Tostão, antes do penta: ‘Melhor jogar Eliminatórias fracas que amistosos’
Em edição de PLACAR de março de 2000, ex-jogador escreveu que "grandes equipes só se formam quando os jogos são para valer"
A seleção brasileira deitou e rolou nas Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo de 2022 e garantiu vaga no Catar com antecedência, invencibilidade e com recorde de pontos (45) neste formato. A facilidade encontrada pela equipe dirigida por Tite — somada ao fato de seleções europeias terem vencido os últimos quatro mundiais — , levantou questionamentos sobre a necessidade de o Brasil realizar amistosos contra equipes mais fortes. Há 22 anos, o craque Tostão, então colaborador de PLACAR, tratou do assunto e deixou claro: para ele, é melhor disputar Eliminatórias fracas a realizar jogos sem qualquer valor, mesmo contra adversários fortes.
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A coluna de Tostão, publicada em março de 2000, foi escrita em um momento de turbulência para a seleção, então dirigida por Vanderlei Luxemburgo. Ele perderia o emprego meses depois, após derrota nas Olimpíadas de Sidney (e outras confusões em sua vida pessoal). O time ainda seria dirigido por Emerson Leão até finalmente entrar nos trilhos com Luiz Felipe Scolari e, enfim, conquistar o pentacampeonato na Coreia do Sul e no Japão.
Tostão, campeão mundial em 1970, considerava que o fato de o Brasil não ter disputado as Eliminatórias de 1974 e 1998 (na época, o último campeão se garantia no Mundial seguinte) prejudicou a preparação e fez falta no momento em que a bola rolou para valer. Nas Eliminatórias para 2002, o Brasil sofreu seis derrotas, terminou na terceira colocação e só se garantiu na Copa na última rodada, com vitória sobre a Venezuela, com dois gols de Luizão.
Leia abaixo, na íntegra, a coluna do ídolo do Cruzeiro e da seleção brasileira:
A prova de fogo
Eliminatórias, mesmo contra equipes fracas, são sempre melhores do que amistosos contra as potências. Grandes equipes só se formam quando os jogos são para valer
Depois de uma vitória brilhante no Pré-Olímpico, o Brasil corre atrás da classificação à próxima Copa do Mundo. São quatro vagas para dez equipes, mais uma quinta que será disputada em uma repescagem com o representante da Oceania. Somente se houver uma catástrofe o Brasil não irá ao Mundial.
A importância das Eliminatórias é formar um conjunto, consolidar uma filosofia e aumentar a experiência de alguns jovens. A ansiedade e a responsabilidade de jogar uma partida oficial, mesmo contra fracas equipes, é maior que enfrentar um bom adversário num amistoso. Um atleta somente amadurece quando enfrenta adversidades em competições oficiais.
Na Copa de 94, o Brasil começou mal as Eliminatórias. Parreira mudou o time, colocou dois volantes (Mauro Silva e Dunga), retirou Paulo Sérgio do meio-campo e liberou os laterais para o apoio. A equipe melhorou muito, mas somente se definiu com a presença de Romário no último jogo. Ele fez os dois gols contra o Uruguai e antecipou sua escalação para a Copa. Romário já era o melhor atacante do planeta e apenas confirmou isso no Mundial.
Em 1970, a base da equipe nasceu com Saldanha nas Eliminatórias. Zagallo aproveitou a estrutura e melhorou o time. Entrou Rivelino na armação pela esquerda, ao lado de Gérson, e Piazza foi recuado para a zaga. Se eu não tivesse tido a experiência de formar uma boa dupla com Pelé, durante as Eliminatórias, provavelmente não seria escalado pelo Zagallo. Antes da Copa, o técnico sustentava a opinião de que eu não poderia jogar ao lado do Pelé, porque tínhamos as mesmas características.
A ausência do Brasil nas Eliminatórias das Copas de 74 e de 98 foi uma das causas das fracas atuações dessas Seleções. Na última Copa, a equipe tinha ótimos jogadores, só não funcionou como um conjunto. As dificuldades teriam sido menores se o país tivesse disputado as Eliminatórias.
A Seleção atual está quase escalada, com pequenas dúvidas na zaga, no meio-campo pela esquerda (Zé Roberto ou Rivaldo, entrando Alex na posição do jogador do Barcelona) e na frente, porque depende da recuperação do Ronaldinho. Amoroso, Ronaldinho Gaúcho, Élber, Jardel e Edílson são os atacantes mais cotados.
Penso que a Seleção poderia aproveitar as Eliminatórias para corrigir uma falha. Deveria jogar fora de casa da mesma maneira que atua no Brasil: marcando o adversário por pressão. É por isso que a equipe, sob o comando do Luxemburgo, não vai bem no campo adversário.
São enormes as possibilidades de se formar uma equipe superior à de 1998. Se Ronaldinho recuperar todo seu futebol teremos, do meio-campo para frente, quatro jogadores excepcionais: Ronaldinho, Ronaldinho Gaúcho, Rivaldo e Alex. E, podem ter certeza, será difícil marcá-los!