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Capitão, ídolo da Lusa e do ‘futebol raiz’: ‘Felipe Melo faz meu estilo’

Aos 51 anos, ex-volante lamenta drama no Canindé e relembra carreira marcada por garra em campo. E garante: seu nome, Oleúde, não tem nada a ver com cinema

Quem acompanhou o futebol brasileiro na década de 90 dificilmente não se lembra de Oleúde José Ribeiro, o popular Capitão, eterno camisa 5 da Portuguesa. Num período de enorme proliferação de craques, como Raí, Rivaldo, Djalminha e Marcelinho Carioca, o volante do Canindé ganhou fama justamente por sua capacidade de parar os rivais com uma marcação firme e incansável. Foram 11 anos de dedicação à Lusa, que neste período se acostumou a desafiar os grandes do país e por muito pouco não foi campeã brasileira em 1996. O semblante fechado, o estilo totalmente alheio a firulas e o nome de batismo incomum também ajudaram a eternizá-lo no folclore do futebol brasileiro. Aos 51 anos, vivendo tranquilamente com a família em Mauá, região metropolitana de São Paulo, Capitão se diverte com a fama de símbolo do “futebol raiz”. E lamenta profundamente a atual situação da Lusa, que agoniza financeiramente, fora de todas as divisões do Brasileirão.

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Capitão é o jogador que mais vezes vestiu a camisa da Lusa (496) e foi peça-chave no último período de façanhas da equipe, que contou ainda com nomes de destaque como Dener, Zé Roberto, Rodrigo Fabri, Alex Alves e Leandro Amaral. “Na minha época, a Lusa chegou a ser o segundo time de todos os torcedores do Brasil”, conta o ex-jogador, que ainda passou por São Paulo, Grêmio e Verdy Kawasaki (clubes pelos quais conquistou os troféus que lhe escaparam no Canindé), entre outros até se aposentar em 2004. Nascido na cidade mineira de Conselheiro Pena, Oleúde cresceu no Paraná e permaneceu em São Paulo após o fim da carreira. Se aventurou como treinador e dirigente – trabalhou na própria Lusa, São Bernardo e Água Santa, nas categorias de base. Hoje vive com a esposa e os quatro filhos, apenas administrando os investimentos que fez nos tempos de atleta. E segue suando a camisa em peladas com os amigos, sem jamais abandonar o estilo “raiz”.

Na entrevista abaixo, Capitão relembra as glórias da carreira, o adversário mais difícil de marcar, aponta quem mais se assemelha a seu estilo e explica a origem do nome Oleúde e do apelido Capitão:

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Como o atleta que mais vezes vestiu a camisa da Portuguesa analisa a situação do clube atualmente? O momento é muito delicado, as últimas administrações não tiveram êxito e a Portuguesa foi caindo, caindo, até ficar sem divisão no Brasileiro. Para um time que foi vice-campeão nacional é bem difícil, joguei 11 anos lá e fico triste. Além disso, há muitos jogadores e funcionários desempregados, os torcedores e a colônia portuguesa estão tristes. Creio que ela conseguirá voltar para a Série A um dia, mas para isso tem de investir.

O senhor tem noção do que ocorreu em 2013, no rebaixamento por causa de uma escalação irregular? Não. Quando eu jogava, essas liberações eram todas por fax e não acontecia isso. Hoje é tudo on-line, é fácil saber quem está em condições ou não. É um erro grotesco, até porque, se o Héverton jogasse ou não, não faria diferença nenhuma, a Portuguesa não corria risco de cair. É tudo muito estranho, mas eu não tenho ideia do que aconteceu.  

Capitão em partida válida pelo Campeonato Brasileiro de 1996 Alexandre Battibugli/Placar/Dedoc

Muita gente lembra do senhor como um símbolo do ‘futebol raiz’. Gosta desta marca? Gosto, claro, é sinal de que fiz uma história e as pessoas se lembram de mim com saudade. Realmente, aquele futebol que jogávamos está em escassez. O futebol mudou muito e não foi para melhor.

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Algum jogador da atualidade tem estilo semelhante ao seu? Da minha característica, que era a mesma da do Dunga, Mauro Silva, só vejo hoje o Felipe Melo, do Palmeiras. Ele deveria estar na seleção brasileira. Às vezes ele excede um pouco, parte para a briga, mas é quem mais se aproxima do meu estilo em termos de raça, vontade. O Corinthians do Fábio Carille também tinha essa característica, um time de pegada, mas realmente está em falta. 

O que acha dos jogadores de hoje, cheio de tatuagens, chuteira colorida…? Como pai, não gostaria de ver meus quatro filhos tatuando o corpo, mas vai de cada um. Os jogadores podem colocar tatuagem no rosto, no pescoço, mas têm de jogar bola também. O mesmo acontece com a chuteira, pode usar a cor que for, mas vai ter de jogar muito. Na minha época já havia chuteiras brancas, quem começou com isso foram Serginho Chulapa e Viola.

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O senhor já usou chuteira colorida? Não. Uma vez, eu ganhei uma branca de um patrocinador e brinquei de colocar na semifinal do Brasileirão contra o Atlético-MG, mas o treinador (Candinho) falou: “Você, Capitão? Nem pensar!” (risos). Sempre usei chuteira preta, acho que quanto mais discreto, melhor. O Messi, por exemplo, é o maior craque do mundo e é discreto, apesar de agora também estar todo tatuado.

Quem era sua referência na posição? Me inspirei no Toninho Cerezo, que corria o tempo todo, dificilmente andava em campo, e por isso estava sempre bem colocado para fazer um desarme. Esse era meu segredo, o que eu tento passar para os jovens. Os detalhes fazem a diferença, treinar um pouco mais, raciocinar rápido, notar qual jogador adversário arma o time, estudar seus pontos fracos, orientar os companheiros…

Capitão, ao lado de Raí, pelo São Paulo Arquivo Histórico/SPFC/Divulgação

O senhor ficou marcado por ‘anular’ grandes craques em campo. Qual deles te deu mais trabalho? Sim, tive boas atuações contra Zico, Palhinha, Neto, Marcelinho Carioca, Giovanni… Acho que o Raí foi o mais difícil de marcar, porque ele era grande, habilidoso, inteligente, dava no máximo dois toques na bola, abria os braços, protegia. Eu tinha de ter estratégia, tentava antecipar, tirar a bola por baixo, porque no corpo quase sempre ele ganhava. Tive o privilégio de jogar ao lado dele no São Paulo, quando fomos campeões do Paulistão de 1998.

E qual era o segredo da sua vitalidade em campo? Eu sempre me alimentei bem. O segredo é comer frutas, tomar suco natural, faço isso até hoje. E dormir bem, eu procurava descansar, por isso tive poucas lesões e jogo futebol até hoje, aos 51 anos. Sempre participo de eventos de seleções de masters e o futebol de segunda-feira é sagrado. E hoje é mais fácil, tudo melhorou, campo, chuteira, bola… O Pelé faria uns 4.000 gols hoje. O gramado da Vila Belmiro, por exemplo, era uma lama, era difícil. Hoje os gramados parecem uma mesa de sinuca, a bola rola.

O calendário também era mais cruel? Claro. No Grêmio, teve uma semana em que eu joguei na quarta-feira, na quinta e no domingo, imagina, dois dias seguidos com 33 anos de idade! Para nós era importante jogar todo jogo, porque precisávamos do “bicho” (premiação por partida.) Hoje os jogadores já têm muito dinheiro, por isso ficam reclamando.

Qual foi o seu melhor treinador? Tive vários, mas o melhor foi o Antônio Lopes, o “Delegado”. Em 1989, ele já fazia na Lusa o que o Guardiola fez no Barcelona. O time saía jogando desde a defesa, dava gosto de ver.

O apelido Capitão tem a ver com sua liderança em campo? Não. Por coincidência, acabei sempre sendo capitão dos clubes por onde passei, mas na verdade é porque eu fui criado em uma cidade chamada Capitão Leônidas Marques, no Paraná. E os repórteres sempre sofriam para escrever o meu nome de verdade, então acabou pegando o nome da cidade.

Mas, afinal, seu nome, Oleúde, é ou não inspirado em Hollywood? Não, não, foi só uma ideia brilhante dos meus pais mesmo (risos). Queira ou não, essa história sempre me ajudou, chamava atenção dos repórteres… o falecido Luciano do Valle sempre pedia para os ouvintes adivinharem meu nome, dizendo que era a capital do cinema, repercutiu muito na época. Isso de Hollywood virou lenda, mas não tem nada a ver.

Capitão nas arquibancadas do Estádio Municipal Pedro Benedetti, em Mauá (SP) Heitor Feitosa/VEJA.com
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