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Humor debochado e respeito à história: a chegada do ‘professor’ Jesualdo

Uma espécie de “Sampaoli às avessas”, experiente treinador português do Santos usou simpatia como cartão de visitas na Vila Belmiro

“Vamos fazer um pacto de amigo? Todos já sabem minha idade, não precisamos ficar repetindo isso”, cravou o septuagenário português Jesualdo Ferreira, quebrando o gelo na sala de imprensa da Vila Belmiro nesta quarta-feira, 8. A apresentação do novo treinador do Santos (de 73 anos, desculpe!) deixou poucas pistas sobre o time que tentará repetir ou até superar o bom trabalho realizado em 2019 pelo também estrangeiro Jorge Sampaoli. Mas já mostrou que, ao menos no quesito personalidade, professor Jesualdo – estudioso do futebol, ele prefere a alcunha acadêmica ao termo “mister”, consagrado pelo amigo Jorge Jesus – tem pouquíssimo a ver com seu antecessor argentino. Houve, no entanto, uma notável semelhança: o respeito absoluto à história do “time de Pelé”.

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A mudança no ambiente se fez notar logo de cara. Se Sampaoli era fechado e sem a menor preocupação em parecer simpático com imprensa e diretoria (guardava seus raros sorrisos para o contato com torcedores, especialmente os mirins), Jesualdo divertiu a todos os presentes com um humor debochado, sobretudo o presidente José Carlos Peres, desafeto de Sampaoli, que sentou-se a seu lado. “Vocês preferem que eu fale primeiro ou já querem começar com as perguntas?”, iniciou o ex-treinador de Porto, Sporting, Benfica, Malaga (Espanha), Zamalek (Egito) e Al-Sadd (Catar), entre outros, num gesto até estranho de tão cortês.

Assim como fez o técnico argentino há um ano, Jesualdo exaltou o prazer em “treinar o clube do Pelé, um clube mítico”. E foi além. Um dia antes, Jesualdo teve um animado encontro com os ídolos do Santos da década de 60. Contou que assistiu ao show do time de Pelé, em Lisboa, na final do Mundial de 1962 e fez piadas com os ex-craques de sua faixa etária. “Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, com Zito por trás, foi a minha primeira referência. Entrar no Memorial do clube mexeu comigo”, repetiu nesta terça.

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Sem perder a classe, Jesualdo também marcou posição sobre as perguntas que não lhe agradaram. “Vamos falar de futebol, vai”, cravou, ao ser questionado sobre as finanças do clube, tema que provocou um destemperado desabafo do presidente José Carlos Peres. Rebateu com ironia a pergunta de uma repórter sobre sua simpatia. “Não está gostando não? Engraçado que em meu país dizem que sou antipático.” E, ainda nesta resposta, em tom professoral, marcou outra diferença em relação a Sampaoli: o tom apaziguador. “Nada se constrói contra ninguém. Se eu tenho uma equipe, não posso ir contra ela.” Também demonstrou preocupação em falar o português brasileiro ao trocar “balneário” por “vestiário”. Novamente em tom ácido, negou que estivesse aposentado. “Se estivesse, não estaria aqui, né?”

Antes de aceitar a proposta do Santos, Jesualdo estava trabalhando como comentarista, analisando detalhadamente o Flamengo do compatriota Jorge Jesus. Perguntado sobre suas semelhanças e diferenças em relação ao “Mister”, saiu driblando novamente. “Não tem nada a ver com meu estilo. Eu sou mais velho, ele tem mais cabelo. Somos amigos há muito tempo. Ele tem uma forma de ver o futebol parecida com a minha, mas, sinceramente, há detalhes que não são iguais.”

Também evitou qualquer tipo de rivalidade entre os treinadores estrangeiros e os brasileiros e exaltou a história de Otto Glória, na década de 60, e Luiz Felipe Scolari, no início dos anos 2000, no comando da seleção lusitana. “Tiveram muita importância no desenvolvimento do futebol português. Poderia citar outros, como Carlos Alberto Silva e Abel Braga. Aqui há grandes técnicos como Renato e Vanderlei Luxemburgo.”

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Experiente, Jesualdo recorreu ao assessor do clube quando se viu diante de situações espinhosas. “É o peruano, né?”, cochichou quando perguntado sobre uma possível permanência do meia Cueva. “Não sei de nada ainda, vamos falar disso mais para frente” . Também despistou sobre um suposto interesse do clube em seu compatriota Ricardo Quaresma e fez questão de apresentar, um por um, os integrantes de sua comissão técnica. Ao se despedir, recebeu até aplausos de alguns dos jornalistas presentes.

Enquanto isso, em um episódio surreal, integrantes da comissão técnica de Sampaoli se apresentavam no CT Rei Pelé em busca de uma solução para sua situação trabalhista – os termos da polêmica rescisão de contrato ainda não foram resolvidos e, segundo o Santos, estão nas mãos do departamento jurídico. “Sampaoli não apareceu, certo?”, questionei a um funcionário. “Graças a Deus, não”, rebateu. No quesito carisma, Jesualdo já ganha de goleada do argentino.

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