio, durante jogo contra o Palmeiras, pela Copa União de 1988

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