Publicidade
Publicidade

Desejo de férias e insatisfação com Caboclo: a crise instalada na seleção

Tite estava animado com retomada do trabalho, mas foi surpreendido com vinda da Copa América para o Brasil, revolta de atletas e confusões na CBF

Líder isolada das Eliminatórias, atual campeã continental, sem grandes desfalques no elenco… a seleção brasileira tinha motivos de sobra para viver um ambiente de tranquilidade, mas o que ocorre na concentração da equipe em Porto Alegre, onde nesta sexta-feira, 4, o Brasil encara o Equador, é um cenário de absoluto caos. Como o próprio técnico Tite admitiu na controversa entrevista coletiva na véspera, há grande insatisfação no elenco em relação à mudança da Copa América para o país, o que já foi repassado à direção da CBF; que, por sua vez, também enfrenta problemas internos, que respingam diretamente no trabalho de campo.

Publicidade

Assine a revista digital no app por apenas R$ 8,90/mês

Atletas e comissão não aprovaram a mudança de última hora, depois que Colômbia e Argentina, sedes originais do torneio, desistiram de recebê-lo devido a tensões sociais e altas taxas de Covid-19 (ambos problemas que o Brasil também enfrenta). Sobretudo entre aqueles que atuam na Europa, há a percepção de que se trata de uma irresponsabilidade desnecessária, visto que o torneio tem pouca relevância (será disputado pela quarta vez em seis anos). Em contato com membros de outras seleções, exaustos devido às mudanças no calendário provocadas pela pandemia e descontentes com a decisão dos cartolas, os atletas manifestaram o desejo de tirar férias após os jogos das Eliminatórias. O tema agora está na já atolada de problemas mesa do presidente Rogério Caboclo.

Assine a revista digital no app por apenas R$ 8,90/mês

Tite confirmou na véspera que tanto ele e o diretor de seleções Juninho Paulista quanto os atletas tiveram reuniões com Caboclo, e que o conteúdo delas seriam revelado em “momento oportuno”, ou seja, na próxima terça-feira, após jogo contra o Paraguai, em Assunção, pelas Eliminatórias. A princípio, Neymar, Thiago Silva, Marquinhos, Alisson e Casemiro foram os atletas que se posicionaram contrários a participar do torneio. Depois, o desejo foi confirmado por todo o elenco à comissão técnica, que, a julgar pelas palavras de Tite, concorda.

Publicidade

“Temos uma opinião muito clara e fomos lealmente, numa sequência cronológica, eu e Juninho, externando ao presidente qual a nossa opinião. Depois, pedimos aos atletas para focarem apenas no jogo contra o Equador. Na sequência, solicitaram uma conversa direta ao presidente. Foi uma conversa muito clara, direta. A partir daí, a posição dos atletas também ficou clara. Temos uma posição, mas não vamos externar isso agora. Temos uma prioridade agora de jogar bem e ganhar o jogo contra o Equador. Entendemos que depois dessa Data Fifa, as situações vão ficar claras”, disse. 

A partir daí, o ambiente que já era de blindagem (desde que o Brasil foi confirmado como sede, na segunda-feira, a CBF vetou a realização de entrevistas coletivas na Granja Comary, em Teresópolis), ficou ainda mais restrito. Alguns atletas e o técnico Tite desligaram os celulares ou pararam de atender até mesmo seus familiares e assessores. A pandemia ajudou, pois o acesso ao hotel a capital gaúcha é bastante controlado.

Apesar de o acordo que trouxe a Copa América ao Brasil ter sido costurado pela CBF com o governo de Jair Bolsonaro, a insatisfação dos atletas não representa uma crítica direta à postura do presidente da República (muitos, aliás, são apoiadores do capitão). Na verdade, elenco e comissão estão mais insatisfeitos com a maneira como Rogério Caboclo tem tomado suas decisões, sem consultar aqueles que, de fato, sofrem com o calendário e se colocam em risco em meio à pandemia. Eles souberam via imprensa que a competição seria jogada no país e não gostaram de ter de responder por uma medida essencialmente política, enquanto os reais responsáveis se calavam.

Publicidade
Continua após a publicidade

O mandatário da CBF enfrenta ambiente extremamente conturbado. Acusado de manter um comportamento autoritário e incompatível com a posição, Caboclo tem fugido dos microfones. Nesta sexta, o site Globoesporte.com revelou o que já se esperava nos corredores da CBF: uma funcionária acusou Caboclo de assédio moral e sexual, deixando o mandatário ainda mais pressionado.

Há, no entanto, entre os cartolas a percepção de que os jogadores estão usando a Copa América como pretexto político para antecipar as férias. De acordo com o jornalista brasileiro Fernando Kallas, do diário espanhol As, Caboclo chegou a ameaçar o coordenador Juninho Paulista de demissão por não conseguir controlar o “motim”.

Nos bastidores, discute-se a hipótese de os atletas que atuam na Europa pedirem dispensa e Tite contar apenas com os jogadores de clubes brasileiros. Se isso ocorrer, a relação de Caboclo com os dirigentes nacionais, que já é ruim, tende a piorar ainda mais, pois não está prevista paralisação no Campeonato Brasileiro durante o mês da Copa América.

Tite estava animado após longo período de reclusão

As novas polêmicas representaram um grande baque para o treinador gaúcho de 60 anos, que relatou a pessoas próximas a sua satisfação por voltar ao trabalho após seis meses longe dos gramados. Os últimos anos foram de tristeza. O maior abalo veio com a morte da mãe, dona Ivone, em 2019. Desde então, Tite nunca mais foi a Caxias do Sul (RS), onde vivem os irmãos, pois acredita que a volta à casa da família lhe traria lembranças ruins.

O nascimento dos netos, filhos de seu auxiliar Matheus Bachi, deu novo impulso à vida pessoal do treinador. Porém, a chegada da pandemia novamente entristeceu o técnico, que passou meses recluso com a esposa no Rio, quase sem ver as crianças, pois desde o início Tite se mostrou bastante temeroso em relação ao vírus. O fato de ter sido vacinado e a retomada das atividades da seleção encheram o técnico de ânimo. Ele chegou a confidenciar a familiares a sua empolgação por voltar a trabalhar e iniciar a reta final de preparação para a Copa do Catar.

No entanto, o ambiente na CBF foi desanimador. Primeiro, teve de lidar com uma nova denúncia de assédio sexual de seu principal jogador, Neymar. Depois, viu de perto o quanto os problemas de relacionamento com Caboclo afetam seu ambiente. O treinador mantinha, até então, relação cordial com o mandatário. Tanto que não se opôs, ainda que sem grande convicção, ao desejo da CBF de contratar o espanhol Xavi Hernández ou Muricy Ramalho como seus auxiliares (ambos rejeitaram o convite).

Os novos acontecimentos, porém, podem colocar o treinador, bastante querido pelo grupo de atletas, em rota de colisão com os dirigentes. Ao longo de sua carreira, Tite colecionou saídas de clubes devido a desavenças com cartolas, alegando intromissões em seu trabalho. Foi assim no Corinthians (chegou a discutir com o chefe da investidora MSI, Kia Joorabchian, no vestiário do Morumbi), no Palmeiras (bateu boca publicamente com o diretor Salvador Ugo Palaia), entre outros casos. Tite se apresentou com a cabeça fixa no hexa, mas o cenário agora é de grande turbulência.

O Brasil encara o Equador nesta sexta e o Paraguai na próxima terça-feira, 8. Em seguida, tem data marcada para a abertura da Copa América, dia 13, diante da Venezuela, às 18 horas, no estádio Mané Garrincha, em Brasília.

Continua após a publicidade

Publicidade