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#TBT Placar ícone blog #TBT Placar Toda quinta-feira, um tesouro dos arquivos de nossas cinco décadas de história

‘É para você, palhaço’… Fotos e bastidores do bimundial do São Paulo em PLACAR

Há 30 anos, o Tricolor bateu o Milan por 3 a 2 em Tóquio e manteve-se no topo do mundo; neste fim de semana, lendas se reencontram no Morumbi

Os torcedores do São Paulo vivem uma semana nostálgica. No próximo sábado, 16, o clube reunirá seus veteranos para uma partida contra as lendas do Milan, no Morumbi, numa reedição da final do Mundial Interclubes de 1993. Há 30 anos, em 12 de dezembro de 1993, o Tricolor bateu a equipe italiana por 3 a 2, no Estádio Nacional de Tóquio. No evento “Reencontro de Gigantes”, o São Paulo terá reforços de peso, como Kaká e também Raí, maior referência da equipe na década de 90, mas que não disputou a final contra o Milan, pois já estava vendido ao PSG.

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Apesar de não ter contado com seu camisa 10, o São Paulo não se intimidou diante do Milan, como mostram imagens e textos da época. Na Edição dos Campeões de 1993, lançada em janeiro de 1994, PLACAR destacou o clima desfavorável para os brasileiros em relação à final do ano anterior, uma vitória sobre o Barcelona com show de Raí. Ainda assim, com uma atuação brilhante do veterano Toninho Cerezo e um gol espírita de Muller (com dedicatória especial para Costacurta), o São Paulo faturou o bi no Japão.

O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas-feiras recupera tesouro de nossos 53 anos de arquivos, reproduz o texto e as imagens daquela edição histórica, abaixo:

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O SENHOR DO PLANETA

O timaço do técnico Telê foi de novo a Tóquio, desta vez para vencer o Milan, numa partida que deslumbrou o mundo

Para realizar a façanha do bi o São Paulo procurou repetir como num ritual toda a programação de viagem ao Japão em 1992. “Não se trata de superstição”, explicava o diretor de futebol Fernando Casal de Rey. “Mas se deu certo no ano passado porque não repetir a dose?” No programa o mesmo hotel, o mesmo campo de treinamento – o do Tokyo Gaz. a 60 km do centro de Tóquio – e a até a mesma quantidade de carne bovina na bagagem (80 kg) para o bife de cada um de seus craques. Por isso, os dirigentes tricolores não gostaram de saber que o ônibus utilizado em 1992 seria trocado por outros dois menores. Casal de Rey irritou-se com o fato. “Aquele era mais confortável”, justificava.

A situação do São Paulo na realidade era toda ela bem menos confortável do que 1992. Nos treinamentos, o lateral-esquerdo André se contundiu e chegou a ser dúvida para a partida. Parecia um mau presságio. Ainda mais delicada era a situação de Telê, que mal podia trabalhar devido ao assédio dos jornalistas japoneses, ansiosos por saber se o técnico aceitaria o convite para dirigir a seleção japonesa. “Fiz uma proposta muito alta justamente para que recusassem”, explica o treinador que pediu salários de 200 000 dólares e ganhou a primeira página dos dos principais jornais nipónicos. Para complicar ainda mais, a torcida japonesa que em 1992 apoiou maciçamente o tricolor contra o Barcelona desta vez queria ver o Milan levantar a taça. Na loja CYD, especializada em artigos de futebol, por exemplo, a camisa do time italiano vendia três vezes mais do que a do São Paulo. Pelo uniforme rubro-negro, os japoneses pagavam a bagatela de 80 dólares, e sem arregalar os olhos.

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Jogadores do Sâo Paulo Futebol Clube, comemorando gol contra o Milan, no Campeonato Mundial de Interclubes. – Nico Esteves/PLACAR

Apesar do clima desfavorável, o Tricolor, intrépido, acreditava piamente no título. “A derrota para o Palmeiras nas semifinais do Brasileirão não nos abalou”, dizia o meia Leonardo. “E ficamos ainda mais motivados quando o Parreira convocou 8 jogadores do clube para a seleção”. Mas em Tóquio não só os jogadores são-paulinos confiavam na vitória – outros craques também apostavam num bom desempenho dos brasileiros. Era o caso de Zico. “O São Paulo vem subindo de produção, enquanto o Milan está em uma fase”,  comparava o galinho, hoje na equipe japonesa do Kashima Antlers. “Há estrangeiros demais disputando vagas e o ambiente não é bom. Dinheiro em excesso também pode prejudicar”.

em pé, Zetti, Dinho, Ronaldão, Cafu, Leonardo e Toninho Cerezo; agachados, Muller, Doriva, Válber, Palhinha e André, durante a final contra o Milan – Nico Esteves/PLACAR

O atacante Alcindo – companheiro de time de Zico, o maior ídolo do Soccer japonês, que recebe royalties por 42 produtos comercializados com seu nome e dá aulas de futebol para o Inter para uma inacreditável classe de 8500 pessoas – era mais irônico. “O Milan hoje tem mais intérprete do que jogador”, brincava. Os próprios jornalistas italianos confirmavam que vários jogadores do bicampeão italiano e campeão mundial em 1969, 1989 e 1990 vivem às turras uns com os outros.Mas era Toninho Cerezo quem tocava na questão principal. “O Milan não só perdeu os seus craques holandeses como perdeu também o fator surpresa”, analisava no hall do hotel antes da partida. “Hoje todo mundo sabe como o time joga, até mesmo os japoneses. “O Fluggels, a minha equipe, atua no mesmo esquema do Milan”, contava o meia Edu Marangon, ex Palmeiras e Santos.

Ainda assim o Milan que os telespectadores de 161 países viram ao vivo foi um timaço. Com toque de bola fluente e rápido, comandado pelo habitualmente reserva Massaro, a equipe italiana chegou a dominar o São Paulo em boa parte do jogo. Mas o tricolor tinha a garra de Ronaldo, a habilidade de Leonardo (que o jornal italiano chegou a comparar a do pintor da Vinci), a explosão de Cafu, a juventude de André, recuperado em tempo hábil para o jogo, a inteligência de Palhinha e, principalmente, a experiência de Toninho Cerezo. Foi ele o grande nome do jogo e os japoneses souberam reconhecer ao premiá-lo com um automóvel Toyota Celica. Quando começou a atuar como profissional no Atlético Mineiro em 1971, muitos de seus atuais companheiros de elenco como André, Juninho, Gilmar, Jura, Guilherme e Catê nem sequer tinham nascido.  Pois foi ele, aos 38 anos, o grande comandante do time. “O velhinho é bicampeão”, berrava o veterano craque, tão logo terminou a partida.

Cafu do São Paulo x Baresi do Milan, final do Campeonato Mundial Interclubres de 1993. - Nico Esteves/PLACAR
Cafu do São Paulo x Baresi do Milan, final do Campeonato Mundial Interclubres de 1993. – Nico Esteves/PLACAR

Dos 3 gols são-paulinos, ele só não participou diretamente do primeiro. Mesmo assim foi ele quem, como a virada de jogo perfeita para André, livre na esquerda, deu início a jogada do gol. De André a bola chegou a Cafu, que fez o passe açucarado para Palhinha abrir o placar aos 19 minutos, quando o Milan era todo pressão. Massaro empatou a partida aos 3 do segundo tempo, mas Cerezo voltou a tranquilizar o time onze minutos depois, ao colocar o São Paulo de novo na frente do marcador, completando uma inspirada jogada de Leonardo. O Milan empatou mais uma vez com uma cabeçada do francês Papin, aos 36 minutos. A maioria do público superior a 50 000 pessoas já se preparava para a prorrogação quando incansável Toninho fez um passe longo para Muller, aos 43 minutos. O líbero Franco Baresi e o goleiro Rossi se atrapalharam e a bola bateu no calcanhar de Muller que, de letra, fez o gol do bicampeonato.

De letra também tirou a insinuação de que o lance teria sido absolutamente casual. “Sem querer ou não, foi o gol do título”,, resumia ao ver a bola dentro das redes. Muller surpreendentemente não saiu de imediato para a comemoração. Preferiu caminhar até o zagueiro Costacurta, velho desafeto desde os tempos em que o brasileiro defendia o Torino, para desafiá-lo no idioma de Dante. “Eesse gol é para você, seu palhaço”, provocou, o dedo em riste, atônito. Costacurta não chegou a esboçar reação. Com a alma lavada, Muller desabafava no vestiário onde o champanhe começava a borbulhar. “Eles pensam que são os maiorais, mas provamos que somos melhores do que o Milan.” Na realidade, os valentes e heroicos jogadores do São Paulo provaram que formam no momento um dos melhores times do mundo. “Soubemos marcar com determinação o ataque do Milan e sair com rapidez para o contra-ataque, surpreendendo o adversário”, analisava Telê Santana. Mas o Milan agora já é uma página virada no capítulo mais brilhante escrito por um clube brasileiro desde o Santos de Pelé.

Tonio Cerezzo do São Paulo, com o troféu de Campeão Mundial Interclubes, na chegada a São Paulo – Nico Esteves/PLACAR

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