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Ricardinho: ‘Sou fã do Falcão, do Ronaldinho… e do Corinthians’

Melhor jogador de futsal do mundo e ‘herdeiro’ de Falcão, ala português revela influências e paixões brasileiras

Ele fala português, tem ginga, uma habilidade impressionante na perna esquerda e é o rei do futsal. Não, não se trata do brasileiro Falcão, mas de um de seus grandes fãs: o português Ricardinho, 32 anos, que em 2017 foi eleito o melhor jogador de futsal do mundo pela quarta vez. No início do ano passado, sua fama se multiplicou graças a uma jogada espetacular: atuando pela seleção portuguesa, Ricardinho fez malabarismo, aplicou um chapéu em um defensor da Sérvia e disparou para o gol. “Quando cheguei ao hotel, olhei minhas redes sociais e tomei um susto. O futsal deu uma volta ao mundo nesse dia”, contou o camisa 10, que tem mais de 500.000 seguidores em seu perfil no Instagram.

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Revelado pelo Benfica, seu time do coração, Ricardinho joga desde 2013 pelo Inter Movistar, da Espanha, a maior potência do futsal mundial. O craque de 1,65 metro atuou em clubes da Rússia e do Japão e em todos eles teve companheiros e amigos do Brasil. No futebol de campo, é fã dos Ronaldos – nem tanto do compatriota Cristiano, mas dos brasileiros, Fenômeno e Gaúcho. Quem mais o influenciou, no entanto, foi mesmo Falcão, uma admiração marcada na pele. “Fiz uma tatuagem com seu nome e não tenho vergonha. Posso ser o melhor do mundo, mas Falcão é o maior da história”.

Dentre as várias paixões brasileiras de Ricardinho, uma nasceu no Japão. “Sou do bando de loucos, gosto do Corinthians“, contou o jogador, que em 2012 atuava no Nagoya Oceans e foi ao estádio de Yokohama assistir à vitória corintiana sobre o Chelsea no Mundial. Ele chegou a negociar com o time de futsal do Corinthians – “infelizmente não deu certo” – e sonha em um dia atuar na liga brasileira. A seguir,  entrevista exclusiva com o melhor jogador de futsal do mundo.

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Você tem um estilo de jogo semelhante ao dos craques brasileiros. O Brasil o influenciou de alguma forma? Relacionam muito meu jogo ao dos brasileiros pela ginga, os dribles rápidos. Vi muitos vídeos de Falcão, Manoel Tobias, Marquinhos, Schumacher, tive várias referências. E sempre joguei com craques brasileiros, grandes companheiros que me ajudam a estar entre os melhores. Mas minha grande inspiração foi sempre o Falcão.

Você tem uma tatuagem do Falcão na perna, algo que ele próprio diz tratar como um ‘troféu’. Sim, e ele falar isso também é um troféu para mim. Falo sempre desta homenagem que fiz e não tenho vergonha, ele é meu ídolo, minha referência, a pessoa com quem eu mais aprendi e ainda aprendo. Por mais que muitas pessoas digam que eu sou o melhor do mundo, e isso me deixa muito agradecido, para mim o Falcão sempre será o melhor da história. Hoje tenho a sorte de ser seu amigo, sempre falamos por WhatsApp.

Ano passado, vocês dois promoveram uma grande festa no Castelão, em Fortaleza, um jogo de futsal num estádio de futebol. Como foi o evento? E suas outras passagens pelo Brasil? Já estive algumas vezes no Brasil, fui de férias ao Rio de Janeiro e a Porto de Galinhas, também disputei o Mundial de 2008, no Rio e em Brasília. A partida num estádio de futebol maravilhoso, cheio de torcida, contra o Brasil, foi uma das coisas mais bonitas que pude viver. E, claro, dividir a quadra com o Falcão foi algo histórico, deixamos a marca dos nossos pés no estádio, foi um grande reconhecimento do meu trabalho.

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Português Ricardinho e brasileiro Falcão durante treino em Fortaleza
Ricardinho e Falcão durante treino em Fortaleza Zerosa Filho/CBFS/Divulgação

Acompanha a liga brasileira? Assisto bastante, sei que este ano há surpresas com as equipes favoritas sendo eliminadas, como o Sorocaba do Falcão. Tenho muitos amigos aí no Brasil, Valdin, Xuxa, sigo vários jogadores.

Já pensou em atuar no Brasil? Já tive algumas propostas, infelizmente não chegamos a um acordo. Seria um sonho jogar no Brasil. Tem um time que gosto muito, o Corinthians. Tivemos perto de fechar um acordo há uns três anos, mas infelizmente não deu certo.

Você torce pelo Corinthians? Em Portugal sou torcedor do Benfica, mas gosto muito do Corinthians. Brinco aqui com amigos palmeirenses, sempre fui muito fã do Corinthians. Também segui um pouco o Santos de Neymar e Ganso, mas sou do “bando de loucos”, mano! Conheço bem, estive no Mundial de Clubes no Japão, assisti ao jogo, o gol do peruano, Guerrero, festejei muito aquele dia.

O time do Falcão também o procurou esse ano, não? Sim, ele falou comigo, estivemos juntos num evento nos Estados Unidos, falamos sobre essa possibilidade, até porque o Falcão já prepara a aposentadoria, infelizmente. Esse dia será muito triste para o nosso esporte. Mas, graças a Deus, ele ainda consegue mostrar sua arte aos mais jovens. Seria lindo jogar com ele, mas sei que é difícil, porque hoje estou no melhor time do mundo, numa liga competitiva, e os espanhóis querem me segurar por muito tempo ainda (risos).

Ano passado, seu gol contra a Sérvia foi um sucesso mundial. Foi uma jogada treinada? Então, eu conheço um jogador de futsal freestyle holandês, Issy Hitman, que veio fazer um teste no meu clube. Ele viu minha habilidade, que sou até meio ‘descarado’, abusado, e me deu dicas sobre essa jogada, que poderia rodar o mundo. Mas não planejei, não pensei que ia acontecer num jogo de Europeu, contra o time da casa. Já tinha tentado num jogo, mas para passar a bola, não para driblar. Mas naquele dia apareceu a oportunidade, usei como drible e tinha de terminar em gol para dar tudo certo.

Na hora você já percebeu como foi bonito o gol? Não. Lembro que perdemos esse jogo, estávamos chateados, mas vários companheiros me cumprimentaram no vestiário, disseram que nunca tinham visto um gol assim. Mas não tinha noção. No hotel, fui ver minhas redes sociais e tomei um susto. Liguei a TV e estava passando o gol num canal da Sérvia. Aí pensei: ‘P**** acho que fiz algo de outro mundo!’ Lembro que tinha 100.000 seguidores e passei para 350.000 nesse dia, minha página no Facebook teve mais de 1 milhão de curtidas, acho que esse dia mudou um pouco o futsal.

Você diz que tem estilo um pouco ‘descarado’. Já apanhou muito dos marcadores?  Infelizmente, aprendi a dosar meu estilo de uma maneira triste. No início de carreira, fazia muita brincadeira e me lembro que, aos 17 anos, fui pré-convocado para um Europeu. Num  amistoso fiz umas graças que o adversário não gostou. Ele quebrou minha perna, fraturei a tíbia e fiquei cinco meses sem jogar. Isso mudou um pouco meu jeito de jogar. Lembro que conversei com o brasileiro Marquinho, perguntei como eu deveria fazer para as pessoas me respeitarem e entenderem que esse era meu estilo, que gosto de dar dribles. Ele falou: ‘Jogue assim sempre, ganhando ou perdendo, que as pessoas vão te respeitar.’ E foi assim, hoje os adversários sabem que eu não faço nada para humilhar.

Você tentou jogar futebol de campo ou sempre se dedicou ao futsal? Joguei quando era mais jovem, mas falavam que eu era muito pequeno (risos). E quando eu tinha 22 anos e já me destaca no futsal do Benfica, o treinador do campo, Fernando Santos, que hoje é treinador da seleção portuguesa e foi campeão da Euro-2016, me chamou para testes, mas queria que fosse às escondidas, porque o time não tinha ganhado a liga e contratar um jogador do futsal poderia soar como menosprezo ao elenco. Mas a imprensa descobriu, ficou em cima, e o Benfica achou melhor dar um passo atrás e me manter no futsal.

Jogava em qual posição no campo? Como 10 mesmo, atrás dos atacantes, ou como ponta, porque era o melhor local para driblar. Eu joguei futebol dos seis aos 14 anos, joguei no Porto, mas lá o treinador disse que queria jogadores mais altos. O Falcão chegou mais perto de ser jogador de campo, sei que o treinador do São Paulo o atrapalhou um pouco, mas acho que eu e ele estávamos destinados mesmo a jogar futsal.

E quais eram seus ídolos no futebol? Sempre fui fã do Ronaldinho Gaúcho, um jogador como eu, que sempre joga com alegria, ganhando ou perdendo ele se diverte e diverte os torcedores. E também sempre fui fã do Ronaldo Fenômeno, o “gordinho”. Hoje tenho amizade com o Ronaldo, ele está sempre na Espanha, estamos tentando fazer negócios juntos. Ele também surgiu do futsal e sempre fala muito bem do nosso esporte.

O Ronaldinho está jogando torneios de futsal pelo mundo agora… Sim, ele também está ajudando muito o futsal a crescer e mostrando que ainda tem muito talento na quadra. 

Ricardinho
Éder Lima, brasileiro naturalizado russo, Ricardinho e Falcão posam com seus prêmios na Copa do Mundo de Futsal da Fifa, em Cali, na Colômbia Ian MacNicol/FIFA/Getty Images

Como Portugal conseguiu ter o melhor jogador do mundo no futsal, no futebol e até no beach soccer (Madjer)? É uma questão de geração, mas o povo português se esforçou muito. A aposta da federação no desenvolvimento do esporte, masculino e feminino, foi muito forte. Lembro que os jogadores de futsal vinham todos do campo, eram aqueles que não davam certo. Hoje já vemos moleques com seis, sete anos jogando futsal como primeira escolha. A aposta no futsal está sendo maior na Europa toda.

Mas ainda há poucas estrelas internacionais do futsal além de você e do Falcão. Por que surgem tão poucos ídolos? Acho que nem todos os jogadores têm esse perfil de querer chegar mais longe. O Falcão tem mais de 40 anos e não apareceu ainda um substituto com a personalidade e o carisma dele no Brasil. No futebol é bem mais fácil, eles vivem outro mundo, têm tudo na mão. No futsal, temos de ir atrás dos patrocinadores e o Falcão e eu temos esse carisma, essa personalidade. Fazemos ações por conta própria, vamos a escolas dar palestras, promover o esporte e poucos jogadores se interessam por isso. Foi assim que eu cresci, eu queria ser o melhor, olhava o Falcão e queria ser tão bom quanto ele. Eu mesmo vou atrás das empresas e digo: ‘Olha, eu sou o melhor do meu esporte e quero representar sua marca, vamos negociar?’ Batalho sempre pelo meu esporte, quero que a Fifa e a Uefa nos olhem diferente e sobretudo que o esporte se torne olímpico.

Incomoda ver esportes como ‘basquete 3 x 3’ incluídos na Olimpíada e o futsal não? Claro. Desculpe a palavra, mas é f*** ver que todo ano o COI inclui esportes inventados, com muito menos história que o futsal, e nós nunca temos essa chance. Nossa batalha é para espalhar o futsal em todo o mundo e já foi ótimo ver seleções como Ilhas Salomão, Angola, Austrália, Irã e outras disputando torneios. Eu e o Falcão fomos aos Estados Unidos, Índia e estamos batalhando para que chegue também à Alemanha, França, aos países que efetivamente mandam, que têm dinheiro. Assim teremos mais condições de lutar pelo futsal.

É a favor da jogadores naturalizados nas seleções? Fico um pouco no meio da balança. Hoje, na minha seleção, eu seria contra, apesar de não ter nada contra estrangeiros, muito pelo contrário, sou amigo e fã de vários. Mas, entenda, nós estamos tentando investir na base, dar uma boa oportunidade para os garotos, e aí vamos tirar a oportunidade de um português para dar a um estrangeiro? Eu entendo que seleções como Azerbaijão precisem chamar estrangeiros para aumentar a qualidade e o interesse no futsal desses países. Até porque um país como o Brasil poderia formar várias seleções, não há espaço para tanto jogador bom num time só. Mas países como Espanha e Itália não precisariam disso. Teve ano que a Itália tinha 12 brasileiros. Adoro os estrangeiros, mas acho que deveria haver um limite.

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