PLACAR cobriu, em capas de 2000, 2001 e 2002, o roteiro que levou à ausência do Baixinho na seleção do penta
Desde o anúncio da lista de convocados até a preparação para o jogo desta quinta-feira, 4, diante do Chile, no Maracanã, a rotina da seleção brasileira foi marcada pela presença de uma ausência: Neymar Júnior é o nome que ecoa nos corredores da CBF.
Entre falas desencontradas entre o veterano do Santos e o técnico Carlo Ancelotti, ficou claro que o maior artilheiro da história da Amarelinha não tem mais cadeira cativa no time que disputará a Copa de 2026. Depois de dizer que “não precisava mais provar nada para ninguém”, Neymar percebeu que terá de fazer por onde. “Fiquei fora por opção técnica mesmo, acho que não tem nada a ver de condição física. É a opinião do treinador e eu respeito”, resignou-se, depois.
O caso faz lembrar a derrocada de outro controvertido ídolo nacional. PLACAR cobriu em detalhes, com direito a três diferentes capas, o processo que tirou Romário do grupo que disputaria, e conquistaria, o pentacampeonato em 2002.
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Herói inconteste do tetra em 1994, Romário já havia ficado de fora das Olimpíadas de Atlanta-1996 e Sidney-2000 por não conseguir convencer os técnicos Zagallo e Luxemburgo, respectivamente, que merecia uma vaga, mesmo ainda atuando em altíssimo nível por Flamengo e Vasco. Também foi cortado da Copa de 1998 por uma lesão que ele considerava curável, e culpou uma suposta birra de Zagallo e do auxiliar Zico pela decepção. Ou seja, peitou outras lendas da bola, o que nunca é bom negócio.
Neste contexto, o camisa 11 recebeu novas chances dos sucessores Emerson Leão e Luiz Felipe Scolari, mas seguiu sua sina de marcar gols e, ainda assim, causar problemas internos e desagradar os chefes.
Justiça seja feita: Neymar teve muito menos atritos com treinadores na carreira. Ao contrário, é tratado com um “bom menino” por quase todos que o dirigiram, até mesmo por Dorival Júnior, demitido do Santos em 2010 por uma desavença com o então prodígio. Nos últimos meses, no entanto, entrou em divididas com Jorge Jesus, que o dispensou do Al-Hilal, e agora com Ancelotti. E o que mais se assemelha ao caso de Romário: foi perdendo apoio popular.
O gráfico publicado na edição de abril de 2002 mostrou que Romário tinha 80% de aprovação da torcida em pesquisa feita por PLACAR a um ano da Copa da Coreia do Sul e do Japão, disparado na liderança. No entanto, a dois meses do Mundial, tinha apenas 46%, já atrás de Ronaldo (59%) e Ronaldinho Gaúcho (49%).
Resultado de pesquisa publicada às vésperas da Copa de 2002 / PLACAR
Àquela altura, a “Seleção do Povo” estava formada no 3-5-2 com: Rogério Ceni; Lúcio, Anderson Polga e Juan; Cafu, Emerson, Gilberto Silva, Rivaldo e Roberto Carlos; Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho. Ou seja, bem próxima à equipe de Felipão, que acabou preterindo Ceni a Marcos e Edmílson a Polga, e ainda teve de incluir Kléberson na vaga do cortado Emerson.
Assim como ocorre com Neymar atualmente, a presença de Romário na seleção era motivo de acalorado debate. Na edição 1218 de PLACAR, Arnaldo Ribeiro e André Fontenelle produziram deliciosos textos (leia abaixo) com motivos para Felipão levar ou não levar Romário. O Baixinho tinha 36 anos na Copa de 2002, dois a mais do que Neymar terá no Mundial da América do Norte.
Vale lembrar que alguns destaques do penta, como Kléberson, Gilberto Silva e o próprio Ronaldinho Gaúcho se firmaram cerca de um ano antes do penta, o que ainda pode ocorrer com atletas chamados por Ancelotti. Já Ronaldo se recuperava de uma grave lesão e obteve sua redenção no Mundial, ao marcar oito gols na campanha, sendo dois na final contra a Alemanha. A dúvida que fica é: Neymar será um novo Ronaldo ou um novo Romário em 2026?
O blog #TBT PLACAR, que todas as quintas-feiras recupera um tesouro de nosso acervo de 55 anos, reproduz abaixo textos daquelas edições de março de 2000, abril de 2001 e abril de 2002, para mostras as diferenças e semelhanças nos casos de Neymar e Romário.
Março de 2000
Romário é titular absoluto no time da torcida para as Eliminatórias. Mas para Luxemburgo é só um “fio de cabelo branco”
Por Arnaldo Ribeiro
Ele ganhou o tetra quase sozinho em 1994, é o segundo maior goleador da Seleção em todos os tempos (53 gols em jogos oficiais, contra 77 de Pelé), foi o artilheiro da temporada 99 no Brasil, conquistando a Chuteira de Ouro de PLACAR, está firme na disputa pelo troféu deste ano, tornou-se o grande destaque do Torneio Rio-São Paulo, ostenta a invejável marca de mais de um gol por jogo no Vasco, continua a exibir um oportunismo insuperável e” não está nos planos do técnico Wanderley Luxemburgo.
Por falta de opções (Ronaldinho e Amoroso estão recuperando-se de contusões), e só por isso, Romário de Souza Farias, 34 anos, pode até fazer parte da Seleção que inicia a disputa das Eliminatórias para a Copa de 2002, dia 28, contra a Colômbia, em Bogotá. O atacante, porém, tem remotas chances de, sob o comando do atual treinador, realizar seus grandes sonhos antes de encerrar a carreira: jogar a Olimpíada de Sydney e o próximo Mundial.
Nem a fase “craque-responsável” que ele atravessa parece capaz de fazer Luxemburgo abrir mão dos seus conceitos ou preconceitos. Romário faz parte do grupo dos renegados. Na versão do treinador, é um dos seus “fios de cabelo branco”. Como
Edílson, Edmundo, Djalminha e Marcelinho, teve um problema de relacionamento com Luxemburgo no passado, que jamais foi totalmente superado. A questão que fica é: dá para viver sem ele?
Luxemburgo entende que sim. No recente massacre de 7 x 0 sobre a Tailândia, ele testou uma nova dupla de ataque, com Elber, cuja atuação resumiu-se a uma cabeçada na trave, e o hoje indiscutível Ronaldinho Gaúcho. No intervalo, trocou Elber por Jardel, que foi mais efetivo, não o suficiente para apagar da mente dos torcedores a imagem do estrago que o Baixinho e Ronaldinho Gaúcho poderiam fazer juntos com a amarelinha.
“O Romário tem de fazer o trabalho dele no Vasco, enquanto eu faço o meu aqui. Se achar que devo chamá-lo, ele estará conosco”, resume o treinador. “Ele já foi convocado para o jogo contra o Barcelona; não temos preconceito”, garante o consultor-técnico Candinho.
A solitária chance que Romário recebeu na Seleção, na comemoração do centenário do Barcelona, clube em que marcou época, parece significar um álibi para a acusação de preconceito. A presença dele naquele jogo atendeu mais a um critério político, por suas raízes no Barça, do que pessoal. Romário teve uma atuação discreta e não retornou.
Os outros renegados também tiveram chances ocasionais com Luxemburgo. Marcelinho só foi chamado nos primeiros jogos e Edílson figurou na lista para a Copa América do ano passado, mas foi cortado antes da apresentação, por indisciplina no Corinthians. “As portas não estão fechadas para ninguém”, insiste Luxemburgo, que ainda não chamou Djalminha e Edmundo.
Romário tem evitado entrar em polêmica com o técnico. Optou por declarações políticas, ainda na esperança de ser lembrado. Assim que o Brasil garantiu presença na Olimpíada de Sydney, o Baixinho fez questão de divulgar a seguinte mensagem: “Parabenizo o Wanderley pela vaga. Torci como nunca: acho que fui o torcedor número um do Brasil. Agora, só espero ser convocado, já que a Olimpíada é o meu principal objetivo para o ano.”
O baixinho faz questão de dizer também que “não existe mais nada” entre os dois, numa referência aos atritos que tiveram no Flamengo, em 1995. Luxemburgo não admitia os privilégios de que Romário gozava no clube. No ou-ele-ou-eu imposto pelo técnico, os dirigentes optaram pelo ele.
O discurso cautelosamente ensaiado de Romário é repetido pelos outros marginalizados. “Quanto mais eu falo sobre Seleção, mais eu me complico”, explica Edílson. “Uma palavrinha a mais pode gerar uma interpretação errada por parte do Wanderley; ele pode se sentir cobrado ou podem surgir mais fofocas sobre nossos antigos desentendimentos.”
Com os bons resultados obtidos, títulos da Copa América e do Pré-Olímpico, Luxemburgo tem motivos e respaldo para insistir com as suas convicções e até parece estar conseguindo fazer o torcedor esquecer-se dos renegados. Menos de Romário. Numa pesquisa realizada pelo site de PLACAR na internet em fevereiro, com mais de 4 mil votantes, o Baixinho foi o quarto mais indicado (2 302 votos) na Seleção ideal para enfrentar a Colômbia. Só perdeu para os intocáveis Dida (3 198 votos), Cafu (3 152) e Rivaldo (2 775).
O total de Romário, porém, ganha ainda mais valor quando se vê que ele enfrentava uma concorrência de luxo, com nomes como Edílson, Edmundo, Elber e Jardel, entre outros. Dida e Cafu reinam em posições em que há séria escassez de grandes nomes. Rivaldo, por sua vez, é simplesmente o melhor do mundo, no auge da carreira. Logo, os 30% de votos para o Baixinho têm até mais valor que os quase 85% de Cafu.
De resto, a seleção do site é formada basicamente pelos jogadores preferidos por Luxemburgo: Dida, Cafu, Antônio Carlos, Mauro Galvão e Roberto Carlos; Émerson, Vampeta, Alex e Rivaldo; Ronaldinho Gaúcho e Romário. “A pesquisa reflete muito o momento, a paixão, mas todos esses jogadores aí, com exceção do Mauro Galvão, foram e estão sendo chamados por nós”, analisa Candinho, que descarta mesmo o zagueiro do Vasco. “O Galvão tem 38 anos agora e terá 40 na Copa”, afirma. “Estamos promovendo uma renovação; se você prestar atenção, verá que sobraram poucos daqueles que disputaram o Mundial da França. Temos de pensar na frente, não só no momento.” Talvez aí esteja outra explicação para o desprezo a Romário.
As lacunas
Por trás da discussão sobre os renegados, escondem-se as carências da Seleção, que passou a ter também problemas no ataque. As contusões de Ronaldinho e Amoroso e a berlinda vivida por Romário, Edílson e Edmundo transformaram o excesso em escassez. Luxemburgo pode até aproveitar Rivaldo na frente, escalando Alex na sua função.
No setor de criação do meio-campo existe desequilíbrio. Sobram canhotos e faltam destros. Não por acaso, a pesquisa PLACAR apontou Rivaldo, Alex e Ricardinho (do Corinthians), todos canhotos, como os preferidos. Juninho, do Vasco, parece ser a única opção com o pé direito. Assim, Luxemburgo testou contra a Tailândia um losango no meio, com um volante só (Émerson), um meia pela direita (Juninho), um pela esquerda (Zé Roberto) e um meia-atacante (Rivaldo). Vampeta pode estar perdendo espaço.
Na zaga, o companheiro de Antônio Carlos é uma incógnita. Com Mauro Galvão descartado e Scheidt escondido na Escócia, Roque Júnior, Cláudio Caçapa, Fábio Bilica e Álvaro passaram a travar uma disputa acirrada, com chances parelhas. Caçapa e Roque atuaram contra a Tailândia, mas o teste, pela ruindade do adversário, foi inútil.
Para completar, existe o eterno problema da lateral direita, onde Cafu reina absoluto pela total falta de opções. “Nossa grande carência ainda está na ali, mas temos o Cafu e o Evanílson, que está bem na Alemanha; bons valores surgiram na defesa e no ataque; no meio, podemos adaptar dois canhotos, como Alex e Rivaldo, sem problemas”, diz Candinho, numa análise um pouco otimista demais sobre o potencial brasileiro para as Eliminatórias. Todo cuidado é pouco.
Abril de 2001
Por Fabio Volpe e Léo Romano
Três enquetes de PLACAR revelam que, tanto na Seleção do povo como no time eleito pelos principais técnicos do Brasil, Romário e Ronaldo são titulares absolutos. A dúvida é saber se uma dupla formada por um craque de 35 anos e outro que tenta sair do estaleiro chega inteira em 2002
Camp Nou, 26 minutos do primeiro tempo. Ronaldo Nazário toca para Romário e dispara rumo à área. O Baixinho olha para a direita, deslocando a marcação da defesa, mas enfia a bola no lado esquerdo, com açúcar, encontrando o companheiro de ataque livre. Ronaldo dribla o goleiro Hesp e faz Brasil 1, Barcelona 0. Cerca de 80 mil espanhóis foram os privilegiados espectadores dessa cena que ocorreu há quase dois anos, no dia 28 de abril de 1999. Foi a última vez que a dupla Ro-Ro produziu o que seus componentes sabem fazer melhor: gols.
Desde então, Romário e Ronaldo nunca mais jogaram juntos, mas deixaram saudades. E como! Tanto é verdade que formam o ataque titular da Seleção idealizada pelos torcedores. As mais de 10 mil pessoas que participaram da votação feita no site de PLACAR entre os dias 7 e 21 de março deram para o Baixinho 40% dos votos que eram para ser distribuídos entre 23 diferentes atacantes. Já o Fenômeno suou mais para conseguir a vaga: teve 13,5% da preferência, contra 13,2% de Ronaldinho Gaúcho.
Do resultado dessa eleição ” que, vale lembrar, não tem pretensão de seguir uma amostragem científica ” é possível chegar a algumas conclusões. A primeira é que, apesar da derrota para o Equador, Leão está no rumo certo. Pelo menos se pretende ir de encontro à opinião pública. Oito dos titulares que participaram do desastre em Quito estão no time do povo.
A segunda conclusão é preocupante: o brasileiro gosta de apostar alto. Afinal, o que levaria as pessoas a escalarem no ataque um jogador que chegará à Copa com 36 anos e outro que não atua há um ano e meio? É fácil encontrar o motivo: Romário e Ronaldo não são apenas dois jogadores, mas os principais ” senão únicos ” craques que surgiram no Brasil após a metade da década de 80. “Você corre risco na preparação, mas é um risco que vale a pena”, diz o ex-técnico da Seleção Carlos Alberto Silva, resumindo o pensamento de quem aposta na dupla.
O treinador do Guarani não é o único que incentiva Leão a encarar o desafio. Numa segunda enquete de PLACAR, uma Seleção eleita por 20 dos principais técnicos do Brasil também conta com o ataque Ro-Ro. Apenas numa terceira pesquisa a dupla foi desfeita. Num time escolhido por 100 jogadores dos maiores clubes do país, Romário manteve a vaga de titular, mas Ronaldo perdeu o lugar para seu xará, Ronaldinho Gaúcho.
Os boleiros preferiram não apostar na volta, ainda incerta, do Fenômeno, apesar dos sinais de que a recuperação do jogador vai bem, obrigado. Ainda este mês, Ronaldo se apresenta à Internazionale para iniciar os treinamentos com bola. Os últimos exames com o médico que o operou, Gérard Saillant, também foram animadores. Mas seus companheiros de profissão sabem que o simples fato de ele voltar a jogar não garante que o rendimento do atacante será o mesmo dos bons tempos. “O problema não é confiança, mas você voltar a render o que rendia antes”, afirma Juninho Paulista.
Com a experiência de quem sofreu uma grave lesão no tornozelo em 1998 ” ficou cinco meses sem jogar e não pôde disputar a Copa de 98 “, o meia revela que demorou dois anos para readquirir seu futebol. Se Ronaldo seguir esse prazo, adeus Mundial. O próprio Juninho, porém, tenta ser otimista: “No momento da volta, é importante o apoio que você recebe. Eu demorei dois anos porque não tive apoio. O Ronaldo com certeza terá.”
Seguindo esse raciocínio, a idéia do atacante ser chamado por Leão para disputar a Copa América na Colômbia, em julho, pode ser um incentivo decisivo.
Mesmo que o Fenômeno esteja 100% no ano que vem, isso só garante 50% do potencial ofensivo da Seleção do povo. A outra metade depende de Romário. Ou melhor, dos músculos e do fôlego do Baixinho, que estará com 36 anos na Copa do Mundo. “Romário e Ronaldinho são duas interrogações. O ideal seria que a Copa fosse hoje e o Ronaldinho estivesse recuperado”, afirma Zagallo.
O medo do ex-técnico da Seleção, e de todos os brasileiros, é que Romário caia de produção por causa da idade avançada. O desempenho do atacante na temporada passada, porém, é um dado promissor. Ele marcou 73 gols em 2000, quase 60% a mais que em 1999 (46). Além disso, participou de 71 dos 85 jogos do Vasco no ano passado, mais de 83% das partidas. É um percentual maior do que em 1998, quando disputou 67% dos jogos do Flamengo naquele ano. “Não jogo na Seleção só por que o Brasil está carente de atacantes. Jogo pela minha qualidade”, diz Romário, com o aval dos números acima. “Não tenho planos para 2002. Quero continuar jogando pelo Vasco e pela Seleção enquanto der. É a minha única preocupação.”
A preocupação dos brasileiros é outra. Todos querem saber se o Baixinho consegue manter o ritmo até o ano que vem. O mau sinal é que, nos primeiros três meses de 2001, ele marcou apenas um terço dos gols que conseguiu no mesmo período da temporada passada (7 contra 22).
Essa aparente queda de rendimento de Romário e as apreensões em relação a Ronaldo, entretanto, não são suficientes para diminuir as esperanças de um renascimento da dupla. Pesa muito mais no julgamento das pessoas a idéia de ver novamente um ataque genial, que por azar não jogou a Copa da França, mas que tem um excelente retrospecto. Em toda sua história, a Seleção venceu 63% dos jogos que disputou. Com a dupla Ro-Ro em campo, esse percentual sobe para 73%. A explicação, para Romário, é simples: “Quando só um de nós está em campo, a defesa só se preocupa com um jogador. Com os dois, a preocupação fica dividida e os dois rendem mais.”
O sucesso dessa parceria começou em fevereiro de 1997, num amistoso em que o Brasil bateu a Polônia por 4 x 2 em Goiânia. O que pouca gente sabe é que a ligação entre os dois craques começou bem antes dessa partida de estréia. Estrela única da Seleção que foi à Copa de 94, Romário vislumbrava no então novato Ronaldinho uma espécie de sucessor. Ambos chegaram a fazer um acordo no dia da decisão do Mundial. Se próximo ao final do jogo o Brasil estivesse vencendo bem, Romário pediria para ser substituído. Assim, seria ovacionado pela torcida e abriria espaço para a entrada do Fenômeno. O trato só não seguiu adiante pelas circunstâncias da difícil partida contra a Itália.
Torcedores, técnicos e jogadores votaram em suas seleções ideais em 2001
O curioso é que a relação de admiração de sete anos atrás esfriou. Ronaldo até solta elogios sobre o companheiro: “Romário é um dos jogadores com quem me senti melhor jogando. É inteligente, enxerga várias opções para uma jogada.” Já o Baixinho é mais seco. Quando indagado sobre a recuperação do outrora sucessor, responde: “Ele está bem, mas falo mais com o assessor dele, o Rodrigo (Paiva).” Não seria nada de mais, não fosse o fato de os dois serem vizinhos num condomínio na Barra da Tijuca.
Apesar de morarem no mesmo lugar, os dois mal se falam. “Eles não freqüentam a área social. Normalmente, é do carro para casa e de casa para o carro”, afirma um funcionário do edifício, que só viu os jogadores se cruzarem duas vezes. Os encontros foram na garagem, onde, aliás, os craques estacionam dois carros iguais, uma picape BMW X-5. O Baixinho vive em uma supercobertura ” na verdade duas, que ele juntou. Já o Fenômeno tem um apartamento menos suntuoso. Mas a vista de que desfruta, de frente para o mar, é melhor.
Hoje, Romário parece mais disposto a fazer dupla com outro Ronaldo, o Gaúcho: “Essa geração é pobre. Tirando o Ronaldinho Gaúcho, não posso dizer: “Esse é craque.”” Apesar de contar com o apoio de Romário, o ex-jogador do Grêmio tem contra si as más exibições pela Seleção nas últimas chances que teve. Seu estilo de jogo também pesa contra, como lembra Parreira, defensor da parceria Ro-Ro original: “Romário não é de ficar brigando com os zagueiros, Ronaldinho Gaúcho também não. Já o Ronaldo enfrenta. Essa dupla tem tudo para acertar mais.”
Se Leão não pretende remar contra a maré, o time já está quase pronto. Além de escolher mais um homem para o ataque, só faltaria definir o lateral-esquerdo. Hoje a torcida prefere César, que foi mal contra o Equador. Jogadores e técnicos apostam na experiência de Roberto Carlos, que não tem ido bem na Seleção. “O Roberto Carlos vem do Real, onde faz 1-2 com o Raúl toda hora, e chega numa Seleção desentrosada. É claro que ele fica com medo de atacar e ficar descoberto”, diz Candinho, que trabalhou com o jogador na Era Luxemburgo na Seleção.
Com ou sem Roberto Carlos, com a dupla Ro-Ro original ou a segunda versão, a verdade é que, faltando 13 meses para o início da Copa, o Brasil ainda passa por testes, enquanto as melhores seleções do mundo, como Argentina e França, ganham conjunto há quatro anos. “Estamos atrasados. Leão começou a avaliar jogadores novamente. Para ele, dois anos é muito pouco pois falta vivência”, diz Carlos Alberto Silva, que completa: “Outras seleções já estão no acabamento. A gente ainda está preparando o pilar.”
Será que Romário e Ronaldo fazem parte desse pilar?
* Com reportagem de Edson Cruz (Belo Horizonte), Fausto Pereira (Salvador), Guido Orgis (Curitiba), José Alberto Andrade (Porto Alegre), Leonardo Guerreiro (Recife), Rene Isidoro (São Paulo) e Rodrigo Czepak (Goiânia)
19 jogos pela Seleção
14 vitórias
3 empates
2 derrotas
56 gols (média de 2,94)
60% dos gols (34) foram feitos pela dupla
Romário marcou 19
Ronaldo fez 15
Em 3 jogos nenhum dos dois fez gol
Abril 2002
Talvez a gente não ganhasse a Copa com ele. Mas que seria muito mais divertido, seria
Por André Fontenelle
Antes de começar meu arrazoado como advogado de defesa de Romário de Souza Faria, convém apresentar minhas credenciais. Sou sócio remido, portador da carteira número 001 do Clube dos Romaristas. Defendo a presença de Romário na Seleção não desde a Copa de 1990, 1994, 1998 ou 2002: ele já deveria ter jogado o Mundial de 1986, no México. Então vocês já sabem que não estão lidando com um recém-convertido à causa romariana, como existem tantos por aí. Sou um dos fundadores da seita.
Na flor dos 20 anos, Romário teria triturado a defesa francesa no calor de Guadalajara. Mas Telê Santana nem deve ter visto quando ele decidiu com dois gols a Taça Guanabara daquele ano, contra o Flamengo (“Bom, esse tal de Romário” foi o comentário de Luciano do Valle no dia seguinte, na televisão).
Paciência, em 1990 Romário estaria lá. Mesmo semidesaparecido no PSV Eindhoven ” quem dá valor ao artilheiro do Campeonato Holandês? “, ele era presença certa no mundial desde que decidira a Copa América do ano anterior, no Maracanã, contra o Uruguai. Uma maldita fratura no tornozelo o jogou no banco de reservas, de onde ele viu Müller perder aquele gol contra a Argentina.
Teríamos que esperar mais quatro anos. Os prodígios de Romário no Barcelona, porém, não bastaram para abrir os olhos de Carlos Alberto Parreira. Foi preciso chegarmos à última rodada das Eliminatórias ameaçados de desclassificação para que Parreira (felizmente a tempo) engolisse a teimosia e chamasse o artilheiro. E assim, aparentemente pela única vez, pudemos ver Romário em plena ação numa Copa do Mundo. Não preciso lembrar o resultado.
Em 1998, a Seleção teria Romário de novo. Mas também tinha Zico, o homem que assumiu o cargo de coordenador dizendo: “De Copa perdida eu entendo.” Ora bolas, eu queria um cara que entendesse de Copa ganhada. E o que tínhamos se machucou. Não vou ficar especulando sobre o que teria acontecido se Romário não tivesse sido cortado. Mas, como muita gente, lamento termos sido privados dessa opção.
Eu achava que as Olimpíadas de Sydney tinham ensinado uma lição aos treinadores da Seleção Brasileira: é melhor perder com Romário do que perder sem ele. Infelizmente, Luiz Felipe Scolari é daqueles que pensam que, só por ser técnico da Seleção Brasileira, tem o direito de convocar quem quiser.
Não teremos outra oportunidade de ver Romário em uma Copa do Mundo (embora eu tema que, na cabeça dele, 2006 não pareça tão distante). Temos o privilégio de ver em atividade o segundo maior artilheiro do Brasil em todos os tempos (ou melhor, o primeiro, porque Pelé não conta mesmo) e não o queremos na Copa do Mundo. Nós brasileiros somos assim.
Outro dia, durante uma viagem a Buenos Aires, um colega jornalista argentino me disse: “Por aqui estamos torcendo para vocês não levarem o Romário.” É natural: como argentino, ele quer facilitar as coisas para a Argentina. O que não é natural é que parece que nós também queremos.
Fico imaginando Luiz Felipe Scolari técnico da Seleção de 1958. Não teria levado Pelé (muito inexperiente). Não teria levado Garrincha (fugia da concentração). Teria deixado Vavá no Brasil (só fazia gol contra o Bambala e o Arimatéia). Em compensação, que grupo unido nós teríamos tido!
Podem dizer que estou falando do que não conheço. Que não sei nada sobre o convívio de um grupo de 23 jogadores com um treinador, sobre a necessidade da disciplina e tudo mais. É verdade. Aos 30 anos, tenho pouca esperança de um dia disputar uma Copa do Mundo. Por isso prefiro acreditar nas palavras de quem já esteve lá dentro. “Eu prefiro um jogador desobediente que faça gol a um santinho que não faz.” Quem disse isso foi o tetracampeão Branco, que deve saber do que está falando: teve que aturar Romário em 1994, mas deve a ele um título mundial.
Não que eu ache que com Romário em campo a Copa do Mundo estaria no papo. Não estaria. Mas vocês estão partindo do princípio que Copa foi feita para ganhar. Eu não quero que o Brasil ganhe a Copa do Mundo (se ganhar, ótimo), eu quero me divertir! E sem Romário eu sei que vou passar um mês afundado no sofá, sem motivo para acordar a vizinhança de madrugada.
Ele virou mito muito mais pelas suas ausências do que pela sua presença
Por Arnaldo Ribeiro
“Cara, você deveria ser eternamente grato ao Romário pelo título de 1994.” Quantas vezes, eu ouvi essa frase… Não dá para agüentar, mas também não há como discordar. Romário pode não ter vencido a Copa “sozinho”, como Maradona fez em 1986, pela Argentina, mas é inegável que ele desequilibrou, que ele decidiu, que ele trouxe o tetracampeonato. Mas eu prefiro construir a frase de abertura de uma outra maneira: “Cara, Romário deveria ser eternamente grato ao Mundial de 1994 pelo que aconteceu desde então na sua carreira.”
Romário vive até hoje deste título. É verdade que continuou fazendo gols por todos os cantos (muitos contra Olaria, Volta Redonda e Cabofriense, com todo o respeito), mas na Seleção ele tornou-se um Deus muito mais por ter estado ausente em todos os fracassos do nosso time desde 1994 do que pelo que fez em campo nesse período.
Olimpíada de 1996: “Ah, se Romário estivesse lá…”. Copa do Mundo de 1998: “Com Romário, seria outra história.” Olimpíada de 2000. “Se Vanderlei Luxemburgo tivesse levado o Baixinho, a medalha de ouro inédita seria nossa.” Seria mesmo?
Meu Deus! Quem disse que Romário faria o Brasil vencer duas Olimpíadas e uma Copa? “Olha, em 1994 ele decidiu.” Pois é. Mas fazem oito anos, caramba!
Para a imagem do Romário, veio muito a “calhar” ” bem entre aspas, mesmo ” as contusões e as birras com treinadores que o afastaram das últimas competições importantes da Seleção. A reputação dele ficou intacta e a tese do “se ele estivesse lá…” se reforçou. Ele esteve lá na Olimpíada de 1988 e na Copa de 1990 e nem por isso o Brasil foi campeão.
Melhor que Zico e Careca?
O fato é que Romário tornou-se uma espécie de mito, superando craques como seu desafeto Zico e Careca na galeria dos imortais da era pós-Pelé. Esses ganharam a pecha de “perdedores”. Se os vencedores merecem mesmo um lugar reservado entre os imortais, ninguém me convence que Romário jogou mais que Zico e Careca. Eles faziam gols também, e muito mais. Criavam jogadas, se movimentavam por todos os lados do campo, decidiam jogos perdidos.
Não que Romário não decida jogos, mas os tempos são outros. Como o próprio Baixinho vive dizendo “tá fácil, peixe”. É. Ele afirmou mais de uma vez que balança cada vez mais as redes muito porque as nossas defesas e nossos zagueiros atuais são medíocres. Tá mais fácil mesmo, Romário.
Defesas arrombadas, falta de concorrentes na posição também. Ronaldo é uma incógnita, depois de tanto tempo parado. Luizão vive fora de forma e não tem o mesmo refinamento. França não tem personalidade suficiente. Élber só joga na Alemanha. Ninguém conseguiu ocupar o posto do Baixinho e assim ele se mantém como esperança.
Não dá para supor que Romário tenha ficado melhor depois de velho. Principalmente para um atacante, que sempre depende da velocidade, a analogia com o vinho não cola.
Hoje, ele não consegue mais dar aqueles “rushes” infernais e vive sofrendo contusões musculares. Como disse Tostão numa de suas colunas na Folha S. Paulo, Romário “há muito tempo não faz sua jogada característica: posicionar-se na intermediária com o corpo de lado, com um olho no lançamento e outro no zagueiro. Aí, ele parte no momento certo, para receber a bola na frente e fazer o gol. Outro jogada típica do atacante é dominar a bola em pequenos espaços, girar o corpo já driblando o zagueiro e finalizar. Tudo isso numa fração de segundo. Isso raramente tem acontecido.” Esse foi Tostão, para quem Romário FOI o melhor centroavante brasileiro de todos os tempos, e também “FOI a síntese perfeita da genialidade e objetividade de um centroavante.”
O Romário de hoje não é melhor que o de 1994, mesmo fazendo mais gols. O Romário de hoje também não é confiável. Ele pode estourar como às vésperas da Copa da França.
Não entro nem no mérito dos problemas extra-campo do Baixinho, da indisciplina, da arrogância, do tratamento especial que ele exige, da tal falta do espírito de grupo ” esses são os motivos que levaram Felipão a excluí-lo. Os meus são, digamos, mais técnicos. Eu não acredito mais em Romário.
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