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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

Há 55 anos: a receita de Pelé para o tri, na edição número 1 de PLACAR

Na edição inaugural, de 20 de março de 1970, o Rei do Futebol cobrava humildade do estrelado time que, meses depois, conquistaria a Jules Rimet no México; leia na íntegra

Quem passasse por uma banca de jornais do país há exatos 55 anos, em 20 de março de 1970 com NCr$ 1,00 (um cruzeiro novo) no bolso poderia adquirir um produto que se tornaria relíquia, um desejado item de colecionador entre os amantes de futebol e jornalismo. Com Pelé como destaque de uma chamada de capa otimista – “a receita para ganhar a Copa” –, nascia a maior e mais tradicional revista esportiva do Brasil e uma das mais cultuadas do mundo.

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Em sua edição número 1, PLACAR oferecia um tesouro em forma de brinde: uma moeda com a efígie do Rei do Futebol, esculpida pelo artista romeno Ilie Gilbert. Além de histórica, a edição se mostraria certeira e pé quente, já que, meses depois, Pelé e aquela inigualável geração ergueriam o tri no México.

Pelé na edição número 1 de PLACAR, de 20 de março de 1970
Pelé na edição número 1 de PLACAR, de 20 de março de 1970

Na reportagem escrita por Michel Laurence, com fotos de Lemyr Martins e Agência JB, Pelé, que vinha de dois títulos nas Copas de 1958 e 1962, e da frustrante eliminação na primeira fase em 1966, deixou uma sábia reflexão:

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“Quando a gente pensa que já ganhou, o corpo parece ficar mole. Acho que um time que tenha humildade e seja organizado pode nos dar a Copa pela terceira vez.”

Naquele momento, a seleção ainda era treinada por João Saldanha, que seria substituídos semanas depois por Zagallo, e o time ainda vivia a expectativa pelo possível retorno ao time de Tostão, que se recuperava de uma cirurgia no olho. “Tostão está bom e vai voltar a jogar como antes”, apostou o Rei, novamente certeiro.

No dia em que a revista completa 55 anos de história, o blog #TBT PLACAR, que todas as quintas recupera um tesouro de nossos arquivos, reproduz na íntegra o texto com a receita de Pelé para o tri.

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Pelé na edição número 1 de PLACAR, de 20 de março de 1970
Pelé na edição número 1 de PLACAR, de 20 de março de 1970

 

VAMOS GANHAR, SÓ NOS FALTA HUMILDADE

PELÉ SABE COMO NÓS PODEMOS VENCER COPA, POR QUE PERDEMOS DA ARGENTINA E ATÉ QUEM DEVERÁ SUBSTITUIR TOSTÃO

Reportagem de Michel Laurence – Fotos de Lemyr Martins e Agência JB

Dentro de dois meses, ele estará no centro do campo do Estádio Jalisco, em Guadalajara, esperando o toque na bola do centroavante da Seleção (tomara que seja Tostão), para começar sua quarta Copa do Mundo e tentar ser o único jogador da história a ganhar a Taça Jules Rimet pela terceira vez.

– Como é o negócio? A Copa fica definitivamente com a gente ou seria preciso ganhar três vezes seguidas?

O adversário do primeiro jogo (3 de junho) será a Tchecoslováquia um time de uniforme branco como o primeiro adversário do Brasil na Copa de 66, a Bulgária (o Brasil ganhou de 2 a 0.

– Provavelmente, como em todas as Copas, não me darão tempo sequer para dominar a bola. Vou ter que fazer as jogadas, pelo menos nos 30 minutos iniciais, sempre de primeira.

No segundo jogo da Copa de 66, o Brasil perdeu de 3 a 1 para a Hungria.

– O Brasil melhorou muito, mas ainda precisa melhorar mais, muito mais. Ainda existem falhas (eu deixo para Saldanha comentá-las). Sabe, no Brasil futebol é coisa muito difícil. Todos entendem um pouco ou muito.

No terceiro jogo da Copa de 66, o Brasil perdeu de 3 a 1 para Portugal e foi desclassificado nas oitavas de final.

A GRANDE DERROTA

– O Brasil se preparou muito bem para as eliminatórias deste ano. Fez um trabalho sério e o resultado foi que ganhamos quase com facilidade. Para a Copa do Mundo precisamos fazer a mesma coisa. Mas para isso precisamos da colaboração de todo mundo. A imprensa precisa apoiar o nosso trabalho e evitar que simples mal-entendidos se transformem em grandes crises.

Em 66, o Brasil era considerado o favorito, como hoje. Dizem que perdemos a Copa por causa de um exagerado e prejudicial otimismo.

– Olha, gente, a nossa grande arma desta Copa tem que ser a humildade. Sem humildade não adianta nada. Sabe por quê? Um time humilde não treme diante da responsabilidade. Esse time sabe que vai ter de lutar muito para ganhar o jogo. E lutará. Todos unidos pela humildade. E time unido e humilde ganha algo que não sei definir muito bem. Mas sei de uma coi- sa: era o que o Brasil tinha em 58 e 62. Quando a gente não acredita muito, sempre procura fazer mais força, talvez até mais do que o necessário. Quando a gente pensa que já ganhou, o corpo parece ficar mole. Acho que um time que tenha humildade e seja organizado pode nos dar a Copa pela terceira vez.

O Brasil não precisou disputar as eliminatórias de 66. Era o bicampeão do mundo, time respeitado e famoso, talvez o tri naquele ano.

– Durante as eliminatórias deste ano duvidavam um pouco do nosso time e isso foi parecido com 58. Naquela Copa também saímos do Brasil bastante desacreditados. Por isso gostaria que agora o otimismo se transformasse em respeito ao adversário. Repito, a Seleção só precisa disso: humildade e organização. Na Copa vamos precisar estar melhor ainda, os adversários são mais duros. E num mundial os times jogam com muito mais raça do que em uma partida eliminatória.

Quando o Brasil chegou à Inglaterra, o número 9 da Seleção, o companheiro de Pelé no ataque, era apenas uma esperança. Poderia ser Silva, como Alcindo, talvez até Tostão. Mas Tostão naquele ano era garoto mineiro, desconhecido, que tinha chegado à Seleção mas as razões eram pouco conhecidas. Naquele ano não houve tempo para ninguém provar que poderia ser o companheiro ideal do rei.

DIRCEU É TOSTÃO?

– Não há mais dúvida: Tostão está bom e vai voltar a jogar como antes. Há um único problema: ele conseguirá ter condições físicas até a Copa? Se conseguir, tudo ficará melhor, porque com ele o time já está treinado. Mas se Tostão não jogar, o Dirceu vai resolver o problema. Vocês precisam saber de uma coisa: Dirceu Lopes é craque. Ainda não acertou porque nós precisamos treinar, precisamos jogar juntos. Vocês precisam entender também que com o Dirceu no time as coisas mudam um pouco: eu tenho que ocupar a posição de Tostão e o Dirceu tem de ocupar a posição que era minha. E eu não estou acostumado, como ele também não. Mas tudo é uma questão de treino. Já disse que Dirceu é craque, e craque joga em qualquer posição, em qualquer lugar.

A derrota de 66 foi considerada sob vários ângulos: falta de organização, falta de defesa, falta de centroavante, falta de treino. Foram convocados 44 jogadores, em cada treino entrava em campo um time titular diferente.

A PRIMEIRA DERROTA
Quando falo que é preciso treinar, quero mostrar a diferença que existe entre a Seleção Brasileira e as europeias. Elas não jogam quando não estão preparadas. E nós jogamos. Jogamos com a Argentina e iríamos jogar com a Itália, União Soviética e Bulgária, se aceitassem o nosso convite. Eles responderam que não tinham datas. Talvez isso não seja verdade, talvez eles achassem que não estavam preparados para jogar com a gente. Nós somos diferentes: pegamos onze jogadores, treinamos três dias e entramos em campo. Foi por isso que perdemos o primeiro jogo para a Argentina.

Tudo que aconteceu em 66 não vai se repetir este ano, não é, Pelé?
-É.  Este ano nós vamos ganhar, com humildade.

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