Na NBA, todas as equipes já perceberam: o caminho até a vitória passa, invariavelmente, pelos arremessos de longe
Sim, o objetivo do basquete é (e sempre será) pôr a bola laranja dentro da cesta. Mas há incontáveis formas de fazê-lo. Desde a criação da modalidade, em 1891, a maneira mais eficaz de vencer era distribuir os jogadores mais altos da equipe o mais próximo possível do aro antes de tentar um arremesso, enquanto os de estatura mediana vinham de trás em impressionantes infiltrações. A tática funcionou, pelo menos para atrair a atenção dos apaixonados por esporte, que começaram a seguir, fascinados, os lances de lendas como Kareem Abdul-Jabbar, Larry Bird, Magic Johnson, Michael Jordan, Kobe Bryant e, mais recentemente, LeBron James. Essa realidade mudou drasticamente na última década, quando ganhou espaço na NBA, a principal liga de basquete do planeta, uma nova maneira de buscar a cesta: em vez dos tiros dentro da região dos 2 pontos, os jogadores passaram a arremessar incessantemente além da linha dos 3 pontos.
Um levantamento histórico destinado a comparar a temporada de 2001 e 2002 com a de 2019 e 2020 (veja o infográfico abaixo) mostra a evidente preferência pelas tentativas de 3 pontos, numa das mais espetaculares transformações da história do esporte. Um estudo estatístico mais aprofundado justifica a grande virada. O analista americano Kirk Goldsberry mostrou que os lances de 3 pontos oferecem uma média maior de pontos por tentativa (algo entre 1,05 e 1,20) que os arremessos mais próximos da cesta, que valem 2 (menos de 0,85 ponto por tentativa). Apenas as enterradas e os lances livres apresentam aproveitamento melhor. “O basquete da NBA de hoje é uma modalidade cerebral, embora as pessoas tenham a impressão de se tratar de uma ‘pelada’, uma correria em que os atletas saem arremessando de qualquer lado”, disse a VEJA o ex-pivô catarinense Tiago Splitter, campeão pelo San Antonio Spurs (o primeiro brasileiro a conseguir o feito) e atualmente assistente técnico do Brooklyn Nets. “Hoje a média da NBA mostra que um arremesso longo de 2 pontos, livre de marcação, é pior do que um chute contestado da linha de 3. Também não existem mais jogadas de pivô no poste baixo, a área mais próxima da cesta, por tratar-se de uma estratégia pouco efetiva.” Se há chance de arremesso lá de longe, e as chances têm aumentado exponencialmente, dada a movimentação em quadra, eis a saída prioritária, inescapável.
Ainda que essa tática seja mais eficaz, há quem alegue uma piora, digamos, estética do jogo. “Eu odeio (os arremessos de 3 pontos). Nunca vou aceitar. Acho que é algo de circo. Por que não um tiro de 5 pontos? Um de 7? Sou à moda antiga”, esbravejou o técnico Gregg Popovich, do San Antonio Spurs, em 2015. “Mas até certo ponto você tem de aceitar ou vai perder. O arremesso de 3 pontos é importante em nossas vitórias. É preciso saber fazê-lo.” A indignação de Popovich, um dos técnicos mais vitoriosos da liga, só deve aumentar em 2020, pois nunca as equipes “chutaram” (a tradução preferida dos boleiros ao anglicismo shoot) tanto de 3 pontos como na atual temporada — mesmo com o afastamento temporário, por contusão, de dois dos mestres desse estilo, os armadores Stephen Curry e Klay Thompson, do Golden State Warriors, símbolos desta nova era do basquete, aparentemente irrevogável.
Publicado em VEJA de 29 de janeiro de 2020, edição nº 2671
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