Um dos mais influentes da história, treinador atravessou mudanças entre estilo do início no Barcelona e atualidade no Manchester City
Campeão 40 vezes como treinador, ídolo de Barcelona, Bayern de Munique e Manchester City e gigante a ponto de influenciar o estilo de futebol global, Pep Guardiola é uma das maiores figuras da história do jogo. Dominante e vitorioso, o catalão faz com que, independente de gostos pessoais, seja impossível negar que exista um esporte anterior e outro posterior ao sucesso do catalão.
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Meio-campista de sucesso pelo Barça nos anos 1990, Pep, hoje, é uma síntese de suas influências táticas da época. Como jogador, foi comandado em largo período por Johan Cruyff e Louis Van Gaal, dois grandes nomes do jogo de posição da escola holandesa-espanhola.
E, no fim de sua carreira, no mexicano Dorados de Sinaloa, encontrou Juanma Lillo, um dos grandes pensadores espanhóis do futebol. Lillo se tornou “guru tático” do treinador e, após trabalhos em clubes de menor expressão e passagens por comissões de Jorge Sampaoli, passou a compor o corpo técnico de Guardiola no Manchester City.
Guardiola segue no Manchester City mesmo depois de temporada irregular – Franck Fife/AFP
Dessa maneira, com diversas influências de interpretações distintas do Jogo de Posição, o treinador imprimiu sua leitura na primeira prateleira global. Então, com sucesso no Barcelona, no Bayern de Munique e no Manchester City, passou a ser referência e até “copiado” mundo afora.
No entanto, apesar de estarem sempre na mesma cultura de jogo, as ideias de Pep se transformaram. O Barcelona de 2009, por exemplo, não é igual ao Bayern de Munique de 2014, que também se difere do Manchester City de 2019, que também tem outra cara comparado ao de 2023.
Assim, PLACAR esmiuçou as táticas de Pep Guardiola, para elencar a sua trajetória durante a carreira. Confira;
Qualquer debate futebolístico que se preze já usou o termo “tiki-taka” para se referir ao Barcelona de Guardiola, vivido entre 2008 e 2012. O treinador, contudo, já disse repudiar esse rótulo, como conta seu livro Pep Confidencial.
Segundo a obra de Marti Perarnau, o catalão disse: “Eu odeio essa história de passar a bola por passar, esse tiki-taka. Não tem propósito. Você precisa passar a bola com uma intenção clara, com o objetivo de chegar ao gol adversário. Eu odeio o tiki-taka, é inútil”.
Barcelona de Guardiola usava 4-3-3 de meio técnico e falso 9
Ainda assim, com uso de passes curtos, posse para controlar e trabalho da bola por jogadores extremamente técnicos, aquele Barça ficou marcado pelos “toques”. Porém, não apenas por isso, mas por um 4-3-3 impulsionado pela utilização de Lionel Messi como “falso 9”, deslocando para as pontas até mesmo artilheiros dos calibres de Thierry Henry e Samuel Eto’o.
A construção se baseava em estrutura posicional mais fluida, distâncias curtas e liberdade situacional. Ainda com conceitos de ocupar espaços racionalmente e manipular defesas com controle de amplitude, a equipe constantemente girava Iniesta, Xavi e Messi, três figuras essenciais para entender o time que brilhou.
Outra característica era a centralização de um dos pontas, simultânea ao recuo do camisa 10, que, com carta branca para se movimentar, soube aproveitar as vantagens do Jogo de Posição “guardiolista” na Catalunha. Além disso, as funções dos laterais eram múltiplas, permitindo a eles construir por dentro em alguns momentos, enquanto em outros eles podiam ter função de aumentar a amplitude.
Barcelona com trio de meio-campo em V, Messi livre, lateral-esquerdo em amplitude, ponta-direita aberto e ponta-esquerda por dentro – Montagem sobre TNT Sports
Sylvinho, inicialmente, na primeira temporada, cumpria esse papel pela esquerda. Posteriormente, Eric Abidal e Jordi Alba ganharam espaço, enquanto a lateral-direita passou a ser consolidada por Daniel Alves, após variações que incluíram até Puyol.
Pep Guardiola desembarcou na Baviera para dirigir o campeão da Europa da temporada 2012/13. O que não faltava era essência vencedora de um elenco com craques como Arjen Robben e Franck Ribery.
Pep, que tinha o recente sucesso no Barcelona como principal carta, assumiu o Bayern depois de uma temporada sabática. Em outro contexto, em uma liga com outra cultura, o treinador precisou acertar alguns detalhes.
Exemplo disso foi que o seu 4-3-3 virou uma espécie de 4-1-4-1, com pontas na linha dos meias, ou um 3-2-4-1, formação que privilegiava a construção com laterais por dentro e jogadores abertos muito “pulsantes”.
Para se adaptar ao estilo de ataque e contra-ataque da Alemanha, Guardiola optou por uma base em 3-2, facilitando da saída de bola à pressão pós-perda. Essa formação impulsionou o crescimento de David Alaba, que passou de lateral-esquerdo para zagueiro construtor, enquanto o lateral-direito Phillip Lahm garantiu ainda mais alguns anos de alto nível, atuando na segunda linha de construção, como peça importante no equilíbrio daquele Bayern de Munique.
A presença de um centroavante de ofício foi um dos marcos do trabalho, muito também pela coexistência dessa função com Thomas Muller, ícone alemão marcado por característica bastante específica atuando na intermediária ofensiva. Inicialmente, Mandzukic cumpriu o papel de camisa 9, já Robert Lewandowski assumiu a posição em sequência, entregando dinâmicas de último terço diferentes das vistas nos tempos do guardiolismo no Camp Nou.
Circulados, jogadores centralizados pesavam o meio. Com seta, pontas abriam campo e eram armadilhas para jogadores de X1 – Montagem sobre TNT Sports
Com os três corredores centrais ocupados sempre por mais de seis jogadores de linha, Pep conseguiu potencializar seus pontas. Assim, os habilidosos e velozes Robben, Ribery e Douglas Costa brilharam, aproveitando muitas situações criadas de “um contra um” diante de marcadores sem cobertura bem postada.
Depois de dominar a nível nacional e fracassar na busca por uma Champions League, o espanhol trocou a Alemanha pela Inglaterra. A meta: consolidar o Manchester City como uma das potências globais, levando a equipe de investimento bilionário à conquista da Europa.
Guardiola chegou à Premier League em momento de crescimento global da liga. Hoje consolidada como uma marca que garante o status de “melhor campeonato do mundo”, a competição recebeu um treinador acostumado a vencer.
O sucesso, no entanto, não foi imediato. E essa adaptação relativamente ruidosa passou pela aplicação do modelo em um elenco acostumado anteriormente a jogar em um 4-2-3-1 nos moldes de Manuel Pellegrini.
Manchester City passou a usar o 4-3-3 após chegada de Pep Guardiola
O tradicional 4-3-3 foi imposto com perfeição após algumas contratações e adaptações. Exemplos foram as transformações de meio-campistas em laterais-esquerdos construtores, como ocorreu com Fabian Delph e depois com Oleksandr Zinchenko.
No trio de meio-campo, o acerto passou pela afirmação de Fernandinho como primeiro volante. O brasileiro interpretou conceitos de vantagens, “homem livre” e posicionamento sem bola, essenciais para todas as fases do jogo da equipe.
Da mesma forma, contou com a compreensão de peças como David Silva e Kevin De Bruyne a posições de meias-interiores. Técnicos, habilidosos e com ótima capacidade de passes, foram “camisas 10” que deram um passo para trás dentro de campo.
Meio-campo técnico, com laterais interiores, atraía marcação para pontas ficarem em boas condições – Montagem sobre Premier League
Guardiola, no início, atuou com dois pontas e um homem centralizado. Em alguns momentos, o setor era montado com Kun Aguero por dentro e Gabriel Jesus, Raheem Sterling ou Riyad Mahrez abertos, enquanto em outros o brasileiro assumia a posição central, entregando infiltração, ataque à última linha adversária e capacidade de pressionar sem bola.
Pep Guardiola já faz do período no Manchester City o trabalho mais longo de sua carreira. Isso, naturalmente, obrigou que mudanças fossem realizadas com “o carro andando”, como quando o catalão optou por encerrar o ciclo de Aguero, transformar Jesus em ponta e organizar uma equipe sem centroavantes, revivendo o “falso 9” dos anos de Barcelona.
Nessa ocasião, porém, Guardiola aprimorou também táticas que já haviam aparecido nos tempos de Bayern. Com dois pontas abertos, importantes para chegadas pelos lados para cruzamentos rasteiros em direção ao “funil”, o técnico elaborou um time que variava em 2-3 e 3-2 em construção inicial, a depender da posição do primeiro volante.
Manchester City vitorioso em 2023 atacava com base sólida, zagueiros-laterais por dentro e centroavante matador
Desse modo, os laterais sempre estiveram por dentro, na base da jogada. Assim, figuras como Kyle Walker, Zinchenko e João Cancelo (esse com grandes atribuições criativas) cresceram, beneficiando o jogo dos refinados De Bruyne, Bernardo Silva e Phill Foden, além do trunfo das infiltrações proporcionadas pelo polivalente Ilkay Gundogan.
Ainda assim, mesmo com grandes resultados na Premier League, a Champions League bateu na trave na temporada 2020/21. A solução, então, passou pela grande capacidade financeira do Manchester City, que foi ao mercado e fez o grande movimento de Erling Haaland, comprado junto ao Borussia Dortmund.
O norueguês, fenômeno físico e com faro de gol especial, foi um dos fatores decisivos para o sucesso. Simultaneamente, Guardiola viveu processo de se obcecar ainda mais pelo controle do jogo, conquistado ajustando posições na base da jogada, que beneficiaram um futebol de poucos riscos nos corredores centrais e defesa sustentada pela posse de bola.
O título da Champions League de 2022/23, coroando na Europa o trabalho, tem essas marcas como determinantes. O período no Manchester City já é o mais longo de sua carreira. Pep montou um time que se postava no ataque entre 2-3-5 e 3-2-4-1, com quatro zagueiros entre titulares — cumprindo funções antes atribuídas aos laterais interiores.
Estrutura de ataque do Manchester City na Champions League 2022/23 – Montagem sobre TNT Sports
John Stones, muito criticado em seu início de Manchester City, firmou-se como volante para construir. E o volante Rodri, mais uma das aquisições possibilitadas por grandes investimentos, virou a principal engrenagem de defesa e ataque, juntando proteção contra transições rivais e distribuição inicial para levar o jogo aos meias interiores, ao centroavante ou aos pontas.
Desde então, no entanto, o Manchester City perdeu as rédeas da Europa. E, mais recentemente, perdeu fôlego até mesmo da Inglaterra, o que obrigou mudanças no elenco e tentativas de uma nova reinvenção, que já obrigaram Guardiola a tentar variações, buscando menor exposição a riscos — o que, em grande parte das vezes, enrijeceu ainda mais a estrutura posicional, sem privilegiar a defesa.
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