Copa América: a torcida sumiu
Os lugares vazios deram o recado: alguns jogos da competição são mesmo para esquecer. Ainda assim, os organizadores se dizem felizes (e de bolso cheio)
O treinador Tite pode respirar mais ou menos aliviado. Ou, dito de outra forma, ele já tem com quem dividir a avalanche de críticas pelo desempenho tímido da seleção brasileira nas partidas iniciais da Copa América realizada em território brasileiro. Salva-se porque a popularidade dos organizadores do torneio também anda em xeque. Em nenhuma das doze primeiras partidas da competição se conseguiu encher completamente o estádio. Com exceção dos jogos inaugurais de Brasil e Argentina, que tiveram um público razoável, os confrontos não preencheram nem metade das cadeiras. Foi vergonhoso. Em pleno sábado ensolarado de Porto Alegre, o embate entre Venezuela e Peru reuniu exatos 11 107 interessados na Arena do Grêmio. “Não vejo uma partida como essa atrativa para os brasileiros”, admitiu Romildo Bolzan Jr., o sincero presidente do Grêmio, que não foi ao jogo (estava viajando, de férias).
E o que explica a reduzidíssima taxa de ocupação dos estádios, a mais baixa da década (veja a comparação no quadro)? O salgado valor dos ingressos é uma das respostas. “Vai quem quer, mas eu, Romildo, não pagaria esse preço”, disse o tricolor. Na partida de abertura da competição, realizada no Morumbi, em São Paulo, os bilhetes começavam em 190 reais e chegavam a extorsivos 590 reais. Uma vaga nos camarotes saiu por 1 490 reais. O resultado se viu nas arquibancadas. Dos 60 340 lugares disponíveis, pouco mais de 47 000 foram ocupados. “Fizemos estudos para calcular os preços, e nosso trabalho visou a levar as pessoas aos estádios”, diz Agberto Guimarães, diretor do Comitê Organizador Local da Copa América. “O apanhado geral é bom”, assegura. Boa mesmo é a renda dos jogos, nunca abaixo da casa do milhão de reais. Somente o lucro líquido obtido na partida de estreia do Brasil (16 milhões de reais) é suficiente para cobrir quase duas vezes os custos de aluguel dos seis estádios usados nos 26 jogos da competição — o valor de locação do palco da partida inaugural foi de 350 000 reais.
Repetindo a iniciativa de outros grandes eventos esportivos, como os Jogos Olímpicos, os organizadores chegaram a doar ingressos, no chamado “programa de engajamento social”. Ao longo da primeira rodada do torneio, foram distribuídas 15 800 entradas. Nem assim o entusiasmo cresceu. Nos primeiros noventa minutos do Brasil, das 3 968 cortesias, apenas 918 cruzaram as catracas do Morumbi (ressalve-se que foi dia de greve geral, embora sem sucesso). A empresa constituída para realizar a Copa América, de propriedade 100% da Confederação Brasileira de Futebol, aposta que a média de público subirá nas próximas fases, com a natural emoção do mata-mata. E, no entanto, permanecerá um problema insolúvel, por ora: a má qualidade do futebol praticado pelas plagas de cá. “Há um alerta para a Conmebol. O que torna as competições atraentes é a competitividade entre as equipes”, diz o advogado Pedro Trengrouse, coordenador do curso de gestão de esportes da FGV. Tudo indica que os estádios não lotarão tão cedo.
Com reportagem de Alexandre Senechal, Danilo Monteiro, Lucas Mello e Luiz Felipe Castro
Publicado em VEJA de 26 de junho de 2019, edição nº 2640
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