Os torcedores que não querem saber da “amarelinha”
Em geral identificados com a esquerda, eles rejeitam a camisa oficial da seleção brasileira por considerá-la um uniforme “#ForaDilma”
Há 65 anos, a seleção brasileira abandonou o uniforme branco e passou a ter o amarelo como a cor principal de sua camisa. Símbolo do patriotismo esportivo ao longo de décadas, a “amarelinha” passou a aparecer, nos últimos anos, fora do contexto futebolístico, no torso de manifestantes que foram às ruas protestar contra a corrupção, contra o PT e, mais especificamente, contra o governo Dilma Rousseff. Resultado: a tradicional “amarelinha” chega à Copa do Mundo da Rússia sob rejeição de parte dos torcedores, em geral identificados com a esquerda, para os quais a peça adquiriu um incômodo significado político.
O advogado e professor de história Felipe Magane está nesse time: enxerga no vestuário a imagem dos defensores do impeachment sofrido pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.
“Eu não vou vestir a camisa da seleção neste ano por não concordar com as manifestações pré e pós-impeachment. Sem conotações partidárias, eu sou advogado e discordo dos aspectos jurídicos daquele processo”, argumenta Magane. “Eu não quero ser confundido com quem foi para a Avenida Paulista defender o pato da Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, entidade que apoiou os protestos e tinha o bicho como mascote de campanha contra impostos]”.
E é também o caso da engenheira Júlia Fortes, contrária à saída de Dilma, processo que classifica como “golpe”. “Quando eu vejo aquela camisa, vem um sentimento ruim do golpe, de tudo o que aconteceu”, diz. “Eu sou uma pessoa de posição e eu não gostaria de ter a minha posição associada a essa elite, que usurpou a Presidência para a manutenção de privilégios.”
A Nike, fabricante da camisa oficial, diz em nota: “O uniforme brasileiro é como uma bandeira nacional, simboliza o país e seu povo. A Nike não interfere nos momentos e nas situações em que as pessoas usam o uniforme”.
O assunto vem se espalhando pelas redes sociais, ambiente no qual se multiplicam alternativas para quem deseja torcer para o grupo de Tite. Algumas delas: 1) adotar a camisa azul da Nike; 2) usar versões vintage da camisa amarela, se possível a da seleção de 1982, de craques como o politizado Sócrates; 3) apelar para versões “comunistas” da roupa.
Do terceiro grupo, a designer mineira Luísa dos Anjos Cardoso criou a versão mais ruidosa da peça: a “vermelhinha”. No Facebook, anunciou que o objetivo era torcer sem ser identificada como um “pato paneleiro”, em referência às panelas batidas durante discursos de Dilma na época do impeachment e à ave gigante inflável usada pela campanha da Fiesp. Ao lado do símbolo da Confederação Brasileira de Futebol, ela substituiu o logotipo da Nike por foice e martelo. Ao ser notificada pela CBF por uso indevido de marca, lançou a camisa com um brasão próprio no qual se lê apenas “Brasil” e adotou como marketing a frase: “A única censurada pela…”, sem usar a sigla. Custa 45 reais. A estética é soviética, mas a agilidade é capitalista.