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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

Há 36 anos, Brasil chegou perto do ouro com Taffarel e Romário

Repleta de grandes estrelas em ascensão, seleção brasileira parou na União Soviética e amargou medalha de "prata que teve gosto de lata" em Seul

Os Jogos Olímpicos de Paris já estão a todo vapor. Na última quarta-feira, 24, o futebol masculino, modalidade na qual o Brasil não se classificou, marcou o primeiro dia de competições junto do Rugby Seven. Nesta quinta-feira, 25, outros esportes começam a ser disputados, com direito à estreia da seleção brasileira de futebol feminino, que vai à França sonhando com o ouro inédito.

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Na mesma situação que as meninas do Brasil atualmente, estava o time masculino nos Jogos de Seul-1988 – e assim permaneceu até enfim conquistar o ouro na Rio-2016. Na ocasião, a equipe chegou à Coréia do Sul com favoritismo e muita esperança. Jogou bem e montou uma base que daria frutos à seleção adulta, especialmente no tetra em 1994, mas parou na União Soviética na final.

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Em uma época sem restrições do sub-23, mas com a regra de que apenas atletas que nunca tivessem disputado uma Copa do Mundo podiam ser convocados, a seleção desembarcou badalada. Partindo do gol, que tinha Taffarel, passando pela lateral, que tinha Jorginho, e chegando ao setor ofensivo, que tinha Geovani, Neto, Romário e Bebeto.

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O time repleto de craques atropelou Iugoslávia, Austrália e Nigéria na fase de grupos, passou pela Argentina nas quartas e eliminou a Alemanha Ocidental nas semifinais, nos pênaltis, com brilho de Taffarel. A campanha era perfeita, mas terminou em decepção após derrota na final, quando o time treinado por Carlos Alberto Silva sucumbiu para a União Soviética e adiou o sonho olímpico.

Em clima de Jogos, PLACAR relembrou a repercussão negativa da derrota brasileira em Seul na edição 957 de nossa revista, de outubro de 1988. O blog #TBT, que todas as quintas-feiras recupera um tesouro de nossos arquivos, reproduz, na íntegra, a reportagem de Marcelo Duarte:

A prata que teve gosto de lata

Acreditando firmemente na conquista do ouro olímpico, a seleção brasileira de futebol acha o vice de sabor ruim

Por Marcelo Duarte, de Seul

Sábado, Main Stadium, em Seul. O silêncio, as cabeças baixas, as lágrimas e os rostos decepcionados até faziam pensar que a seleção brasileira de futebol havia sido desclassificada ainda nas oitavas de final do Torneio Olímpico, depois de perder para um timeco qualquer, como o de Uganda ou da Mongólia, por sonoros e vergonhosos 5 x 0. Para aquele grupo de jogadores, o que acontecera minutos antes no gramado era realmente quase isso.

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Nem parecia que estavam com a medalha de prata no pescoço e que foram derrotados pela União Soviética – medalha de ouro pela segunda vez na história dos Jogos (a primeira conquista soviética ocorreu nas Olimpíadas de Melbourne, Austrália, em 1956). “O segundo lugar não vale nada”. O lateral-direito Jorginho resumia assim o sentimento geral de frustração. “A torcida e nós mesmos não aceitamos este vice.”

De fato, após a vitória sobre a sempre perigosa Alemanha Ocidental (que ficou com a medalha de bronze ao derrotar a Itália por 3 x 0), na terça-feira anterior, a confiança no ouro cresceu demais, tanto na Vila Olímpica, em Seul, quanto no Brasil. Naquela noite, o goleiro Taffarel defendera três pênaltis, viu um quarto bater em sua trave direita e saiu de campo eleito merecidamente o herói do jogo.

Delegação brasileira cabisbaixa com a prata em Seul – Pedro Martinelli / PLACAR

Sábado, porém, não conseguiu evitar que o soviético Dobrovolski empatasse a partida numa cobrança de penalidade máxima cometida de modo bobo pelo volante Andrade, aos 17 minutos do segundo tempo. Também nada pôde fazer quando o atacante Savitchev passou com facilidade pelo zagueiro André Cruz e chegou livre, leve e solto dentro da área. O goleirão saiu da meta mas acabou sendo encoberto. Taffarel só conseguiu evitar mesmo é que os russos marcassem mais um.

Quando o juiz francês Gérard Biguet encerrou a partida, alguns jogadores não seguraram a emoção. O meia Geovani, que não jogou por estar cumprindo suspensão automática devido a dois cartões amarelos recebidos, chorou no ombro do companheiro Romário. Além dele, o volante Ademir também ficou de fora pelo mesmo motivo. Os dois assistiram à derrota do banco, ao lado dos quatro reservas (eram apenas quatro com condições de jogo) e do lateral-esquerdo Nelsinho. que levava uma bandeira com a frase “FORÇA BRASIL”.

Não há dúvida de que Geovani e Ademir fizeram muita falta ao time na decisão. “Ninguém pode dizer que não foi um trabalho bem-feito”, desafiou o meio-campista vascaíno mais tarde. E ele tinha razão: o trabalho dentro de campo foi realmente bem-feito. O mesmo, no entanto, não poderia ser dito sobre a imaturidade que causou tanto o cartão dele quanto o de Ademir e sobre a competência dos dirigentes fora de campo

Na hora da entrega das medalhas, Geovani foi buscar o técnico Carlos Alberto Silva para cima do pódio. Como o Brasil trouxe só dezoito atletas e as medalhas eram vinte, o cortado Nelsinho e o preparador Bebeto de Oliveira, a pedido do próprio Carlos Alberto, foram receber as suas. Depois de ter colocado a medalha no pescoço, porém, o preparador físico chamou o capitão Geovani e explicou que se alguém merecia ficar com aquela prata era o treinador e não ele. Pediu então ao jogador que fosse entregá-la a Carlos Alberto. Foi um momento que comoveu todos os brasileiros.

Neto, à época no Guarani, representou o Brasil nos Jogos de 1988 – Pedro Martinelli / PLACAR

Um dos poucos atletas que se mostrava orgulhoso com a conquista do vice campeonato olímpico era o meio-campista Milton, que segue agora para o Como, da Itália. “O Brasil foi um gigante”, avaliava. “Queria colocar a medalha de ouro no pescoço do meu filho Iago – veja só, um nome russo – quando chegasse ao Rio de Janeiro. Mas vou botar agora a de prata com o mesmo sentimento de dever cumprido.” Já o centroavante Romário, que com o gol marcado contra os soviéticos somou sete e terminou a competição como artilheiro, com um tento a mais que o russo Igor Dobrovolski e o zambiano Kalusha Bwalya, não se mostrava tão satisfeito. “Terminar como artilheiro não me serve de consolo”. disparava. “Preferia ter terminado com o ouro.”

A torcida coreana fez o que pôde para ajudar. Torceu o tempo todo pelos brasileiros. Para ganhar este apoio, os jogadores entraram em campo com uma bandeira da Coréia do Sul. Só não foram avisados de que os norte-americanos fizeram a mesma coisa, na fase preliminar, contra os mesmos soviéticos, e acabaram apanhando de 4 x 2.

O público da final foi de 73.657 pessoas, o maior de todos os 32 jogos de futebol realizados no Torneio Olímpico. Com isso, os organizadores calculam que o público geral tenha sido de 742 000 pessoas – metade dos 1 422 000 registrados em Los Angeles, em 1984. De qualquer modo, não deixa de ser uma excelente marca num país em que existem apenas cinco equipes de futebol profissional e a média de torcedores por partida no campeonato local é de 300 pagantes.

“Só peço que o povo brasileiro tenha compreensão com estes jogadores”, pedia o técnico Carlos Alberto Silva. “Eu também não fiquei satisfeito com a medalha de prata. Trabalhamos duro durante noventa dias para trazer o ouro, mas não deu. Sei que, para o Brasil, pouco importa o tal espírito olímpico. O importante mesmo era ganhar.”

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