Depois do papelão da final da Libertadores em Madri, entidade chegou ao fundo do poço no Brasil. Mas o que importa são os recordes de arredacação
Quando assumiu a presidência da Conmebol, em janeiro de 2016, com a entidade chafurdada no escândalo de corrupção da Fifa que prendeu diversos cartolas, o paraguaio Alejandro Domínguez prometeu iniciar uma nova era de conquistas e desenvolvimento do futebol sul-americano. Até o momento, porém, tudo não passou de perfumaria – como um logotipo mais moderno ou demonstrações de “transparência”, como se isso não fosse obrigação. E meses depois da vergonha que se tornou a final da Libertadores entre Boca e River, transferida para a Espanha (!) por problemas de violência, a imagem da “Nova Conmebol” conseguiu ficar ainda mais manchada na Copa América do Brasil.
Ingressos caros, estádios vazios, gramados péssimos, trânsito caótico e problemas de logística dos mais variados tipos… A falta de organização do torneio é tamanha que até mesmo os atletas, geralmente alienados, decidiram se posicionar. O melhor do mundo, Lionel Messi, disse que os campos são tão ruins que a “a bola parece um coelho”, de tanto que pula. O zagueiro Thiago Silva, da seleção brasileira, também foi duro. “Oferecer bons gramados era o mínimo que teria de ser feito para ter bons jogos. Também poderia ter um público maior e, para isso, o ingresso poderia ser um pouco mais barato”, afirmou, na Cidade do Galo, em Belo Horizonte, no sábado 29. Sim, um campo em boas condições era o básico, ainda mais num país que gastou bilhões com estádios para a Copa de 2014.
A desfaçatez de Domínguez e do Comitê Organizador deixa a situação ainda mais estarrecedora. Em entrevistas e comunicados oficiais, não há qualquer traço de autocrítica. Pior, houve até uma indecente exaltação aos recordes de bilheteria, quando a maior parte dos jogos teve público baixíssimo. A Conmebol nem sequer tenta disfarçar: o importante é seguir faturando, ainda que os clubes e seleções sul-americanos estejam cada vez mais enfraquecidos. Na Copa da Rússia, apenas seleções europeias chegaram à semifinal. No Mundial feminino deste ano, não houve uma seleção sul-americana sequer entre as oito melhores. Os europeus venceram todos os Mundiais de Clubes desde 2013 para cá. Nada disso importa a quem deveria importar.
Depois de criar uma edição do centenário em 2016, nos Estados Unidos – país que não integra a Conmebol – um ano depois da fraca edição de 2015, a entidade conseguiu encaixar uma nova Copa América para 2020, com sede dupla (Argentina e Colômbia), sem pausa no calendário do Brasileirão, com a desculpa rasa de que assim ajustará o torneio à Eurocopa, sendo disputado de quatro em quatro anos. Faria diferença esperar cinco e não quatro anos? Para os cofres da Conmebol, sim. Para chegar ao fundo do poço, falta pouco – talvez apenas conseguir levar a final da Libertadores para Miami, um sonho antigo de Domínguez. Por enquanto, ele conseguiu “apenas” estabelecer as finais em jogo único, em sedes pré-estabelecidas, com torcida sentada e bandeiras proibidas, sempre tendo a Europa como exemplo. A perda de identidade do futebol sul-americano é um caminho sem volta. E nos faz chegar a uma conclusão: a nova Conmebol pode gostar de tudo, menos de futebol.